Capítulo 9 - Então, é Natal

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 Então, bom Natal
E um Ano Novo também
Que seja feliz quem
Souber o que é o bem  

(Então, é Natal - Simone)

Eu não sabia porque estava fazendo aquilo. Cada vez que eu abria a boca, nos levava a navegar por águas ainda mais profundas – e eu não tenho certeza se eu sabia nadar naquele tipo de maré.

Mas eu não conseguia evitar. Toda vez que eu olhava para Bárbara, eu via além. Por mais que eu me forçasse a encará-la com olhares maliciosos, que se demoravam demais em suas curvas, eu continuava vendo além. Eu lembrava dos meus dedos apertando aquela cintura, do meu rosto enfiado naquele pescoço e da maneira como ela sorria abertamente quando eu falava alguma besteira. Aquilo tudo tinha acontecido há milênios. Não dava para entender porque meu cérebro estava me bombardeando com aquele tipo de lembrança. Mas mesmo assim...

Porra, sei lá.

E ela lembrava, sabe? De repente ficar trancada nessa merda de elevador comigo também tirava um pouco da sanidade dela. Claro que já dava pra saber isso só pela quantidade de vezes que ela tacou aquela bolsa na minha cara, mas tudo se confirmou com a sua gargalhada.

E, sinceramente, porra, ela não devia ter sorrido.

Era muito mais difícil quando ela sorria.

Eu precisava sair desse elevador, sair dessa convivência e encontrar qualquer mulher no caminho, qualquer uma mesmo, porque eu precisava parar de pensar na garota da minha frente. Eu tentava. Pensava em outra coisa. Em alguma menina maneira da praia, nas ondas iradas do final de semana, das festas regadas à vodca no Uruguai... Qualquer coisa. Mas, de alguma forma, de alguma forma, Bárbara conseguia entrar em todas as minhas tentativas. Enquanto eu estava tentando bombardear meu cérebro com imagens de uma morena belíssima do Peru dançando em cima da mesa da boate, um outro pedaço de mim falava "nossa, que imagem legal, mas você lembra como foi bem mais legal quando você e Bárbara viajaram juntos pela primeira vez?".

E, pronto, já era. Tava fodido. A sensação que eu tinha era essa. Que qualquer coisa que eu pensasse, qualquer coisa que eu fizesse, só levava a essa conclusão: eu estava fodido.

Por isso que eu precisava sair do elevador. Tomar um banho, deitar na cama, dormir até o dia seguinte e simplesmente esquecer que esse encontro tinha acontecido. Expurgar das memórias, encaixotar tudo de novo e fazer os pequenos Rafaéis trancarem essa merda toda num lugar onde eu não conseguisse alcançar, nem com meus maiores esforços.

Eu não confiava mais em mim, saca?

Meus olhos delineavam o rosto dela como se ele fosse a coisa mais linda que eles já viram na vida. O contorno da sua boca rosada, seu nariz ligeiramente arrebitado, os cabelos loiros e escorridos e aqueles olhos, que se estreitavam toda vez que ela percebia que eu estava encarando. Pelo menos ela tinha parado de agarrar a bolsa toda vez que percebia essa situação. Em minha defesa, meu olhar tinha mudado completamente de foco.

O que, na verdade, era uma merda.

Mas eu já estava fodido, meu cérebro não reprogramava nem por um mandato e a única coisa que eu podia fazer trancado naquela bosta de lugar era rezar para que a luz voltasse logo. Até porque estava tão quente que eu já estava a ponto de arrancar minha camisa. Conseguia imaginar uma coisa ou duas que Bárbara teria para dizer em oposição a esta minha vontade.

— Está muito quente aqui — ela disse, exteriorizando meu pensamento. Ela continuava em pé, andando de um lado para o outro novamente.

— Bem-vinda ao Rio de Janeiro — respondi, desviando os olhos para seus sapatos.

Chinelo e Salto AltoOnde histórias criam vida. Descubra agora