O pecado iria morar ao lado, literalmente

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O silêncio era ensurdecedor. Meu corpo todo ficava tenso esperando sua própria jogada e aproveitava aqueles micros segundos para poder planejar a minha. O suor descia por minha testa, e usei o meu antebraço para secar fazendo o mínimo de movimentos possíveis. Um erro e tudo estaria acabado, o esforço seria em vão.

— Não acredito que você está jogando tênis no Wii a essa hora!

Saltei pelo susto da voz de minha prima e acabei perdendo a jogada, o que gerou a vitória do meu adversário. Frustrada, pus o controle em cima do aparelho, preparada para repreender Natalie, não só pela intromissão desnecessária, mas por vestir a roupa de dormir quando já deveríamos estar a caminho da faculdade.

— Espero que tenha adotado um novo estilo de roupa, caso contrário vai começar hoje. — eu disse apontando para seu pijama de urso e corações.

Natalie revirou os olhos castanhos, mas ficou visivelmente afetada. Franziu os lábios, passando as longas unhas pintadas de vermelhos por seu cabelo loiro recém tingido. Desliguei o jogo, prometendo mentalmente ao aparelho que teríamos uma revanche. Minha prima, descontente por eu ter sido a última a dar a palavra, não conseguiu segurar a língua por muito tempo.

— Você vai trocar de roupa também, não é? Sei que quer mostrar a todos o quanto é fã de American Horror Story, mas não precisar ter isso estampado em uma camiseta. — retorquiu indo para a cozinha e pegando o bule de café, servindo-se de uma caneca. Observou minha cara de espanto com deleite e deu um pequeno sorriso.

Tirei os óculos limpando as lentes na minha camisa de mangas 3/4 com o logo do American Horror Story, fingindo estar cogitando trocá-lo. Meu jeans era surrado e reconhecível por qualquer pessoa que convivesse comigo por mais de dois anos, assim como meus tênis rasgados nos cantos. Enquanto as solas não descolassem, ele seria o meu parceiro na alegria ou na tristeza. Recoloquei os óculos reforçando meu rabo de cavalo e encarei minha prima que ainda aguardava uma resposta.

— Não preciso, mas quero. — forcei um sorriso carregado de ironia. Apontei para ela, teimosa. — E se continuar reclamando, te deixo ir sozinha para a aula. E não, não vou te cobrir dessa vez.

Natalie revirou os olhos e suspirou pondo a caneca na beirada da pia. Ergueu as mãos como se estivesse se rendendo e saiu bufando da sala, indo trocar de roupa. Sentei no sofá – que levantou poeira com um indicativo de que a hora de nossa despedida estava próxima – pegando o meu celular e assistindo um vlog para passar o tempo. Aproveitei para caçar curiosidades sobre minhas séries favoritas que pareciam estar em hiatos eternos.

Um dos cachorros da senhora Hill latindo com um indicativo de que alguém estava subindo as escadas daquele andar. Natalie odiava esses cachorros, mas esse era um pequeno preço a se pagar quando se morava em um apartamento no subúrbio dividindo o andar com pessoas que tinham idade para ser nossas avós. E ainda pagar pouco no aluguel.

— Eu juro por Deus que esse cachorro vai ser a minha próxima refeição, não a da senhora Hill. — Natalie ralhou entrando na sala com uma roupa mais apresentável.

Tirei o único fone que estava em minha orelha – e que ainda funcionava.

— Você tem que parar com essas suposições loucas — recriminei levantando-me e pegando minha mochila no canto perto da porta. — Essas paredes são finas e aposto que ela e o senhor Jackson escutam o que você diz.

— Que escutem! — Natalie exclamou com seu típico bom humor matutino. Catou sua bolsa com alça lateral e a ajeitou em seu corpo. — Caso eles tentem fazer qualquer coisa suspeita, saibam que estaremos de olho.

— Diga por si mesma. — murmurei abrindo a porta e dando de cara com um homem uniformizado carregando uma enorme caixa de mudança e colocando-a no apartamento do outro lado da escada. — Não quero nem saber o que você vai dizer sobre o vizinho novo. — reclamei.

Senhor LuxúriaOnde histórias criam vida. Descubra agora