II "Vinde a mim"

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Aníbal entrou a comentar a urgência de cada um de nós, como da Humanidade inteira, quer do plano físico­terreno ou do Invisível inferior e intermediário, se reeducar sob a orientação 
das fecundas normas cristãs. Afirmou, em análise sucinta, contrariando idéias que muitos de nós
abrigavam, não existir misticismo supersticioso nem fatos miraculosos e anormais na epopéia
magnífica do  Cristianismo, epopéia que não se limitava do  presépio de Belém ao drama do 
Calvário, mas que se estendia das Esferas de Luz às sombras da Terra, perenemente, em lances
patéticos, positivos, sublimes, a que só a cegueira da ignorância deixa de apreciar devidamente. Ao 
contrário disso, o Cristianismo, doutrina universal cuja origem se fixa nas próprias Leis
Sempiternas, possuía bases práticas por excelência, trazendo por finalidade a recuperação moral do 
homem para si mesmo e a sociedade em que for chamado a viver no seu longo carreiro evolutivo, com vistas ao engrandecimento da Humanidade perante as Leis Sábias do Criador. Lembrou que
os homens terrenos projetaram sombras sobre os ensinamentos do Mestre Excelso, envolvendo­os
em complexos calamitosos, por empanar­lhes o brilho da essência primitiva com inovações e
atavios próprios da inferioridade pessoal de cada um, desfigurando, destarte, a verdade de que são,
os mesmos ensinamentos, o expoente máximo. Asseverou com veemência impressionante, da qual
não julgaríamos capaz um adolescente, que só os magnos e altruísticos conhecimentos das
doutrinas educativas expostas pelo Excelso Catedrático Jesus de Nazaré permitiriam a nós outros, como à Humanidade, ensejo à reabilitação imprescindível, preparando­nos para a aquisição de
uma nova e elevada Moral, para a sanidade de ações capazes de levarem a alvorecer em nossos
míseros corações horizontes vastíssimos, de ressurgimento pessoal e coletivo, de progresso 
legítimo, na escala de ascensão para a Vida abundante da Imortalidade!  Que, doutos, sábios, gênios que fôssemos, de nada nos aproveitariam tão lustrosos cabedais se ignorantes
continuássemos das normas da Moral do Cristo de Deus, em cuja aplicação reside a glória da
felicidade eterna, uma vez que Sabedoria sem Amor e sem Fraternidade tem suas factícias glórias
apenas no seio das sociedades terrenas... Participou­nos, em seguida, que sua primeira aula consistiria na apresentação de sua
personalidade a nós outros, seus discípulos. Que necessário seria que o conhecêssemos intimamente, a fim de que seus exemplos nos estimulassem na senda espinhosa em que seríamos
chamados a solver vultosos débitos, porquanto  será sempre de boa pedagogia que o mentor 
apresente seus próprios exemplos aos alunos, a quem inicie, e também para que aprendêssemos a
amá­lo, a nele confiar, tornando­nos seus amigos, considerando­o bastante digno de ser ouvido e
acatado. Que pudéssemos, em primeira análise, observar nele próprio os efeitos imarcescíveis de
um caráter reedificado pelo amor do Bom Pastor, redimido através dos preceitos que deveríamos, por nossa vez, conhecer para nos reerguermos das sombras da impiedade em que jazíamos, pois a
verdade era que desconhecíamos totalmente o Cristianismo legado pelo Mestre Nazareno, não 
éramos cristãos, senão adversários do Cristo, ovelhas rebeladas que, em verdade, não conheciam o 
seu Pastor!
Então, o jovem Aníbal contou­nos a sua vida!  Não  apenas a existência última,
testemunhada em terras da Itália durante os ominosos dias da Idade Média, mas as variadas
migrações terrenas no giro evolutivo que lhe fora próprio, seus deslizes como Espírito em marcha, que também é, as lutas pela redenção, frente aos sacrifícios e às lágrimas das reparações, os
impulsos para o Bem, os incansáveis labores que lhe trouxeram os méritos nas inspirações do vero 
arrependimento pelo tempo perdido, labores sempre crescentes, cada vez mais árduos, assim
também os aprendizados realizados durante a erraticidade, tarefas e missões no plano Astral como 
no Material, a fim de provar a eficiência dos progressos adquiridos, seu  devotamento a Jesus
Nazareno, a quem se ligara pelas ardências de uma paixão que nada mais poderia ensombrar ou 
arrefecer! 
No entanto, era com assombro que ouvíamos as palavras de Aníbal traduzidas em
imagens e cenas a se refletirem na tela miraculosa que lhe ficava junto. Assim foi que, enquanto 
falava, a realidade de suas transmigrações terrenas espirituais se reproduziam, ali, com tão verídica
nitidez, que nos julgaríamos co­participantes seus através das idades ressuscitadas dos repositórios
secretos dos seus pensamentos, pois alta sugestão sobre nós exercida dominava nossas faculdades,
ligando­as à vontade do mentor e dos seus cômpares ali presentes, elevando­nos a olvidar de que
não passávamos de meros alunos que recebiam a introdução à primeira aula! 
Positivamente mais real, mais completo e sugestivo  do  que o cinematógrafo dos dias
vigentes, mais convincente que as cenas teatrais que tanto absorvem e arrebatam o observador, porque era a vida em si mesma, natural, humana, realmente vivida, o retrospecto do pensamento de
Aníbal foi passando gradativamente pela tela enquanto nem mesmo desta nos lembrávamos, pois
não a distinguíamos, senão os fatos empolgantes que se decalcariam em nossas mentes quais
estímulos para futuras tentativas! Quando cessou o dramático desfile, o belo instrutor adolescente
surgia ao nosso entendimento como um ser amado de quem nunca mais nos desejaríamos apartar. Fora, por assim dizer, um consórcio de nossas almas com a sua, o que se verificara através das
exposições feitas, porquanto, a mais viva atração afetiva nos impelia para ele, correspondendo, assim, os nossos sentimentos aos seus nobres e fraternos desejos. Não obstante, observando nossa confusão, pois surpreendia­nos o fato para a explicação 
do qual não trouxéramos conhecimentos suficientes no acervo dos cabedais intelectuais até então 
adquiridos, falou ainda o lente, suspendendo, em seguida, os trabalhos, por aquele dia:
"— As cenas a que acabastes de assistir, deslizando sobre esta tela reprodutiva, que não é
senão um espelho singular, para vós desconhecido, onde deixei que se refletisse minha própria
alma, foram as minhas recordações, caríssimos discípulos, acordadas intactas, vivas, dos refolhos
supremos da Consciência! 
Todos os filhos do Altíssimo, ao viverem as existências planetárias, como as espirituais,
imprimem nos escaninhos da alma, nas camadas profundas da Consciência, toda a grande epopéia
das trajetórias testemunhadas, as ações, as obras e até os pensamentos que concebem! Sua longa e
tumultuosa história encontra­se neles próprios gravada, como a história do globo, onde já vivemos,
se acha arquivada nas camadas geológicas e eternamente reproduzida, fotografada, igualmente
arquivada, nas ondas luminosas do éter, através do Infinito do Tempo! Por sua vez o corpo astral, envoltório que trazemos presentemente, como Espíritos livres do fardo material; aparelho 
delicadíssimo  e fiel, cuja maravilhosa constituição ainda não sois capazes de compreender,
registra, com nitidez idêntica, os mesmos depósitos que a Consciência armazenou  através do 
tempo, arquiva­os em seus arcanos, reflete­os ou expande­os conforme a necessidade do momento  — tal como fiz agora —, bastando para isso a ação da vontade educada! Ora, se tivésseis educadas
as faculdades da vossa alma, se, cursando Universidades, na Terra, esclarecendo inteligências
como homens que fostes, igualmente houvésseis cultivado os preciosos dons do Espírito, assim
vos apossando dos sublimes conhecimentos das Ciências Psíquicas, além de não haver convosco a
possibilidade de uma derrota produzida por suicídio, porquanto vos teríeis colocado em planos
muitas vezes superiores aos em que medram as paixões e insânias que a este dão  causa, agora
estaríeis à altura de compreenderdes minhas expressões mentais sem o auxílio, por  assim dizer,
material, deste aparelhamento  que me fotografou  e animou  os pensamentos, as lembranças e
recordações, reproduzindo­as, para vós, tal como se acham arquivadas nos livros secretos do meu 
Espírito.Uma operação melindrosa o que acabais de ver! 
Exige sacrifício por parte de quem atenta. Meus irmãos de ideal aqui presentes e meus
discípulos forneceram­me fluidos magnéticos necessários à corporificação das imagens e à
reprodução dos sons, a fim de que meu esforço não fosse demasiado; e, envolvidos no ambiente
dominado por ondas especiais, de um magnetismo superior, que é o nosso principal elemento, vós
mesmos vos sugeristes a convicção de que comigo vivestes minhas vidas, quando a verdade era, apenas, que assistíeis ao desenrolar do pretérito em meu ser depositado... Participo­vos, em tempo, que não tardareis a conhecer as mesmas experiências, extraindo de vós mesmos o passado que
ainda dormita, porque mantendes, embrutecidos pelas repercussões chocantes do vosso estado de
suicidas, dons da alma que nas entidades normais despertam com facilidade tão logo ingressam na
espiritualidade... Todavia, não competirá a mim o orientar­vos neste áspero  e doloroso 
retrospecto... O conhecimento que, com o fato agora presenciado, adquiristes, comum nos planos da
Espiritualidade, mesmo vulgaríssimo, um dia enriquecerá as aquisições intelectuais e científicas da
Terra, para galardão dos homens, através da Ciência Psíquica Transcendental. Até lá, porém, haverá o homem de moralizar­se, desenvolver faculdades preciosas do Espírito, as quais, no momento, ele ignora possuir, a fim de, só então, tornar­se digno de tão sublime aquisição, para que
não venha a servir­se de um dom de natureza divina como instrumento de crimes e paixões
subalternas, como há acontecido com outros valores sagrados que até hoje há recebido! 
Na própria Terra, esse dom, cujo valor inestimável ainda é desconhecido às inteligências
vulgares, foi exercido para as altas finalidades da educação das primeiras massas que se fizeram
cristãs. Seria difícil fazer compreender o sublime alcance do Evangelho do Reino a criaturas
simples e iletradas, apenas com o ardor da oratória, a magia do verbo. O Nazareno, compassivo e
amoroso, senhor de poderes psíquicos incalculáveis para nós outros, dono da maior força mental
que já nos foi dado conceber, expondo suas formosas lições criava cenas e corporificava­as, dando 
aos ouvintes maravilhados o esplendor de visões interiores, que o seu  pensamento  fecundo e
poderoso não se cansava de distribuir. É certo, porém, que nem todos aqueles que o ouviam
estariam à altura de compreendê­lo. Mesmo dentre os escolhidos para lhe auxiliar  o ministério 
redentor houve quem o não  compreendesse. Mas os outros, para quem Ele representava a luz
incorruptível da Verdade, os simples, os sofredores sedentos de justiça e de esperança, os de boa­  vontade, destituídos de vaidade, em quem o egoísmo do século já não medrava, vibrando mais ou 
menos harmoniosamente com Ele, seguiam­lhe as ondas criadoras do  pensamento luminoso  e
absorviam o ensinamento exemplificado de todas as formas. Seus discípulos, do mesmo modo, ao 
falarem d’Ele, inconscientemente projetavam recordações e pensamentos que, recolhidos pelos
cooperadores espirituais incumbidos de assisti­los, eram imediatamente corporificados, em
sugestões poderosas, para a visão do ouvinte sincero e de boa­vontade, o qual passava, então, não 
apenas a ouvir uma narração, mas a ela assistir, a vê­la como se presente estivesse aos feitos
sublimes do Inesquecível Mestre. Assim também, caros discípulos, realizaremos nossas preleções em torno da Doutrina
legada pelo Divino Instrutor, pois muito inspiradamente andou a direção desta Colônia de reclusos
adotando tal método para instrução  de seus internos, por serem impossíveis, através dele,
interpretações pessoais, conceitos errôneos, sofismas ou interpolações!" 
A partir daquele dia assistíamos periodicamente às aulas de Aníbal, iniciado  que foi, definitivamente, o nosso  preparo moral à luz das superiores doutrinas expostas pelo  verbo 
imarcescível do Divino Messias. O catedrático explanou, de princípio, as causas da vinda de Jesus à Terra. Arrebatador 
desfile de civilizações passou, gradativamente, pela tela mágica, demonstrando aos nossos
surpresos testemunhos a mais fecunda exposição das necessidades humanas, muitas das quais
jamais havíamos tido ocasião de perceber! Sem a palavra messiânica as sociedades terrenas, então,
se nos afiguraram, com efeito, como tão bem conceituava Aníbal de Silas, um mundo sem a
aquecedora luz de um globo solar, um coração vazio da força impulsionadora da Esperança! O
mestre falava e suas narrativas, suas exposições magistrais, seus exemplos mais que convincentes,
irresistíveis, e seu  verbo entusiasta e ardente arrancavam do turbilhão poeirento dos séculos
mortos, das idades desaparecidas e até dos momentos contemporâneos, imagens e cenas, motivos
reais, exemplos coletivos ou  individuais, que, sob  o  calor magnético da sua superior  vontade, associada à de seus pares, se humanizavam diante de nós, levando­nos a examiná­los e estudá­los
sob o critério elucidativo de suas orientações. Um curso superior e atraente de Filosofia e Análise comparada foi por nós iniciado, então. E era empolgante, era belo  e comovedor, com nosso emérito instrutor ressuscitarmos do 
silêncio dos séculos a existência das sociedades que se foram na sucessão  das idades, seus
costumes, suas quedas, seu heroísmo, suas vitórias! Ao nosso entendimento se apresentou a vida
da Humanidade desde os primórdios, fornecendo­nos o mais belo estudo que ousaríamos conceber, a mais fecunda elucidação que nossas mentes seriam capazes de abranger, porque a história
magnífica do crescimento das sociedades que lutaram sobre a crosta do planeta, de falanges que ali
iniciaram o próprio desenvolvimento moral e mental, que nasceram e renasceram muitas vezes e
depois se foram, atingindo ciclos melhores em outras moradas do Universo, e, assim, dando lugar 
a outras falanges, a outras humanidades, suas irmãs, as quais, por sua vez, lutariam também, através dos renascimentos, trabalhando  continuadamente em busca do mesmo progresso, enamoradas do mesmo alvo — a Perfeição! 
Entretanto, no decurso de tais exames tantas eram as desgraças que descobríamos para
estudar, tantos os sofrimentos, as prementes situações, os problemas indefinidos, os desnorteantes
complexos engendrados pelo  egoísmo com suas múltiplas feições apaixonadas, tão  grandes as
lutas da humanidade ignorante da própria finalidade, que impossível se tornou  permanecermos
indiferentes qual o observador frio que estuda apenas o cadáver. Fazendo parte dessa sociedade
terrena, dessa humanidade desgraçada, ímpia e sofredora que desconhece Deus por preteri­lo às
paixões, éramos solidários com seus mesmos infortúnios, pois que também nossos, e pesada
angústia infiltrava­se pelos meandros do nosso espírito, despertando ânsias inexprimíveis, estados
mentais e alucinatórios inconcebíveis ao pensamento humano, como desejos sacrossantos de algo 
que nos libertasse das trevas hiantes em que nos sentíamos tragados... Até que, em certa aula, por um dia ameno e harmonioso em que palpitavam em nosso imo 
anseios vagos de esperanças, como promessas benditas que entornassem aleluias pelo nosso ser, Aníbal apresentou­nos a figura inconfundível, a figura inesquecível do Meigo Rabi da Galiléia, através das lembranças reproduzidas na tela magnética com o colorido vivo e sedutor da realidade! 
Então, a epopéia augusta do Cristianismo, desde a manjedoura humilde de Belém transformada em
berço celeste, desenvolveu­se magistralmente, em estudos fecundos para o nosso  entendimento, que começou  a soletrar, só  então, a palavra sacrossanta da redenção!  As cenas descritas pelo 
expositor, que tão bem conhecera a época do advento da Boa­Nova do Reino de Deus, mostravam
circunstanciadamente, com clareza impressionante, as prédicas inesquecíveis do Divino 
Mensageiro, os discursos sugestivos, animados pelo colorido vivo dos quadros citados, as lições
resplandecentes da mais elevada e pura moral, lançadas aos axes da Judéia humilde e oprimida, mas ecoadas pelos recantos mais longínquos do mundo quais convites amistosos e perenes à
regeneração dos costumes para o reinado do verdadeiro Bem, apelos amorosos de confraternização 
pessoal e social, para a concretização de uma Pátria ideal na Terra, cujas normas de governo Ele
oferecia através de Sua oratória impecável, de Sua exemplificação na vida prática sem
precedentes, como nas fulgurações imperecíveis daquela áurea Doutrina cujo alvo era a educação moral do homem, cuja finalidade era sua exaltação para a glória da vida sem ocasos, da Vida
Eterna na unidade com Deus! A imagem sedutora do Enviado Celeste gravou­se, por assim dizer,
também em nossas mentes, em traços cativantes e indeléveis, tornando cada um de nossos
corações sincero enamorado do Cristianismo, predispostos a aquisições morais sob suas benéficas
inspirações, pois, enquanto Aníbal narrava fatos, relembrando passagens enternecedoras, enquanto 
sua palavra vibrava em ondas sonoras de comentários férteis, extraindo essências de ensinamentos
capitais para nossa iluminação, víamos os cenários que serviam à ação magnificente do Grande
Mestre, ao mesmo tempo  em que sua figura inconfundível dominava a expressão, exercendo o 
apostolado sublime! 
Tínhamos a impressão  convincente de o estarmos ouvindo proferir o Sermão  da
Montanha, enquanto as aragens perfumosas que ondulavam docemente no cimo da colina lhe
faziam esvoaçar o  manto, desalinhando­lhe os cabelos... De outra vez, era às margens do 
Tiberíades, era em Genesaré, pelas cidades da Judéia ou pelas aldeias pobres da Galiléia, como se
o seguíssemos também, fazendo parte daquela massa de povo ávido de suas palavras consolatórias, de seus favores dulcíssimos!... E por  toda a parte: em conversação com partidários, amigos ou 
discípulos; no Templo, explicando aos exegetas da época as regras áureas da Boa­Nova que trazia;
ou  curando, favorecendo, protegendo, consolando, exaltando, educando, ensinando, redimindo, Aníbal nos levava a ouvi­lo e aprender, com Ele mesmo, os caminhos para nossa urgente
reabilitação! Fazia­o, porém, Aníbal, pacientemente, tecendo comentários qual o professor emérito 
cioso da clareza das teses expostas, para a boa compreensão dos alunos... Assim foi que fomos informados de que não apenas a Terra recebera as alvíssaras da Boa­  Nova, através de sua palavra de bondade e redenção, mas também o Astral inferior fora visitado 
por sua presença, visto possuir Ele poder bastante para em qualquer local se apresentar, tornando­ 
se visível como lhe aprouvesse, e uma vez que se tratava de local onde os infortúnios e as
calamidades de ordem moral são, incontestavelmente, mais intensos e profundos que os do 
planeta, ali também comparecia, convertendo Espíritos que havia séculos permaneciam nas trevas
da ignorância ou  no declive do ostracismo, tal como na Terra convertia homens, a todos
estendendo mão fraterna e redentora!  Igualmente nos dizia que o mundo terreno desconhece
grande parte dos ensinamentos por Ele trazidos, pois que, destruídos foram muitos aspectos, verdadeiramente feéricos, da Verdade Divina por Ele exposta, rejeitados que foram pela má­fé ou 
pela ignorância presunçosa dos homens!  Mas que, no entanto, soara o momento em que sua
Doutrina Grandiosa seria devidamente alçada para o conhecimento de todas as camadas sociais! 
Para isso, a Terceira Revelação de Deus aos homens era já fornecida à Humanidade em nome do 
Redentor... e nós mesmos, que éramos Espíritos, estávamos convidados a colaborar nesse
empolgante movimento chefiado pelo Mestre, procurando falar com os homens a fim de revelar­ 
lhes estas coisas todas, porquanto a chamada Terceira Revelação mais não era do que um
intercâmbio ostensivo, minucioso, de idéias entre os Espíritos e a Humanidade, subordinado aos
ditames da Ciência Universal como da Moral Excelente do próprio Cristo de Deus! 
Depois, ao findar o drama do Calvário, conhecemos as pelejas ardentes dos discípulos
pela difusão do Testamento regenerador do Mestre, o martírio dos humildes e abnegados cristãos, inspirados sempre pela força imanente da fé... e a reforma conseqüente dos indivíduos que se
submetiam àqueles princípios regeneradores e educativos! Estudamos, analisamos e investigamos
tudo quanto fora possível à nossa mentalidade suportar em torno da Doutrina de Jesus Nazareno. Muitos tomos, complexos, delicados, precisaríamos escrever para que pudéssemos dar contas ao 
leitor da profundidade e extensão dessa incomparável Doutrina que tem origem no  próprio 
pensamento divino, e que, sendo a Lei mesma estatuída pelo Criador de Todas as Coisas, um dia
envolverá em suas imperecíveis fulgurações todos os setores das sociedades terrestres e
espirituais!
Sentíamo­nos atraídos e arrebatados. Só então compreendemos a razão da súbita
transformação daquela Maria de Magdala, tão sedutoramente apontada no Evangelho do Senhor;
daquele Saulo de Tarso, vaso escolhido  do Messias Celeste; e o que dantes nos parecia mito,
lendas imaginosas de orientais místicos, avultou­se em nosso entendimento como fato lógico e
irresistível, que não poderia deixar de existir tal como se deu e as tradições narraram! Apresentado 
à nossa compreensão assim, naturalmente, com singeleza, desataviado dos mistérios com que os
homens teimam em ofuscar­lhe a grandeza, o Enviado Celeste impôs­se à nossa convicção 
realmente como o Mestre por excelência, o Guia Incomparável, devotado ao superior  ideal da
regeneração humana através do Amor, da Justiça, do Trabalho! Compreendemo­lo e amamo­lo, então, o necessário para nos abastecermos da Fé e da Esperança, qualidades indispensáveis ao 
Espírito em marcha de progresso, as quais, havia séculos, faltavam nos cabedais dos nossos
corações! 
Esse admirável curso requereu de nossa boa­vontade e esforços, e da abnegação do nosso 
preceptor espiritual, longos anos de dedicação e estudos incansáveis, assim como de
exemplificação e prática, visto ser a Doutrina Messiânica prática por excelência, confirmando­se
invariavelmente através da vida cotidiana de cada adepto. Era a iniciação cristã rigorosamente
ministrada, de forma a não nos deixar motivos nem ensejos para futuros deslizes nos campos da
Moral! 
Mas a caminhada afigurava­se árdua, demasiadamente longa para muitos de nossos
cômpares, os quais se deixavam turbar frente ao labor espinhoso e constante, que se tornaria
imprescindível desenvolver. Todavia, chegáramos a uma época de nossa existência de Espíritos
em que já não era possível estacionar, vergados sob as crenas do desânimo. Reagíamos contra as
ameaças da fraqueza, da angústia feraz que nos rondava, compreendendo que urgia prosseguir a
despeito do infinito de lutas que acenavam nas dobras do porvir, enquanto que a protetora voz da
Consciência nos advertia de que, com o Lente Magnífico de Nazaré, adquiriríamos cabedais justos
para a jornada que se delineava ao nosso  pávido entendimento de delinqüentes arrependidos!
"Vinde a mim, vós que sofreis, e eu vos aliviarei..." E nós atendíamos ao doce e irresistível chamamento  e avançávamos... e seguíamos...
Jesus Cristo, Divino Redentor das almas frágeis e rebeladas cumpria a promessa: atraía­nos com
seus ensinamentos sublimes, tomava­nos para seu  redil e convencia­nos a perseverar  em seus
conselhos, provando­nos todos os dias, através da transformação miraculosa que em nosso ser se
operava, o caridoso interesse em desviar­nos da desgraça para encaminhar­nos à redenção!
Empolgados por esse curso atraente, que tanto  alívio nos trouxera, esquecíamos os
dramas penosos, o desequilíbrio das paixões que nos haviam desgraçado, esquecíamos a Terra e
dela só lembrávamos graças a outros estudos que alternadamente éramos conduzidos a
experimentar, para eficiência da preparação, pois, como afirmamos acima, tínhamos aulas práticas, onde testemunharíamos a eficiência do aprendizado teórico, antes de que as provas reais de uma
nova encarnação terrestre nos conferisse a palma da reabilitação. Não raramente recebíamos a visita, durante as arrebatadoras aulas que palidamente
esboçamos, de outros antigos mestres de iniciação, os quais, apresentados pelo nosso catedrático, explanavam conceitos e apreciações em torno das doutrinas e normas cristãs, com uma ardência
empolgante e sublime! Novos motivos para instrução obtínhamos então, nunca menos belos nem
menos agradáveis do que os que diariamente nos eram expostos. Vivíamos reclusos, era bem
verdade. Continuava não existindo permissão para sairmos da Colônia a não ser em grupamentos
escoltados, nas turmas de aprendizes, mas também não era menos verdadeiro que vivíamos
rodeados de uma assistência seleta, no âmbito social de uma plêiade de educadores e intelectuais
cuja elevação  de princípios ultrapassava tudo quanto poderíamos conceber!  E porque
compreendêssemos que tal reclusão era­nos como dádiva magnânima a auxiliar­nos o progresso, a
ela nos resignávamos com paciência e boa­vontade. Diariamente, ao entardecer, eram­nos permitidos recreios no grande parque da
Universidade. Reuníamo­nos então em grupos homogêneos e nos dávamos a conversações, comentários em torno de nossas vidas e da situação presente. Nossas boas preceptoras, as
vigilantes de cada grupo, geralmente tomavam parte em tais recreios, e até nossas irmãs dos
Departamentos Femininos, o que nos permitiu alargar intensamente o número de nossas relações
de amizade. Seria difícil, ao fim de dez anos de internação no Instituto de Cidade Esperança,
reconhecerem em nós outros os vultos enfurecidos e trágicos do Vale Sinistro, aqueles
mentecaptos ridículos reproduzindo a cada instante o ato maléfico do suicídio  e suas satânicas
impressões! Acalentados pela Esperança, aliviados pela magia envolvente do Amor de Jesus, sob a
inspiração de cujos ensinamentos ensaiávamos novo surto, éramos entidades que poderiam ser 
consideradas normais, não fora a consciência que tínhamos da própria inferioridade de trânsfugas
do Dever, coisa que muito nos afligia e envergonhava, tornando­nos indignos em nosso próprio 
conceito, imerecedores do auxílio de que nos rodeavam! 
As solenidades do  Ângelus encontravam­nos, freqüentemente, ainda no parque. Acentuava­se a penumbra em nossa Cidade e nostalgia dominante envolvia nossos sentimentos. Do Templo, situado na Mansão da Harmonia, região onde se demoravam com freqüência os
diretores e educadores da Colônia, partia o convite às homenagens que, naquele momento, seria de
bom aviso prestarmos à Protetora da Legião a que pertencíamos todos — Maria de Nazaré. Pelos
recantos mais sombrios da Colônia ressoavam então doces acordes, melodias suavíssimas, entoadas pelas vigilantes. Era o momento em que a direção­geral rendia graças ao Eterno pelos
favores concedidos a quantos viviam sob o abrigo generoso daquele reduto de corrigendas, bendizendo a solicitude incansável do Bom Pastor em torno das ovelhinhas rebeldes, tuteladas da
Legião de sua Mãe amorável e piedosa. E era ainda quando ordens desciam de Mais Alto, orientando  os intensos serviços que se movimentavam sob a responsabilidade dos dedicados
servos da mesma Legião. Todavia, não éramos obrigados a orar. Fá­lo­íamos se o quiséssemos. Em Cidade Esperança, porém, jamais tivéramos conhecimento de que algum aprendiz ou interno 
recusasse agradecer ao Nazareno Mestre ou à sua Mãe boníssima, por entre lágrimas de sincera
gratidão, as mercês recebidas do seu inapreciável amparo! 
A blandícia daquela oração, cuja simplicidade só  igualava à sua própria excelsitude, despertava em nossas mentes as mais ternas recordações da existência: — revíamos, levados pelo 
império de gratas sugestões, os doces, saudosos dias da infância, os vultos carinhosos de nossas
mães —  ensinando­nos a mimosa saudação do  Arcanjo à Virgem de Nazaré, e as palavras
inolvidáveis de Gabriel, ungidas de veneração e respeito, repercutiam nas profundidades do nosso 
"eu"  tocadas do saudoso  sabor do desvelo materno que, na vida planetária, jamais soubemos
devidamente considerar. Chorávamos! E saudades mui pungentes da Família e do berço natal, do 
lar que havíamos menosprezado e enlutado, dos entes queridos e amigos que feríramos com a
deserção da vida, entornavam­se pelo nosso ser, predispondo­nos a grandes pesares sentimentais, como novas fases de remorsos dolorosos. Então orávamos, ali mesmo na quietude envolvente do 
parque ou recolhidos a local determinado, orávamos sentindo em cada dia o ósculo de benéfico 
reconforto vivificando nossas almas, tal se misericordiosos bálsamos refrescassem nossas
consciências das excessivas ardências que se haviam rasgado em nosso ser pelas garras infames do 
suicídio que nos deprimira e desgraçara à frente de nós mesmos! E, de envolta com o refrigério, eis
que se avolumava a necessidade imperiosa de nos tornarmos dignos dessa misericórdia que nos
amparava tanto ­ a necessidade dos testemunhos que a Deus provassem nosso imenso pesar por 
nos reconhecermos graves infratores de suas Magníficas Leis!

Memórias de um SuicidaOnde histórias criam vida. Descubra agora