O Manicômio

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"Se a vossa mão ou o vosso pé vos é objeto de escândalo, cortai­os e 
lançai­os longe de vós; melhor será para vós que entreis na vida tendo um só 
pé ou uma só mão, do que, tendo dois, serdes lançados no fogo eterno."  
JESUS CRISTO

Não nos furtaremos ao desejo  de transcrever as sensacionais impressões suscitadas ao 
nosso raciocínio pela segunda visita da série programada pela previdência do Irmão Teócrito, a
bem da nossa instrução, na tarde do dia imediato ao em que visitáramos a Torre. Abriram­se de par  em par  os magníficos portões do  Manicômio, permitindo­nos
passagem como se fôramos personagens gradas. Como tão bem indiciava a sua denominação, o Manicômio recolhia as individualidades
cujo estado mental excessivamente deprimido pelas repercussões originadas do efeito do suicídio 
lhes impossibilitasse a faculdade de raciocinar normalmente. Era o diretor do Manicômio antigo psiquista natural da velha Índia — berço da sabedoria
espiritual da Terra —, conhecedor profundo da ciência esotérica da alma humana, lúcido e
experiente alienista, cujos cabelos nevados a escaparem em torno de alvo turbante afiguravam
formosa coroa de louros comprovando­lhe os méritos adquiridos no trabalho e no devotamento aos
seus irmãos infelizes. Seu nome — um nome cristão — adotado após a iniciação na luz redentora
do Cristianismo, seria João, o mesmo do  apóstolo venerando que lhe desvendara os arcanos
radiosos da Doutrina Imaculada a que para sempre se devotara, desde então. E como Irmão João,
simplesmente, foi que conhecemos essa encantadora personagem sobre cujos ombros pesava a
tremenda responsabilidade dos enfermos mais graves de toda a Colônia!  Suficientemente
materializado, a fim de melhor permitir­nos compreensão, Irmão João acusava tez amorenada, como geralmente a têm os hindus; grandes olhos perscrutadores, fronte ampla e inteligente, cabelos completamente encanecidos e estatura elevada. Ao dedo anelar da sinistra a esmeralda, que indiciava sua qualidade de médico, assim como ao alto do turbante, pois, em verdade, não 
víramos ainda um só daqueles sábios iniciados que se não trajasse com as mesmas particularidades
apresentadas pelos demais companheiros, exceção feita dos sacerdotes, que preferiam conservar a
alva sacerdotal atendendo a injunções circunstanciais. Extremamente simpatizados por essa figura veneranda, rodeamo­lo sem mais cerimônias, como se de longa data o conhecêssemos, atraídos pelas esplêndidas vibrações que lhe eram
naturais, enquanto ia ele demandando o interior do importante estabelecimento que
comprovávamos rigorosamente montado sob os reclamos da Fraternidade inspirada no divino 
amor cristão, assim como nas exigências da ciência médico­psíquica. “— Antes de tratarmos de qualquer assunto interessante — esclareceu, gentil e atencioso  —, deverei certificar­vos de que meus queridos pupilos são inofensivos, como entidades
anormalizadas pelo sofrimento, que são. Alguns existem ainda em estado de alucinação; outros
imersos em prostração impressionante, a requisitarem de nossos cuidados zelos especiais, conforme vereis. Digo, porém, que são inofensivos, tomando por base um louco terreno, pois os
meus pobres pupilos não agravariam quem quer que fosse, conscientemente; não agrediriam, não 
atacariam, como geralmente acontece com os loucos dos manicômios terrenos. Todavia, são 
portadores dos mais nefandos perigos, não só para homens encarnados, mas até para Espíritos não 
ainda imunizados pelas atitudes mentais sadias e vigorosas, razão pela qual temo­los separados de
vós outros, mantendo­os isolados. Seus deploráveis estados vibratórios, rebaixados a nível
superlativo de depressão e inferioridade, são de tal sorte prejudiciais que, se se aproximassem de
um homem encarnado, junto dele permanecendo vinte e quatro horas, e se esse homem, ignorante
em assuntos psíquicos, lhes oferecesse analogias mentais, prestando­se à passividade para o 
domínio das sugestões, poderia suceder que o levassem ao suicídio, inconscientes de que o faziam, ou  o prostrassem gravemente enfermo, alucinado, mesmo louco! Junto a uma criança poderão 
matá­la de um mal súbito, se o pequenino ser não tiver ao redor de si alguém que, por disposições
naturais, para si atraia tão perniciosas irradiações, ou  uma terapêutica espiritual imediata, que o 
salvaguarde do funesto contágio, que, no caso, será o efeito  lógico de uma peste que se
propagou...”
Impressionado, Belarmino perquiriu, carregando o cenho: “—  Como poderia dar­se um caso melindroso  desse, Irmão João?!... Com que então 
existem tais possibilidades sob as vistas da Lei Sábia do Criador?... Como hei de compreendê­las
sem prejudicar meu respeito pelas mesmas?!...” O interlocutor esboçou gesto de indefinível amargura e retrucou, com sabedoria: “— A Lei da Divina Providência, meu filho, estatuiu e preconizou o Bem, assim o Belo, como padrão supremo para a harmonia em todos os setores do Universo. Distanciando­se desse
magnífico princípio, trilha evolutiva incorruptível, o homem responsabilizar­se­á por  toda a
desarmonia em que se reconhecer enredado!  Tais casos, como os de que tratamos, têm
possibilidades de se verificar  e são resultantes de infrações cometidas pelos nossos estados de
imperfeição, prejuízos desagradáveis e constantes da inferioridade do planeta em que se dão. Convém notificar, porém, que não estou  afirmando que tais casos sejam freqüentes, mas que poderão  acontecer, têm mesmo acontecido!  E assim acontecerá quando exista semelhança de
tendências, afinidades, entre as duas partes, ou seja, entre o desencarnado e o encarnado. Quanto à
criança, ser melindroso e impressionável por excelência, convenhamos que será suscetível de
molestar­se por bem insignificantes fatores, bastando não estejam estes concordes com sua
delicada natureza. Não ignoramos, por exemplo, que um susto, uma impressão forte, um
sentimento dominante, como a saudade de alguém muito querido, poderão igualmente levá­la a
adoecer e abandonar o pequeno fardo carnal! 
A mesma Lei, sob a contradita da qual aquelas possibilidades poderão subsistir, também
faculta aos homens meios eficazes de defesa! 
Através da higienização mental, no reajustamento dos sentimentos à prática do verdadeiro 
Bem, assim como no cumprimento do Dever; nas harmoniosas vibrações originadas da comunhão 
da mente com a Luz que do Alto irradia em tonos de beneficência para aqueles que a buscam, poderá a individualidade encarnada imunizar­se de tal contágio, assim como o homem se imuniza
de males epidêmicos, próprios do físico­terrestre, com as substâncias profiláticas apropriadas à
organização carnal, isto é, vacinas... Em se tratando de um vírus psíquico, é claro que o antídoto 
será análogo, harmonizado em energias opostas, também psíquicas... Por nossa vez, existindo, na
Lei que orienta a Pátria Invisível, ordens perenes para que calamidades de tal vulto sejam evitadas
o mais possível, todos os esforços empregamos a fim de bem cumpri­las, constituindo dever 
sagrado, para nós, o preservarmos os homens em geral, e a criança em particular, de acidentes
dessa natureza.
Infelizmente, porém, nem sempre somos compreendidos e auxiliados em nossos intuitos, porquanto os homens se entregam voluntariamente, através de atitudes ímpias e completamente
desgovernadas, a tais possibilidades, as quais conforme vimos afirmando, conquanto  anormais, poderão verificar­se... Para aquele que se deixou  vencer pelo assédio da entidade desencarnada, os males daí
resultantes serão a conseqüência da invigilância, da inferioridade de costumes e sentimentos, do 
acervo de atitudes mentais subalternas, do alheamento  da idéia de Deus, em que se prefere
estagnar, esquecido de que a idéia de Deus é o  manancial imarcescível a fornecer elementos
imprescindíveis ao bem­estar, à vitória, em qualquer setor em que se movimente a criatura! Para o 
causador "inconsciente" do mal positivado, será o demérito de um ônus a mais, derivado do seu 
ato de suicídio, e cuja responsabilidade irá juntar­se às demais que o sobrecarregam...”
“— E não existirá, porventura, meio seguro de prevenir o homem do nefando perigo a que
se encontra exposto, como se pisasse ele em terreno falso, solapado por explosivos mortíferos?” — 
interroguei, pensativo, entrevendo muitos dramas terrenos cuja causa estaria na exposição que nos
faziam. “— Sim, existem! — replicou vivamente o esclarecido doutor — Existem vários meios
pelos quais são eles avisados, e até posso mesmo assegurar que o alarme é permanente, incansável,
ininterrupto, eterno!  —  e não dirigido a este ou  àquele grupo de cidadãos, apenas, mas à
Humanidade inteira!
Os avisos de que carecem os homens para se desviarem não só desse ominoso resultado, como dos demais tormentos que poderão atingi­los durante os ensaios terrenos para o progresso, estão nas advertências da própria consciência de cada um, a qual é o porta­voz da legislatura por 
que se deverá pautar, esboçando­lhe a prática do Dever como proteção contra todo e qualquer 
malogro que possa surpreendê­lo na sociedade terrena como na espiritual!  Estampam­se nos
dispositivos que as crenças e tradições sagradas de todos os povos popularizam através das
gerações, assim como se encontram nas resenhas da moral educativa legada ao gênero humano, como aos Espíritos pertencentes à Terra, pelo Grande Mestre Nazareno, a qual, longe de ser fruto 
do  misticismo hiperbólico de um povo  apaixonado e fantasista, como presumem os supostos
espíritos fortes, é, ao contrário, a norma lógica e viva, cuja aplicação nos atos da vida prática diária
virá garantir ao homem — à Humanidade —  os estados felizes com que há milênios sonha, pelos
quais se debate através de lutas incessantes e inglórias, mas para a conquista das quais tem
desperdiçado tempo valioso deixando de abraçar os únicos elementos que o ajudariam na heróica
odisséia, isto é, o respeito às leis que regem o Universo e presidem ao seu destino, a auto­reforma
indispensável e dali conseqüente!  E presentemente, com absoluta eficiência, estão  nos códigos
luminosos da chamada Nova Revelação que preside, nos tempos atuais, sobre a Terra, à
transformação social que se esboça no mencionado planeta. Facultando francas relações entre os
planos objetivo e invisível; estabelecendo e popularizando a comunhão de idéias entre nós, os
Espíritos desencarnados, e os homens ainda retidos na armadura carnal, a Nova Revelação 
instruirá a quantos se interessarem pelos edificantes e magnos assuntos da sua especialidade, assim
permitindo aos homens receberem do Invisível tudo o de que necessitarem realmente, a fim de se
fortalecerem para a ciência da Vitória. Assim sendo, necessariamente o homem conhecerá todos os
aspectos da vida do Invisível que o estado do seu progresso moral e mental permitir! Suas glórias e
belezas ser­lhe­ão desvendadas; os supostos segredos que envolviam a morte, em planos
indevassáveis, serão solucionados por fatos clarividentes e elucidativos, assim como os perigos
que o cercam —  como os de que tratamos —, os abismos, as calamidades de que poderia ser 
vítima por parte de habitantes do Invisível, ainda inferiorizado. Tudo quanto os Espíritos têm
podido tentar para despertar a atenção dos homens no intuito de instruí­los, advertindo­os no que
concerne aos seus destinos espirituais, há sido tentado através da Nova Revelação. Mas os homens
só atendem de boamente aos imperativos das paixões! Interessam­lhes tão­somente as opiniões
pessoais, os gozos do momento!  De preferência atendem à satisfação dos próprios caprichos, embora deprimentes, como às exigências do egoísmo gerador de quedas fatais... e, por isso 
mesmo, freqüentemente se dissuadem de tudo que os poderia levantar  para Deus evitando­lhes
desgraças e decepções —  possibilidades pavorosas como as que acabei de mencionar —, pois não 
será desvirtuando­se diariamente, ao embalo  das ruins paixões, que se imunizarão contra uma
espécie de males cujo único antídoto se encontra na prática das virtudes reais, como na ascensão 
mental para os domínios da Luz!  Fazem­se propositadamente surdos aos apelos do  Protetor 
Divino, que deseja resguardá­los das investidas do mal à sombra do Seu  Evangelho de Amor, assim como ao  verbo da Revelação Nova, que, em Seu  nome, a todos convoca para a sublime
transformação, ao advertir:
Ó Homem, criatura forjada dos haustos radiosos do Foco divino! Lembra­te de que és
imortal!... Pensa em que tudo o que vês, tudo o que apalpas e possuis — as conquistas hodiernas
que em teu seio fomentam o orgulho, as vaidades que te cortejam o egoísmo, as loucas paixões que
te arrasam o caráter, comprometendo­te o futuro; as fictícias glórias mundanas que te embalam e
bajulam as presunções, escravizando­te à materialidade — tudo passará, desaparecendo um dia, destruindo­se aos fogos implacáveis da realidade, mergulhadas que serão no olvido das coisas
insustentáveis que não poderão prevalecer no seio de uma Criação Perfeita. Mas tu persistirás para
sempre!  Ficarás de pé para contemplares os deploráveis escombros dos teus próprios enganos, aguardando pavidamente a aurora de novos sucessos do porvir! Lembra­te de que os mundos que
rolam no infinito azul, esses focos de luz e energia, que te lenificam as idéias quando, à noite, desfrutando o merecido repouso após as lides diuturnas, te abandonas a namorá­los fulgurando em
distâncias impenetráveis; os planetas longínquos, que em diversas paragens siderais do Universo 
Ilimitado crescem, progridem e se abrilhantam no carreiro dos milênios, carregando em seus
dorsos generosos outras humanidades, tuas irmãs, em ascensão  constante para o Eterno 
Distribuidor  de Vida, e arrastando em sua órbita formosa plêiades de outras tantas jóias do 
inimitável escrínio  do Universo; o próprio Astro Rei que te viu  nascer e renascer tantas vezes
sobre a Terra, emprestando­te vida, guiando e aquecendo teus passos, sorrindo às tuas vitórias de
Espírito em marcha, velando por tua saúde e protegendo­te na noite dos milênios, colaborando 
contigo nas batalhas dos aprendizados necessários à tua educação de herdeiro divino, igualmente
passarão, morrerão para serem substituídos por outros exemplares novos e melhores, que por sua
vez atingirão idênticos destinos!  Tu, no entanto, não  passarás!  Resistirás à sucessão dos evos, como Aquele que te criou e te tornou eterno como Ele próprio, dotando­te com a essência da Vida
que é Ele mesmo, e de cujo seio promanaste! 
Acautela­te por isso mesmo, ó Homem! Sendo tu, por direitos de filiação, fadado à glória
divina no seio  da Eternidade, não poderás fugir  aos serviços da evolução que é imprescindível
faças, dos movimentos de ascensão próprios da tua natureza, a fim de atingires a órbita de que
descendes!... E, nesse longo trajeto que te será indispensável, quantas vezes infringires os
dispositivos que determinam a harmoniosa escala da tua elevação, tantas sofrerás os efeitos da
dissonância que criaste contrariando a Lei a que estás sujeito como criatura de um Ser Perfeito!... Cuida de ti enquanto é tempo!... Enquanto estás a caminho do trajeto normal, que te solicita apenas
realizações benemerentes... Não  vá a Dor  visitar­te, obrigando­te a estágios penosos, por 
negligência tua no cumprimento do Dever, forçando­te a lixiviar a consciência, com reparações
inapeláveis, a par daquelas realizações!... Aprende com teu Pai Altíssimo, que tão bem te prendou 
para a glória do Seu Reino, o amor e o respeito ao Bem, base inconfundível em que te deverás
apoiar para atingires a magnífica vitória que és convidado a concretizar em honra de ti mesmo,
felicidade que, por lei, é apanágio do teu Espírito imortal!... Trata, pois, de modelar teu  caráter 
abrilhantando de virtudes essa alma que deverá refletir, em algum dia da Eternidade, a imagem e
semelhança do seu Criador!
Para a consecução de tão glorioso alvo foi­te concedido pelo Céu Magnânimo, o Modelo 
Ideal, o Instrutor Insuperável, capaz de guiar­te à culminância do destino que te é reservado: Jesus
de Nazaré, o Cristo de Deus! 
Ama­o! Segue­o! Imita­o!... e alcançarás o Reino do Pai Altíssimo!”
Assim fala a Revelação Nova, que os Invisíveis proclamam sobre a Terra. Quem, no entanto, se dispõe a ouvi­la com reverência, porfiando em aceitar os sublimes
convites que o Céu, abrindo­se através dela, aos homens dirige?! 
Os filhos do infortúnio, de preferência! Aqueles, cujas almas abatidas pelas supremas
desilusões do mundo, tiveram os corações revivescidos ao influxo das verdades celestes que seus
ensinamentos preciosos deixam entrever! Os bondosos idealistas de almas sensíveis e humildes, enamoradas do Bem e do Belo, os cérebros pensadores, não contaminados de indigestas teorias
filhas de falíveis opiniões pessoais, e cujos surtos mentais ultrapassaram as barreiras terrestres, na
ânsia incontida e generosa de se afinarem com as harmoniosas vibrações que se irradiam do 
Perfeito!... Os grandes e poderosos, porém, os mandatários endeusados pelas boas situações
terrenas, cuja bolsa bem provida e mesa lauta desafiam preocupações: o caudal imenso que só em
si mesmo crê e só a si mesmo adora, porque todos os caprichos poderá comprar, todas as paixões
conseguirá regaladamente saciar, refocilando no engodo das ruins alegrias que enganam os
sentidos enquanto envenenam a alma — esses preferem nada disso entender, voltando as costas a
tudo quanto tenderia a deter­lhes a marcha para o  precipício... Até que, com efeito, lá se
despenham, não obstante os reiterados avisos esparsos desde milênios pelo mundo todo... Lá se
enredam, reduzindo­se a este deplorável estado... Quereis verificar?... Disse e, adiantando­se, encaminhou­se para um varandim que ditava vistas para extenso 
pátio, espécie de claustro pitoresco onde arbustos graciosos dispunham agradavelmente a
paisagem limitada. Alguns bancos artísticos enfeitavam as pequenas alamedas, onde vultos tristes e
impressionantes, de entidades sofredoras que, como nós, haviam sido homens, sentavam­se para, em silêncio, descansar.
Irmão João convidou­nos a debruçar sobre o varandim, que se elevava cerca de um metro 
acima do nível do pátio, e continuou: “—  Estas estranhas figuras que daqui contemplareis, pois não convém que delas vos
aproximeis, chegaram, como vós outros, do Vale dos Suicidas. Enquanto, porém, recuperastes a
serenidade, conseguindo condições satisfatórias para tentativas prometedoras, estes pobres
irmãozinhos apenas lograram desvencilhar­se das exasperações de que se perseguiam para caírem
em apatia, o que indicará serem bem diferentes o vosso nível moral e o grau de responsabilidades
no suicídio... Estão atordoados, entorpecidos sob impressões muito chocantes e, por enquanto,
invencíveis!  Não podem raciocinar como  seria de desejar  em um Espírito desencarnado; não 
conseguem refletir com a plenitude do senso, e apenas compreendem o que em derredor se passa
como se do fundo de um sarcófago entrevissem a realidade! 
Os empuxões dramáticos que os surpreenderam nas procelas das próprias
inconseqüências e a truculência dos males de que desde muito se circundaram, elevaram­se a extensão tal que lhes adormentou  a vivacidade própria do Espírito, do ser consciente que se
originou de um impulso divino! 
Aqui, na desoladora estreiteza deste pátio, que a misericórdia sempiterna do Senhor de
Todas as Coisas permitiu fosse dotado de conforto e expressões agradáveis, encontram­se, em
grande penúria moral, muitas entidades que foram homens ilustres na Terra, aos quais admiradores
solícitos teceram necrológios eloqüentes em páginas de jornais importantes e em memória de
quem exéquias pomposas se celebraram; que tudo possuíram do que de melhor existe sobre a
Terra... mas que, infelizmente, se esqueceram de que nem tudo no Universo Ilimitado se resume
em prazeres, em faustos; nem sempre as elevadas posições sociais ou as riquezas materiais serão 
garantias para aqueles que as associou aos erros; nem sempre a prática de abominações ou  as
inconseqüências da imoralidade, assim como as odiosas atitudes do egoísmo, ficarão impunes, abandonados seus dispensadores na descida irreparável para as trevas! 
Encontram­se, aqui, orgulhosos e sensuais que julgaram poder dispor levianamente dos
próprios corpos carnais, entregando­se à dissolução dos costumes, saciando os sentidos com mil
gozos funestos, deletérios, sabendo, no entanto, que prejudicavam a saúde e se levariam ao túmulo 
antes da época oportuna prevista nos códigos da Criação, porque disso mesmo lhes preveniam os
facultativos a quem recorriam quando os excessos de toda ordem traíam indisposições orgânicas
em suas armaduras carnais, caso não se detivessem a tempo, corrigindo os distúrbios com a prática
da temperança. Todos estes, sabiam­no também! No entanto, continuavam praticando o crime contra si
mesmos! Sentiam os efeitos depressores que o vício nefando produzia em suas contexturas físicas, como em suas contexturas morais. Mas prosseguiam, sem qualquer tentativa para a emenda! 
Mataram­se, pois, lentamente, conscientemente, certos do ato que praticavam, porquanto tiveram
tempo para refletir! Suicidaram­se fria e indignamente, obcecados pelos vícios, certos de que se
supliciavam, desrespeitando a prenda inavaliável que do Sempiterno receberam com aquele corpo 
que lhes ensejava progressos novos! 
Observareis, meus caros amigos, que, dentre tantos, muitos quereriam esquecer pesados
infortúnios no adormecimento cerebral provocado pelas libações. Que, inconsoláveis, premidos
por angústias irremediáveis, buscariam supremo consolo na embriaguez que os levaria, possivelmente, a desejada trégua ao sofrimento. Mas esse suposto atenuante é sofisma próprio do 
inveterado rebelde, porque o  convite ao alívio  dos pesares, que afligem e perseguem a
Humanidade, há dois milênios ressoa pelos recôncavos do Planeta, e posso mesmo garantir­vos
que nem um só homem, desde que foi proferido peio Grande Expoente do Amor que se deu em
sacrifício no alto do Calvário, deixou de conhecê­lo, seja quando investido do indumento carnal ou 
durante o estágio no Invisível á espera da reencarnação, e, por isso, certamente, também estes
pobres que aqui se acham tiveram ocasião de ouvi­lo em algum local da Terra ou  da Pátria
Espiritual: "Vinde a mim, vós que estais sobrecarregados, e eu vos aliviarei..."
Como, pois, quiseram esquecer mágoas e infortúnios pungentes nas libações viciosas, desmoralizadoras e deprimentes, as quais não só não poderiam socorrê­los como até lhes  agravaram a situação, tornando­os suicidas cem vezes responsáveis?!... Pois ficai sabendo  que
infratores desta ordem carregam ainda mais vultoso grau de responsabilidade do que o desgraçado 
que, atraiçoado  pela violência de uma paixão, num momento de supremo desalento se deixa
arrebatar para o abismo! 
Atentai, porém, para esta nova espécie: — são  os cocainômanos, os amantes do ópio  e
entorpecentes em geral, viciados que se deixaram rebaixar ao derradeiro estado de decadência a
que um Espírito, criatura de Deus, poderia chegar!  Encontram­se em lamentável estado de
depressão vibratória, verdadeiros débeis mentais, idiotas do plano espiritual, amesquinhados
moral, mental e espiritualmente, pois seus vícios monstruosos não só deprimiram e mataram o 
corpo material como até comunicaram ao físico­astral as nefastas conseqüências da abominável
intemperança, contaminando­o de impurezas, de influenciações pestíferas que o macularam
atrozmente—, a essa constituição impressionável e delicada, entretecida de cintilações mimosas, a
qual cumprirá ao homem alindar  com a aquisição de virtudes sempre mais ativas e meritórias, enobrecer e exaltar através de pensamentos puros, irradiados em impulsos nobilitantes que
confinam com os haustos divinos, mas, jamais!  jamais rebaixar  com a prática de tão 
entristecedores deméritos!...” Efetivamente, víamos, acompanhando com o  olhar  interessado as indicações que o 
emérito moralista nos fazia, individualidades desfiguradas pelo mal que em si conservavam, conseqüências calamitosas da intemperança —  atoleimadas, chorosas, doloridas, abatidas, cujas
feições alteradas, feias, deprimidas, recordavam ainda os trágicos panoramas do Vale Sinistro. Excessivamente maculadas, deixavam à mostra, em sua configuração astral, os estigmas do vicio a
que se haviam entregado, alguns oferecendo mesmo a idéia de se acharem leprosos, ao passo que
outros exalavam odores fétidos, repugnantes, como se a mistura do fumo, do álcool, dos
entorpecentes, de que tanto abusaram, fermentassem exalações pútridas cujas repercussões
contaminassem as próprias vibrações que, pesadas, viciadas, traduzissem o  vírus que havia
envenenado o corpo material! 
Os "retalhados"  integravam a desgraçadíssima falange relegada ao Manicômio. Conservavam ainda a impressionante armadura de cicatrizes sanguinolentas. De quando em
quando espasmos cruciantes sacudiam­nos como se estertorassem à lembrança do passado. Pesados e tardos eram os movimentos que faziam; locomoviam­se a custo, dando a entender 
carência de forças vibratórias para acionarem a mente e usarem das faculdades naturais ao homem
como ao Espírito. Dir­se­iam reumáticos, enfermos a quem ataduras envolvessem, tolhendo a
agilidade das articulações... Entristecidos à frente de tão ásperos sofrimentos, e tão espantosa decadência moral,
interrogamos, cheios de angústia: “— E que há de ser destas pobres criaturas?... Que futuro as aguarda?...” Em gesto rápido e em idêntico diapasão, o eminente chefe do singular estabelecimento 
satisfez­nos a ansiosa expectativa, traduzindo a indubitável tristeza que enternecia sua nobre alma
de discípulo do Evangelho, frente a tão lamentáveis manifestações de inferioridade:
“— Oh! Dramático futuro aguarda­as, na confusão expiatória de reencarnação próxima e
inevitável! — respondeu ele — Os exemplos que apresento neste momento são irremediáveis na
vida espiritual! Nada, aqui, poderá sanar as ferazes angústias que os oprimem, nem modificar a
situação embaraçosa que para si mesmos entreteceram com as atitudes selvagens da incontinência, da imprevidência sacrílega em que acharam por  bem se locupletarem, no livre curso aos vícios
com que se diminuíram!  Eles mesmos, unicamente eles, serão agentes de misericórdia para
consigo próprios, já que voluntariamente se responsabilizaram pelos desvios de que se não 
quiseram furtar! Mas isto lhes custará desgostos, opressões e dores infinitamente amargosas, diante dos quais uma individualidade normal se quedaria estarrecida! Para que se convençam da
situação própria, submetendo­se mais ou  menos resignadamente às conseqüências futuras das
passadas imprevidências, torna­se necessário da nossa parte, enquanto aqui se demorarem,
trabalho árduo  de catequese, aplicações incansáveis de terapêutica moral e fluídica especial, carinhosa assistência de irmãos investidos de sagrada responsabilidade. Acontece freqüentemente, no entanto, que muitos destes infelizes trazem a revolta no coração, a raiva impenitente pela
desgraça de que se consideram vítimas e não responsáveis. Não se resignam à evidência do 
presente e, inconformados, partem a tomar novo envoltório terreno, agravando a situação própria
com a má­vontade em que se entrincheiram, a insubmissão e a impaciência, acovardados ante a
expectativa dos embates tormentosos da expiação irremediável! 
Tais como se encontram aqui, estes nada mais representam do que pequena malta de
futuros leprosos que renascerão entre as amarguras das sombrias encostas do globo terrestre, nos
planos miseráveis da sociedade planetária; de cancerosos e paralíticos, de débeis mentais e idiotas, nervosos, convulsos, enfermos incuráveis rodeados de complexos desorientadores para a medicina
terrena, desafiando tentativas generosas da nobre ciência... enquanto pesarão desagradavelmente
na sociedade humana, pois são fruto dela, dos seus erros, a ela pertencem, sendo justo  que ela
própria os hospede e mantenha até quando necessário... até quando a calamitosa situação for 
minorada! 
Reencarnarão dentro em breve. Conosco permanecerão apenas o tempo necessário para se
refazerem das crises mais violentas, sob os cuidados dos nossos dedicados cooperadores
incumbidos da sua vigilância. Partirão para o novo renascimento tais como se acham, pois não há
outro remédio  capaz de lhes minorar a profundidade dos males que carregam. Levarão para o 
futuro corpo, que moldarão com a configuração maculada com que presentemente se encontram,
todos os prejuízos derivados da dissolução dos costumes de que se fizeram incontidos escravos... e
ali, como ficou esclarecido, serão grandes desgraçados a se arrastarem penosamente em estações
de misérias e lágrimas... Tão ardentes manifestações de sofrimento, no entanto, fá­los­ão colher boa messe de
proveitos futuros. Sob  os fogos redentores do infortúnio, as camadas impuras que impedem o 
brilho desse corpo astral se adelgaçarão, dando lugar a que as vibrações se ativem, desentorpecendo­se para movimentações precisas no campo das reparações. Seus corações,
impulsionados pela dor educadora, ascenderão em haustos de súplicas frementes à procura da
Causa Suprema da Vida, num crescendo constante de veemência e de fé, até atingirem as camadas luminosas da Espiritualidade, onde se farão refletir, afinando­se ao amparo de vibrações generosas
e superiores, que, lentamente, educarão as suas... Pouco a pouco, assim sendo, o vírus se irá
desfazendo até que, com a desagregação do envoltório carnal, se encontrem aliviados e em
condições de algo aprenderem aqui conosco, incentivando a própria reeducação, depois de
receberem alta do nosso estabelecimento...”
“— Se bem compreendi, então, a reencarnação punitiva que aguarda esses desgraçados
lhes é imposta, simplesmente, como tratamento médico hospitalar  desta seção  do nosso 
Departamento?... Trata­se de um antídoto... um remédio, pois?” — perquiri, sacudido por penoso 
desaponto. “— Sim! — retornou tristemente o lúcido conferencista — Medicamentação, apenas! Um
gênero de tratamento que a urgência e a gravidade do mal impõem ao enfermo! Operação dolorosa
que nos pesa fazer, mas à qual não vacilamos em conduzir os pacientes, certos de que somente
depois de realizada é que entrarão eles em convalescença. Unicamente, não será propriamente uma
punição, conforme considerada, pois ninguém infligiu o castigo ou determinou a sentença, senão 
que, todos quantos aqui servimos a Lei nos esforçamos, tanto quanto nos esteja ao alcance, por 
lenificar­lhes a insidiosa situação. Será antes, isso sim! o efeito da causa que o próprio paciente
criou com os excessos em que se deleitou... Como tivestes ocasião de saber, porém, a solicitude
maternal de Maria, submetida à lei áurea da Fraternidade preconizada pelo Amigo Incansável que
nos conduz à redenção, confere­lhes assistência desvelada e constante. Reencarnados, mergulhados nas ondas terrestres da expiação, continuarão sob nossa dependência, da mesma
forma hospitalizados e registrados em nosso Departamento, visitados e assistidos por nossos
médicos e vigilantes como se aqui ainda permanecessem... enquanto que será para aqui mesmo que
tornarão, ao findar o terrível degredo para que os preparamos.” Seguimos, não obstante, a visitar os gabinetes médicos no interior do edifício. De
passagem, porém, Irmão João fez­nos penetrar nas enfermarias onde se localizavam aqueles que
continuavam presas de prostração impressionante desde o ingresso no Vale Sinistro, uma vez que, deprimidas por excessos de toda a natureza, notadamente os de caráter sexual, suas faculdades
anímicas se haviam amesquinhado, reduzindo­os àquela insólita situação — atestado indubitável
dos instintos a que se apegaram! 
Deitados em leitos que a bondade excelsa de Jesus lhes conferia o direito de usar, através
dos dispositivos amorosos das leis de Caridade que inspiravam todos os serviços da Colônia, achavam­se eles isolados dos demais, em recintos extensos, superlotados. Pertenciam a todas as
classes sociais e nacionalidades comportadas na circunscrição da Colônia. Pesadelos atrozes
traziam­nos em constantes sobressaltos, sem que, apesar disso, lograssem despertar do angustiante
marasmo. Incapazes de se locomoverem, de externar a palavra, expondo as atormentações que lhes
turbilhonavam no cérebro, apenas gemidos débeis proferiam, de envolta com repugnantes
contorções, como se atacados de vírus desconhecido. Emocionados, passamos entre as filas dos leitos, ligeiramente observando­os às
indicações do lúcido mentor, que ilustrava a impressionante apresentação com o verbo atraente
que tão bem sabia usar.
"—  Se possuísseis bastante desenvolvimento da visão espiritual —  ia elucidando  —, verificaríeis terríveis emanações se levantarem de suas mentes, dando­se a contemplar em figuras
e cenas deprimentes e vergonhosas, resultado da dissolução dos costumes que lhes foram próprios, dos atos praticados contra a decência e a moral, pois ficai sabendo que tanto os atos praticados
pelos homens como os pensamentos evolados de sua mente imprimem­se em caracteres indeléveis
na sua estrutura perispiritual, escapando­se depois, em flagrantes deploráveis, aos nossos olhos, quando, à revelia da Lei, se bandeiam para este lado da vida! Nestes leitos existem suicidas de
todos os tipos: —  desde os que empunharam a arma ou o tóxico fatais até aqueles que se
consumiram vitimados pelos próprios vícios!  Une­os a mais ignóbil afinidade, isto é, a da
inferioridade do caráter e dos sentimentos!..." 
Com efeito! Se não podíamos perceber as cenas mentais indicadas, como outrora no Vale
Sinistro, quando  destacamos as relacionadas com o ato violento do suicídio, no entanto 
percebíamos vapores escuríssimos, quais nuvens espessas, evolarem de seus cérebros, espalhando­ 
se em ondas volumosas pelo ambiente, o qual se toldava envolvendo os aposentos em penumbra
crepuscular acentuada, como se as sombras noturnas ali fossem eternas... o que será o mesmo que
afirmar que, para aquelas pobres vítimas de si mesmas, não raiaria ainda a aurora confortadora que
para nós já se destacava nos horizontes do futuro. Aliás, como não ser  assim se ali portavam
grandes criminosos morais, algozes que tanto perverteram e infelicitaram o próximo, impelidos
pela torpeza dos instintos, monstros humanos que tantas vezes se saciaram na calamidade que
faziam desabar sobre o coração e o destino alheios?!... Como não se encontrarem contaminados de
trevas os recintos em que se abrigavam, se as trevas de que se rodeavam eram oriundas deles
próprios, pois sempre se regalaram em suas dobras, provocando­as, produzindo­as, nelas se
locupletando durante a vida social e íntima que viveram, acentuando­as com o remate acerbo do 
suicídio?!... Ali os víamos, tais quais eram, outrora, na Terra, homens galantes, sedutores,
insinuantes, hipócritas, mentirosos, desmoralizados, muitas vezes suspensos aos melhores postos
sociais, devassos, beberrões, descrentes do Bem, descrentes de Deus, servos do mal, escravos da
animalidade, rastejando na lama dos instintos, a se ombrearem com o verme, esquecidos de que
eram criaturas de Deus e que a Deus deveriam dar contas, um dia, do abuso que faziam da
liberdade em que a Criação mantém o ser  humano!  Agora, porém, aniquilados, estigmatizados
pelo passado vergonhoso, cuja imagem os seguia qual fantasma acusatório, atestando a situação de
indigência, única que lhes cabia suportar como resultante do indébito procedimento! 
Observando nosso interesse, o expositor prosseguiu, fiel à solicitação de Teócrito, para
permitir­nos instrução:
"—  Será a reencarnação o único corretivo assaz enérgico para levantar­lhes
corajosamente as forças deprimidas. Aqui, só muito fracamente assimilarão os fluidos tônicos
perenemente esparsos no recinto das enfermarias, pois muito espessas se encontram as camadas de
impurezas que envolvem suas faculdades para que se permitam benefícios, como acontece a outros
internos em nosso Instituto.
Tais como seus cômpares destes estabelecimento, freqüentemente são conduzidos à Terra
a fim de lograrem benefícios ao contacto de médiuns moralmente aptos a favorecerem irradiações
fluídicas capazes de agirem beneficamente, auxiliando­os no despertar...”
"— E quando reencarnarão eles?... Como se apresentarão na sociedade em que viveram
outrora?..." — indagou de chofre o antigo estudante de Coimbra, com os grandes olhos acesos pelo 
interesse.
"— No momento em que se atenue o estado de prostração, encaminhá­los­emos a novos
renascimentos, sem que na realidade dêem por isso, o que equivale dizer que serão incapazes de
algo solicitarem para a existência nova (ainda porque para tanto lhes escasseariam méritos), de
colaborarem nas providências para o importante certame em que hão de desempenhar o principal
papel. — atendeu, bondoso, o servo de Maria — Somente nós outros, portanto, os governadores do 
Manicômio, assim os técnicos do Departamento de Reencarnação, trataremos dos acontecimentos
em torno deles, de acordo com a justiça das leis estatuídas pelo Criador e sob  os ditames da
amorosa caridade do Mestre Salvador, que a todos os desgraçados procura socorrer com o alívio 
da Sua imarcescível ternura, e a quem todos os obreiros devem submissão, respeito e veneração! 
Que lúgubre falange emigrará então, em retorno expiatório, para as arenas da Terra, com
meus pobres pacientes!  Não poderei ainda precisar minúcias. Mas os conhecimentos por mim
adquiridos em assuntos espirituais conferem­me o direito de prever aqui retardados mentais,
loucos, epilépticos, possivelmente surdos­mudos de nascença e até cegos —  todos
deploravelmente ferreteados pela infâmia de que se rodearam, no grau  equivalente aos delitos
praticados!" 
"— Não seria demasiadamente severo o castigo citado, venerando Sr. diretor?... partindo 
do princípio de que toda a Humanidade erra, cometendo crimes diariamente?..."  —  perquiri
inconformado, enquanto à minha visão interior se desenrolavam panoramas análogos às sugestões
apresentadas pelo eminente moralista e por  mim outrora verificados diariamente, nos cenários
terrenos.
"— Não acrediteis assim, meu amigo! — retrucou  gravemente — Refleti antes no que
expus sobre as leis de causa e efeito, estatuidas pelo Legislador Supremo no intuito de advertir o 
homem, como os Espíritos, dos erros que praticam em oposição à harmonia das demais leis. Vede
o castigo imposto pelo próprio dissoluto, que violou aquelas leis, colocando­se na situação de lhes
sofrer o ricochete, pois as faculdades radiosas, pelo Sempiterno concedidas às criaturas, jamais
serão contaminadas de impurezas pelo mau uso que delas faça o seu possuidor, sem que o atinjam
dolorosamente conseqüências inevitáveis! Sendo o Bem a base suprema da Vida, em que amarga
situação se colocará o ente que o conspurcou, dando­se ao mal, desarticulando­se todos os dias do 
trajeto natural que ascende para a Perfeição, arrastado por atos opostos aos que o Senhor estatuiu 
como  carreiro normal na sublime jornada?... Esqueceis então  as lágrimas que estes infelizes
fizeram derramar  a seus irmãos, aos quais infligiram tormentos oriundos do egoísmo e demais
expressões vis que deixavam extravasar do coração denegrido?... Das difamações com que feriram
suas vitimas, aprazendo­se em atirá­las ao descrédito das pessoas conceituadas?... Das delações, das criticas ferinas, das ignomínias com que muitas vezes enxovalharam a pessoa respeitável do próximo, valendo­se das faculdades do raciocínio e da inteligência apenas para infelicitar a
outrem, preparando outrossim, para si mesmos, os abismos em que se haviam de despenhar?... Pensastes nas ingratidões e traições impostas aos simplórios corações femininos, que
enredaram em suas garras abomináveis, forjadas em instintos sórdidos?... Na inocência infantil e
juvenil, que muitos destes que aqui vedes conspurcaram monstruosamente?... Nas cenas
degradantes por eles criadas e praticadas comumente, durante a existência terrena, levando a
corrupção e a perversão aos circunstantes dos planos objetivo e invisível que as presenciassem, e
infelicitando as correntes fluídico­magnéticas que sobem da Terra para o Invisível, a nós outros
sobrecarregando de preocupações por  obrigarem­nos a exaustivos serviços de saneamento e
higienização, a fim de que nossas próprias colônias não fossem corrompidas?... Ah! Meus filhos! Como vos admirais, agora, de que renasçam estes pobres tolhidos por 
incapacidades invencíveis se da existência que lhes foi concedida, a fim de tratarem de progredir,
fizeram arma contra os ditames sagrados do próprio Criador de Todas as Coisas, a quem muito e
muito ofenderam, ofendendo a si mesmos e ao próximo?!... Ao demais, não estarão eternamente
precipitados nos pélagos cheios das iniqüidades que cavaram!... A dor educadora corrigirá as anomalias de que se cercaram, reconciliando­os com a Lei! 
Oh! Deus é a Misericórdia Infinita, meus amigos! E deseja as criaturas harmonizadas com a beleza
eterna das suas leis. E se sabemos que essas leis são incorruptíveis, cumpre­nos observá­las e
respeitá­las a fim de não virmos a tragar  o fel irremediável das conseqüências que por nossa
própria vontade criarmos com os desvios da rota natural e luminosa..." 
Baixei a fronte, como sempre, em presença da lógica irretorquível de mais aquele
discípulo do Mestre Nazareno... Pelas galerias e antecâmaras próximas aos santuários, isto é, aos gabinetes médicos, onde
a distribuição de eflúvios minorativos era sábia e caridosamente operada, vimos que enfermeiros
iam e vinham, amparando doentes fracos e atemorizados provindos do pátio que acabáramos de
visitar e de outras dependências, a fim de serem beneficiados. Pelos "retalhados" observamos que
votavam especial comiseração, dado que mui penosamente se podiam locomover. A julgar pelas
exposições do Irmão João, que tecia considerações importantes a respeito de quanto se nos
deparava, seriam eles futuros paralíticos e enfermos de nascença, desde a infância revelando 
anormalidades impressionantes. Com efeito!  Suas atitudes eram tolhidas por dificuldades extremas de vibrações, dispersadas que foram estas pelo choque terrível; seus gestos pesados e desinteligentes, como que
peados pelas sombras dos golpes e contragolpes que se fotografaram tragicamente no espelho 
sensível da organização astral!  Choravam ininterruptamente, como se o choro houvesse
degenerado em hábito atroz criado pela intensidade do martírio, inquietos sempre sob a cruciante
angústia de perene mal­estar, conquanto submissos, incapazes de blasfemar, como geralmente
sucede aos suicidas muito desgraçados. Deixando, porém, para trás os santuários, onde não penetramos, atingimos salão amplo, espécie de auditório singelo e sugestivo, onde ensinamentos moralizadores eram ministrados por 
um jovem servo que, em existência remota, trouxera mui dignamente o feio burel de religioso franciscano, mas cuja alma se iluminara sob as virtudes hauridas nos ensinamentos redentores do 
Testamento do Divino Missionário, tão fielmente servido pelo seu patrono. Usando daquela inconfundível doçura, apanágio dos caracteres moldados na verdadeira
escola da iniciação cristã, esse novo legionário expunha singelamente, como quem aconselhasse
ou ensinasse a observar, a idéia de Deus e de Sua paternidade sobre toda a Criação, bem assim a
missão messiânica e suas dilatadas conseqüências beneficiando o gênero humano. O convite à prece, ao exame individual interior, era repetido e satisfatoriamente explicado 
todos os dias, antes do ingresso nos gabinetes para a higienização fluídica operada pelos dedicados
psiquistas. Esses os principais recursos a serem tentados na ocasião para tratamento dos enfermos, visto que seriam tentativas para a reeducação mental, exercícios que levariam o paciente a
estabelecer mais tarde correntes harmoniosas com os benéficos poderes do Alto; e tão 
transcendente ensinamento era enunciado  singelamente, ao critério de métodos ao alcance
daquelas mentes conturbadas, e sob inspirações de uma doce e fraternal caridade cuja fragrância
penetrou até o âmago das nossas almas comovidas ante a visão de tão nobres corações devotados
ao auxílio amoroso em torno do próximo! 
O jovem obreiro, sincero, humilde no seu imensurável esforço  pela caridade, não 
enxergava, naqueles réprobos feios e repulsivos a quem servia, o indivíduo maculado pelos erros
vergonhosos, nem a configuração astral execrável do que fora um homem dissoluto que dispersara
a faculdade nobre dos sentidos no domínio dos gozos impuros. O que ele via e piedosamente
amava, desejando servir  e engrandecer, eram irmãos menores do que ele, os quais mandava o 
Dever fossem ajudados pelos mais velhos a galgar as escarpas do progresso; eram almas
destinadas à glorificação da Luz, que necessitavam orientar­se na longa estrada em que realizariam
o espinhoso trajeto da ascensão para o Foco Sublime, gerador da Vida! 
"— Poderemos ser informados das démarcus também em torno desses companheiros para
o notável acontecimento da volta ao corpo material?!..."  —  solicitou  novamente o doutor de
Coimbra, a quem interessavam mui vivamente as alusões ao  assunto melindroso de um
renascimento na Terra, porquanto lhe afligiam incessantemente a consciência fortes intuições
quanto ao dever urgentíssimo, pendente do seu caso, de nova permanência num corpo de homem, a fim de se desobrigar, através da expiação, do crime na pessoa indefesa daquela a quem amara.
"— Sim, meu jovem amigo — satisfez o amável guia —, será possível e até indispensável
pô­los a par dos trabalhos gerais em torno desse importante assunto que tão de perto interessa a
todos vós. Todavia, não é a esta repartição que compete esclarecimentos mais amplos, visto existir 
em nosso Instituto o Departamento  autorizado aos serviços gerais do retorno às existências
corporais. Certamente visitá­lo­eis ainda. Nesse Departamento vereis que sobressaem, pela sua invulgar importância, os
laboratórios onde se concertam planos para o melindroso certame, onde são preparados os
desenhos e mapas para os futuros corpos a serem habitados pelos delinqüentes cuja tutela nos seja
temporariamente confiada. Se este for suscetível de renascer com envoltório carnal deformado, ou 
adquirir enfermidade como a cegueira, por exemplo, na seqüência da existência, ou  ainda
acidentar­se em seu  decurso, tornando­se mutilado, o mapa que lhe seja destinado será traçado com as necessárias indicações, pois já sobre o seu organismo perispirítico existirá o sinal da futura
deformidade física, porque o seu estado mental e vibratório, coagido pelos remorsos, imprimiu na
poderosa sensibilidade daquela sutil organização a vontade de se tornar mutilado, cego, mudo, etc., etc., a fim de expiar o mau passado, como vem sucedendo convosco mesmo, caro irmão Sobral, que vos tendes fortemente impressionado com o caso das próprias mãos... Necessariamente, a preparação de tais debuxos estará sempre a cargo de técnicos cônscios
do alto encargo que lhes é conferido, o que indicará serem eles Espíritos merecedores da plena
confiança dos diretores desta Colônia. Uma vez concluídos serão encaminhados à direção dos gabinetes de análises, os quais
realizarão os serviços comparativamente com as premências expiatórias do interessado, levantando 
a justiça dos méritos que tenha, curvando­se às injunções das desvantagens dos deméritos, tudo 
concorde com as conclusões anteriormente feitas pela seção de "Programação das Recapitulações".
Quanto seja possível para suavizar as penúrias das provações, será por lei concedido ao 
delinqüente que voltar a renascer na Terra. De outro lado, suas forças morais e suas capacidades de
resistência serão igualmente balanceadas. Convém acentuar, meus caros amigos, que a reencarnação é concessão sublime feita pelo 
Pai Supremo às Suas criaturas para que progridam e se engrandeçam, preparando­se para a herança
que lhes estará reservada na glória do Seu reino. É de lei. E ninguém há que atinja o seu destino 
imortal sem palmilhar os degraus dos renascimentos, na Terra ou em outros mundos planetários! 
Todavia, se a alma rebelde há desperdiçado  longo tempo, abusando dessa concessão, com
manifesto desrespeito à Lei Magnânima que lhe permite tantas vezes o mesmo ensejo, tornar­se­á
concessão ainda mais apreciável porque, geralmente, para tais casos, existirá a intercessão do 
próprio Mestre Redentor, que ao Criador Supremo suplicará novos ciclos de experimentações a
fim de poder o rebelde reabilitar­se..." 
"—  Do exposto, respeitável irmão, só nos cumpre concluir que, sendo o corpo físico­ 
terreno depósito sagrado, como verdadeira dádiva celeste que é, as criaturas encarnadas
procederiam com muito mais inteligência se se conduzissem à altura da concessão  recebida, portando­se com respeito, consideração e prudência durante o  período em que se obrigassem a
permanecer usufruindo as vantagens morais que a estada no planeta lhes confere?... E isso porque
evitaria a repetição de existências expiatórias, dolorosas e inevitáveis, resultantes que são do uso 
do desrespeito  às leis veneráveis a que é submetida a Vida Universal?..." — intervim eu, algo 
contrafeito.
"—  Assim é, meu  amigo!  Muitas dores seriam assim evitadas! —  tornou  o diretor  do 
Manicômio. — E se o corpo físico­terreno é depósito sagrado que ao homem cumpre respeitar e
proteger, salvaguardando­o quanto  possível de impurezas e danos, o físico­astral, que é o  que
trazeis no momento, não o será menos!... Enquanto  que nossa Alma­Inteligência, Consciência, Razão, Sentimento, o Ser, enfim, é a própria essência do Criador, partícula Sua, centelha extraída
do Seu Supremo Ser! 
Por aí percebereis, meus caros amigos, que todos somos templos veneráveis, pois que
possuímos a glória de trazer Deus em nós, e que, quer na Terra, como seres humanos, ou no Invisível, como Espíritos libertos, devemos respeito e veneração a nós mesmos, bem assim aos
nossos semelhantes, atendendo a que todas as criaturas são perfeitamente iguais diante do seu 
Criador, jóias muito amadas do escrínio sempiterno d’Aquele que é a Suprema Razão da Vida! Daí
certamente se origina a lei básica divina:
‘—Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo’." Seguiu­se pausa dilatada enquanto o leal servidor  atendia a injunções inadiáveis do seu 
cargo e durante a qual nos quedamos, pensativos e silenciosos, observando  quanto possível as
figuras angustiosas dos pobres internos que nos eram dados a contemplar. A volta do mentor,
Mário Sobral, insofrido e interessado, quebrou o silêncio, exclamando de mansinho:
"—  Gostaria, se possível, continuar ouvindo vossas explanações técnicas, venerável
irmão..." 
O velho servo de Jesus sorriu  e, correspondendo  à humilde solicitação com amigável
gesto, continuou, atraindo novamente nossa atenção:
"— Todavia, consoante vos dizia, tem havido casos em que nossa Guardiã não permite a
reencarnação tal como fora por nós ideada, concedendo­nos então o gracioso favor da sua
inspiração para programação mais acertada, condizente com o estado do postulante. De qualquer 
forma, porém, os planejamentos para as peripécias de uma encarnação serão rigorosamente
estudados, assentados, realizados e revistos, concordes sempre com a mais eqüitativa justiça... entrando em pleno  cumprimento a alta expressão da sentença imortal sancionada pelo Mestre
Divino, a qual vem esclarecer também todos os grandes e irremediáveis problemas que afligem e
decepcionam a Humanidade:
‘—Acada um será dado segundo as suas obras’." Comumente é o próprio pretendente ao renascimento que escolhe as provações por que
passará, os acres espinhos que lhe irão dilacerar os dias da existência terrena, e onde convirá que
remedeie as conseqüências do  pretérito culposo. Ele próprio suplicará às Potestades Guiadoras
ensejos novos que lhe permitam testemunhar  o arrependimento de que se achar possuído, assim
como  o desejo de iniciar caminhada regeneradora, que lhe favoreça ocasião de corrigir­se dos
impulsos inferiores que o arrastaram ao mau procedimento... e tais testemunhos tanto poderão ser 
efetivados num corpo relativamente são, quando dominem os sofrimentos morais superlativos, como num mutilado ou tolhido por enfermidades irremediáveis, tais sejam os agravantes da falta, os deméritos acumulados... Assim sendo, o próprio paciente organizará o traçado dos mapas para o seu futuro estado 
corporal e a programação dos acontecimentos principais e inevitáveis que deverá viver, efeitos
lógicos e inseparáveis das causas criadas com as infrações cometidas, mas assistido sempre por 
seus mentores dedicados. No que concerne aos internados nesta dependência hospitalar, não será, todavia, assim. Meus pobres pupilos não se encontram em condições de algo tentarem voluntariamente. Sua volta
ao renascimento carnal será então o cumprimento de um dispositivo da Grande Lei, que faculta
novo ensejo ao infrator sempre que houver fracassado o ensejo anterior... Será o movimento de impulsão para o progresso, o  medicamento decisivo que há de colocá­los em situação de
convalescentes, assinalando a alvorada de etapas redentoras em seus destinos..." 
Aturdido em presença de tão profunda quanto melindrosa tese, que, eu bem o percebia, caberia em muitos volumes, seguidamente perguntei ainda, enquanto caminhávamos demandando 
o exterior, cogitando do regresso:
"— Desculpai minha insistência, venerável irmão diretor... Porém, o assunto que acabais
de expor, por seu  ineditismo, pela intensidade e profundeza dos raciocínios que provoca e
inexcedível surpresa que proporciona ao pensador, não só empolga como sinceramente comove... Seria acaso possível examinarmos desde já alguns desses mapas, mesmo antes da preparação dos
que nos disserem respeito?... Como são eles?... Ou será tão nobre labor oculto a olhos profanos?..." 
E sentia­me realmente comovido, acovardado mesmo, lembrando­me de que também eu 
era réu, que me suicidara fugindo à cegueira dos olhos, que tudo indicava teria o pobre Mário o 
seu futuro mapa corporal de mãos mutiladas, e que algo me segredava que eu deveria ser ainda
cego, de qualquer forma cego! 
Irmão João decerto percebeu a angústia que me ensombrava a mente e o coração, pois que
assumiu expressão de inconfundível bondade ao responder:
"—  Certamente que um serviço de tanta responsabilidade não será realizado 
publicamente, para divertir curiosos, que também os há aqui. Não obstante, com recomendações de
autoridades competentes, as câmaras poderão ser franqueadas à visitação. Sereis encaminhados a
elas, estou  certo, visto tratar­se da necessidade de vos ministrar instrução... Porfiai por vos não 
desanimardes ante as perspectivas futuras, meu  amigo! Confiai antes na inexcedível ternura de
nosso Amado Mestre e Senhor, que é o Guia infalível dos nossos destinos... Lembrai­vos outrossim de que Aquele que estabeleceu a sabedoria das leis que regem o 
Universo também vos saberá fortalecer para a vitória sobre vós mesmos!..." 
Tudo era suavidade em torno do Pavilhão Indiano, onde acabávamos de chegar. Aos
nossos ouvidos soaram os doces convites para a meditação da noite. Era o momento solene em que
a Colônia se consagrava à comunhão mental com sua augusta tutelar Maria de Nazaré... Minhas recordações assinalam ainda que, nessa tarde, nossas preces foram mais ternas, mais humildes, mais puras...

Memórias de um SuicidaOnde histórias criam vida. Descubra agora