Capítulo 4

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Polegares grandes passeavam pelo meu rosto. Acariciaram lentamente a minha bochecha, depois, num gesto meigo e muito lento, encostou-se à minha boca. Contornou-a cuidadosamente, fazendo meu coração tremer. Olhos azuis acinzentados me olhavam com serenidade, seriedade e talvez até... Frieza. Não conseguia distinguir. Tudo o que eu sabia neste momento era que eu estava completamente obcecada por aquele toque e aqueles olhos. Combinavam perfeitamente com aquele homem. As partes mais intimas do meu corpo imploravam por aquele mesmo toque. Senti-me estranha. Fazia tempo que eu não sentia essa vontade... Insaciável. Queria que ele tocasse meu corpo da forma que quisesse. Eu queria dizer a ele o quanto estava gostando disso. Queria falar que ele era espetacularmente bonito, mesmo sabendo que provavelmente ele já ouvira isso muitas vezes antes. Mas nunca era demais. Para ele, nunca seria demais. Aqueles olhos começaram a se aproximar, embora eu não conseguisse enxergar seu rosto. Ele iria me beijar?

Acordei. Estava suando. Sentei-me na cama na mesma hora, sentindo o calor do meu quarto minúsculo me sufocar. Ou o sonho estava me sufocando? Não sei. Isso era estranho demais. Afundei o rosto em minhas mãos. O que está acontecendo comigo, afinal de contas? Isso não era normal. Não comigo. Era a primeira vez em minha vida em que eu estava completamente encantada por alguém que eu nem conhecia.

Olhei para o relógio. 08h35min. Merda. Estou atrasada. Levantei-me num pulo, olhando em minha volta, procurando saber o que fazer. O sonho me deixara atordoada. Peguei a primeira peça de roupa encontrei dobrada na pilha de roupas que mamãe deixara sob a poltrona no canto do meu quarto. Era um macaquinho cor de vinho. Coloquei-o mais depressa que pude, agradecendo por ele ser uma peça que vestia em cima e embaixo. Sai correndo e desci as escadas tão rápidas que, em dado momento, pensei que ia cair. O primeiro andar cheirava todo a uma mistura de café e chá fresco. Fiquei tentada a pegar uma xicara, mas isso seria cinco minutos a mais de atraso.

E eu nunca me atrasei.

Às 09h13min eu cheguei ao The Buttered Bun e sabia muito bem que meus cabelos estavam completamente bagunçados. Não liguei. Caminhei rapidamente entre as mesas enquanto dava breves acenos de cabeça para os clientes. Entrei na cozinha. Frank estava se virando em trinta e mal me viu chegar.

— Frank, por favor, me desculpe — falei, atropelando as palavras, jogando minha bolsa num canto da cozinha. Vesti o avental. — Prometo que isso nunca mais irá se repetir.

— Tudo bem — murmurou, virando uma panqueca na frigideira, depois remexeu o bacon. — Veja se todos já fizeram seus pedidos.

Saí em disparada, ainda amarrando as cordas do avental em minhas costas. Isso parecia muito mais difícil em meio ao afobamento. Eu nunca me atrasei nos últimos seis anos e, de quatros anos pra cá, nunca precisei de despertador. A rotina me fazia levantar-se no horário certo todas as manhãs. Meu corpo já estava acostumado com meu trabalho. Mas hoje, coincidentemente enquanto sonhava com William, eu me atrasei. Uma parte imprudente de mim não queria ter acordado. Queria apreciar mais a sua aproximação, até que se completassem com um toque de lábios nos meus.

Mas porque eu queria tanto isso? O que me obstinava tanto a querer tocá-lo? Sua presença me apavorava, me intimidava e me dava espasmos. Mas ao mesmo tempo em que isso me deixava desconfortável, alguma coisa parecia me empurrar a ele.

E assim eu me sentia estranha em meu próprio corpo.

Como em todos os dias, eu e Frank nos sentamos em uma das mesinhas de fórmica para tomar um bom chá depois do almoço. Era tranquilizante ficar aqui, apenas vendo as mesas vazias, que há uma hora estavam cheias de comida e ocupadas por diversas pessoas e saber que, com bastante pressa, atendemos cada um deles. A sensação de vislumbrar o local sossegado, depois de tanto trabalhar, era gratificante.

Como eu era antes de você (Hot Version)Onde histórias criam vida. Descubra agora