A garota no espelho

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       Drica me dispensou com um aceno de sua mão ossuda e uma careta quando Viktor foi dizer a ela que eu iria com ele. Fiquei aliviada. No fundo ainda achava que ela ia dar um jeito de me impedir.

No caminho, fiquei observando Angeles. O clima morno, as árvores verdes e o som dos grilos. Eu morava um pouco longe da cidade em si, duvidava que pudesse ouvir os grilos lá. Encarei a estrada conforme nos aproximávamos da casa da família Alceu. Ou devo dizer mansão?

Tremi um pouco ao lembrar-me de como eu me divertira ali quando era menor. Era uma época mais feliz. Os filhos das criadas e as irmãs de Viktor brincavam conosco, correndo pelos jardins. Meu pai deixava-me ficar mais um pouco só porque gostava de me ver sorrindo, coisa que eu fazia pouco em casa por causa de Drica, não que ele soubesse que era esse o motivo.

O carro parou e Viktor cutucou meu braço com um sorriso malicioso.

"Está na hora de ficar loira!" cantarolou.

***

Meu cabelo é naturalmente castanho chocolate e ondulado. Sinceramente, eu gosto dele. Meus olhos é que são naturalmente... um pouco diferentes. Na verdade, essa de "um pouco diferentes" é uma piadinha particular. Porque meus olhos são diferentes. Eu tenho heterocromia. Sim, eu sou como aqueles gatos que têm olhos de cores distintas. Um verde jade e o outro azul céu.

Desde pequena meu pai sempre disse que eu poderia escolher: ficar com os olhos expostos ou usar lentes da cor que eu quisesse. Eu escolhi a segunda opção e ninguém, a não ser eu, meus pais, Viktor e alguns ex-criados nossos, sabia sobre meus verdadeiros olhos, porque eu sempre estava de lentes azuis. Meu pai me perguntara uma vez se eu não ia mostrar meus olhos a Drica e, diante da minha negativa, ele nunca mais me pressionou para mostrar meus olhos a ninguém.

Eu estava pensando em mostrar meus olhos para todos no baile. Assim, as chances de Drica me reconhecer cairiam muito.

Ainda assim, quando falei isso para Viktor, ele disse que era melhor eu pintar meu cabelo. Tudo bem. Mas não escolhi o loiro usual. Nem a tinta usual. Platinei o cabelo ao máximo com tinta temporária – nem morta eu pintaria permanentemente. E ficou legal! Junto com minha pele e olhos claros, eu estava parecendo uma albina. Queria ver a reação do meu amigo quando visse.

Prendi o cabelo em um coque e saí do banheiro do quarto de visitas da mansão dos Alceu descalça e enrolada em uma espessa toalha. Ou talvez fosse apenas uma toalha simples, mas minha pele, desacostumada ao pequeno luxo, a fazia parecer mais macia que o normal. O quarto também era luxuoso, todos os móveis eram de uma madeira marrom escura e a cama dossel tomava a maior parte de todo o local.

Caminhei até a cama, onde o vestido estava estirado, e deixei a toalha cair aos meus pés, ficando completamente nua. Depois, fui até a cômoda ao lado e abri a primeira gaveta, sendo agraciada com inúmeras lingeries de todas as cores e do meu número. Sorri enquanto pegava um conjunto de renda preta e sutiã sem alças.

Deslizei a calcinha por minhas pernas e fechei o sutiã macio aproveitando cada segundo. Sabia que, assim que voltasse para casa, voltaria a usar as roupas rudes e rotas que Drica me dava para vestir. Precisava desfrutar.

Voltei até a cama e peguei o vestido, erguendo-o no ar para admirá-lo um pouco mais. Depois, abri os botões de trás e o vesti.

"Precisa de ajuda?" uma criada surgiu de algum lugar e parou no meio do quarto.

Fiquei estática de susto, a princípio, mas depois acenei afirmativamente e ela veio ajudar a abotoar a peça.

"Está linda!" ela sorriu para mim com doçura e pude observá-la de fato. Devia ser alguns anos mais velha que eu, tinha olhos castanhos, pele cor de oliva e lindos cabelos cacheados pretos, que estavam presos em um coque.

O Vestido, o Baile e a Seleção [CONCLUÍDA]Onde histórias criam vida. Descubra agora