Se beber não voe

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Tudo começa a acontecer muito rápido. Mamãe pede demissão do seu trabalho. Ela passa muito tempo na frente da televisão embrulhada em mantas, ou na varanda com Billy, conversando por horas e horas. E tirando longas sonecas.

Ela para de cozinhar. Isto pode não parecer uma grande coisa, mas minha mãe adora cozinhar. Nada consegue preenche-la com mais alegria do que colocar uma coisa maravilhosa sobre a mesa, mesmo que seja algo simples como a sua macarronada a bolonhesa ou quatro queijos.

Agora até isso é demais para ela, então caímos em um padrão previsível: cereal no café da manhã, sanduíches para o almoço, e jantares congelados. Jeffrey e eu não reclamamos. Nós não dizemos nada, mas eu acho que nós realmente percebemos o que estava acontecendo quando ela parou de cozinhar. Esse foi o início do fim.

Então, um dia, ela pergunta para Billy e eu, o que iríamos dizer para as pessoas:

— Ok — eu digo lentamente. — Sobre o quê?

— Sobre mim. Acho que devemos dizer que é câncer.

Eu solto uma respiração chocada. Antes desse momento eu não tinha tido qualquer pensamento do que poderíamos dizer as pessoas, como iríamos explicar a doença, da mamãe, como ela gosta de chamá-la. O Câncer iria explicar. As pessoas estão começando a perceber, eu acho. Pela maneira como ela agora fica sentada nos jogos de Jeffrey, calma e pálida, sempre procurando se amparar em alguma coisa. Na frente o seu cabelo virou prata e agora ela sempre usa chapéus para cobri-lo. E ela foi de delgada para simplesmente magra.

Parece tão repentino, mas depois eu penso, eu não estava prestando atenção antes. Eu estava tão consumida com a minha própria vida, com meu sonho, com a ideia de que era Tucker que ia morrer. Ela foi ficando mais fraca todo esse tempo, e eu realmente só notei isso agora. Que filha exemplar eu sou.

— Que tipo de câncer?— Billy pergunta pensativamente, como se a ideia não fosse de toda ruim.

— Algo terminal, é claro — minha mãe diz.

— Ok, então podemos não falar sobre isso? — Eu não aguento mais. — Você não tem câncer. Por que temos que dizer alguma coisa? Eu não quero contar outra mentira que vou ser forçada a dizer.

Billy e mamãe compartilham um olhar divertido que eu não entendo.

— Ela é honesta — Billy comenta.

— Uma falha — mamãe responde. — Puxou o pai.

Billy bufa. 

— Ah, Mags, ela é como uma cópia de você quando tinha essa idade.

Mamãe revira os olhos. Então, ela volta a sua atenção para mim. 

— Uma explicação racional ajudará a todos. Ela os impedirá de fazer muitas perguntas. A última coisa que queremos é que a minha morte pareça ter acontecido de alguma forma misteriosa.

Continuo achando que ela é maluca por dizer as palavras minha morte tão calmamente, como se estivesse dizendo meu carro ou meus planos para o jantar.

— Ok, tudo bem — admito. — Diga o que quiser. Mas eu não vou me envolver. Não vou chamá-lo de câncer, não vou mentir sobre isso ou qualquer outra coisa. Esta é a sua coisa.

Billy abre a boca para dizer algo inteligente ou talvez me dizer como eu sou um ser insensível, mas minha mãe levanta a mão, e ela não diz nada.

— Você não tem que dizer qualquer coisa — ela diz. — Eu vou cuidar disso.

Então, é o câncer. Mas minha mãe estava errada sobre eu não ter que lidar com isso. Eu devia ter trabalhado isso antes de chegar à escola, mas agora é impossível não saber como cada um está se sentindo sobre...

Sobrenatural 2 - Solo ConsagradoOnde histórias criam vida. Descubra agora