Eloise #18

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Pensem numa bad : (

Eloise #18


Quando eles chegaram, a primeira coisa que fizeram foi colocar a mãe de Abim em um saco preto. Não há uma forma sutil de dizer isso, lamento. Nós tivemos que segurá-lo com muita força para Abim conseguir despegar de sua mãe.

O nascer do sol ainda foi marcado com muito choro.

Eles colocaram ataduras na barriga de Leonardo, na de Yasuko, na cabeça de Connor e no meu braço direito.

— Para onde vamos agora? — Leonardo perguntou.

Connor nos puxou para longe das autoridades e de Abim.— Eu escondi o botijão de gás da casa de Abim e disse que houve um incidente para eles. Sobre a causa da mãe da morte de Abim, eu disse a verdade.

— Que verdade?! — perguntei.

— Que um assassino a apunhalou no peito e fugiu.

— E eles acreditaram nisso tudo? — perguntou Yasuko.

— O choro de Abim os persuadiu, mas ele terá que prestar esclarecimentos de todo jeito.

— Não podemos deixá-lo enfrentar isso tudo sozinho — Yasuko ressaltou.

Abim nos viu conversando confidencialmente e nos interrompeu. — Não se preocupem comigo. Vocês se tornaram os meus únicos e melhores amigos, dividiram os momentos de felicidade, e agora, o de dor. E eu serei eternamente grato por isso, mas a partir daqui eu me viro. Meu tio tem contatos e vai me ajudar com as autoridades e o enterro da minha mãe. Vão para casa.

— Não iremos deixá-lo sozinho — encarei Abim.

— Por favor, eu insisto. Considerem essa noite que passaram comigo e com minha mãe como o velório. Agora vão, seus familiares querem saber de vocês.

— Que familiares, Abim? Eu não tenho familiares... — será que ele esqueceu? O meu tio não conta.

— Eloise, por favor! — Abim gritou. — Eu insisto.

Diante do estado mental de Abim, eu não encontrei coragem para confrontá-lo, e tudo o que meu corpo queria fazer era abraçá-lo. Os outros fizeram o mesmo. Entre o aglomerado de braços, pudemos ouvir Abim falando baixinho.

"Obrigado".

As autoridades colocaram Abim em um carro, e os quatro de nós em outro. Connor nos disse que eles queriam falar com os nossos países antes de nos liberar, mas quando chegamos em uma espécie de delegacia. Yasuko fez uma ligação e tudo pareceu se resolver na mesma hora.

Ela nos contou que o seu pai tinha forte influência em qualquer um que ele quisesse. Soubemos até mesmo que a investigação sobre o motivo da morte da mãe de Abim foi adiada. Yasuko nos contou que seria capaz de suplicar pessoalmente ao seu pai para não deixar falta nada para Abim.

Dois caras funcionários do pai de Yasuko surgiram. Os homens de terno cinza nos levaram para um hotel. Lá, vestimos as roupas que eles providenciaram e guardamos o fardamento em bolsas. Nos alimentamos, tomamos banho# e depois tiramos um cochilo de alguns minutos. Cinco horas mais tarde, estávamos todos a caminho de seus voos para casa.

— Então é isso? Vamos todos para nossas casas e nunca mais nos falamos? — Leonardo perguntou.

— Claro que não — Connor mostrava o celular finalmente recarregado — eu ainda tenho o nome de usuário de vocês.

— É um adeus temporário, eu posso providenciar passagens sempre que quiserem — disse Yasuko.

— Ótimo, eu quero voltar depois para ver se Abim estará melhor — Leonardo olhou em direção a casa do amigo. — Então, acho que é isso. Para vocês, até a próxima.

A hora do voo com escalas para o Brasil de Leonardo chegou. Ele abraçou a Connor, Yasuko e depois a mim. "Vou sentir falta de discutir com você", foi o que ele disse no meu ouvido. Eu não disse nada, mas tenho certeza que ficou subentendido que também sentirei.

Logo mais, os voos de Yasuko e Connor foram anunciados. Fui a última a partir.

Já por cima das nuvens, fiquei imaginando o que seria do embate entre as Terras agora. E se levaria mais dezessete anos para um dia, quem sabe, voltarmos a Terra Dois. Por que eu não consigo usar a minha Energia para isso?

Todavia, esse não é mais o nosso problema. Não podemos fazer nada daqui.

Ao pisar em solo francês, a primeira coisa com que me deparei foram luzes do fim do ano. Mas a segunda foi um mural repleto de fotos de crianças e jovens desaparecidos. No canto direito inferior do quadro, parcialmente coberto por dois cartazes, estava o meu retrato. No rodapé, sobre uma tarja preta, o novo número de contato do meu tio.

Usei o telefone público para ligar para ele, que depois de um tempo, veio me buscar em uma moto com a placa pendurada.

— Onde você estava?

— Eu precisei viajar.

— Quer dizer que você tinha dinheiro para viajar e não para o seu tio?

— Uma amiga me emprestou.

— Ótimo, pede pra essa sua amiga me devolver o tanto de dinheiro que gastei em sua busca.

Um parente decente provavelmente me receberia com um abraço, mas o máximo que o meu tio fez foi cuspir no chão.

Subi na garupa e fui levada para a sua nova "residência". Entre aspas porque ninguém deveria morar nessas condições, ou talvez, ele merecesse.

Aquele casebre um dia já fora branco, mas agora, caminhava entre o marrom da lama e o cinza de sujeira. Meu tio precisou de uma chave de fenda para suspender e abrir a porta, quando o fez, uma família de ratos passou correndo entre as nossas pernas. De dentro, a casa parecia ainda menor. Só tinha um quarto, que também era a cozinha, e um banheiro, com uma cortina de plástico dividindo os cômodos.

Em cima do fogão, uma panela de pressão com as laterais queimadas fedia a comida azeda.

Meu tio resmungou. — O que você queria? A situação piorou.

— E o que houve com o outro apartamento?

— Eles tomaram. Logo após que me levaram para interrogatório sobre o seu sumiço. Onde porra você estava? Não minta para mim.

— Já disse, precisei viajar.

Ele bufou, depois sorriu e sentou-se na cama. — Você é mentirosa igual à sua mãe. Todas as vezes que precisei, ela sempre falava que não podia me ajudar. Acabou sendo explodida pelos lunáticos antes de gastar o que tinha.

Sempre foi assim. Ele adorava cutucar a minha ferida quando estava irritado... O que meu tio não sabe é que essa Eloise em sua frente agora tem preocupações maiores do que a necessidade de agradá-lo, como por exemplo, não enviá-lo para uma fenda no meio do pacífico.

— Por que está me olhando com essa cara de sonsa?

Eu o ignorei.

— O natal está chegando.

— E daí?

— Não banque a desprovida. Não esse ano. Daqui a três dias, você fará dezoito anos.

Talvez a data do meu aniversário fosse a única que ele recordava, o outro feriado também ajuda.

— Eu não me esqueço daquele natal. Eu precisei ficar com a finada da sua irmã enquanto a minha dava a luz a você. Perdi bastante dinheiro naquela noite... Mas você sabe o porquê desse seu aniversário ser importante, não é?

Como não? Durante todos esses anos que estive com meu tio, ele anseia por esse momento. Irá se livrar da minha guarda. Eu não precisarei mais morar com ele.

Antes eu tinha medo desse dia. Agora, acredito que estou mais ansiosa do que ele.

***

Agora falta só o relato de Connor para esse capítulo. Os Outros Terráqueos amanheceu hoje na décima posição em fantasia. E eu sou grato demais a vocês por isso. Preciso que votem e comentem bastante para subir ainda mais. 

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