~Trigésimo~

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— Eu não sei o que fazer – Repetiu Miguel pela milésima vez.

Após nossa breve conversa na arquibancada, eu decidira levá-lo para minha casa e deixar ele absorver aquilo tudo longe de todo mundo. A conclusão é que ele estava sentado na beirada da minha cama há horas, com as mãos na cabeça e se perguntando o que faria dali pra frente. Eu tentava consolá-lo, acariciando suas costas e dizendo que tudo ficaria bem, mas não estava certa disso; seu olhar era de decepção. Como se ele estivesse decepcionado consigo mesmo.

Aproveitando que Hugo e Pedro não estavam em casa, Miguel e eu tentamos assistir alguma coisa na TV; eu fiz café e tentei conduzir uma conversa despreocupada com ele, mas ele não prestava atenção em nada. Então resolvi levá-lo ao meu quarto e ouvir o seu desabafo.

— Eu não entendo – Eu disse, observando-o naquela pose, de cabeça baixa e com os cotovelos nas coxas. – Você fala como se fosse sua culpa ela morrer. Não foi. Só... calma.

Ele bagunçou o cabelo e olhou para mim com seus olhos tristonhos. Não era o momento para isso, mas foi inevitável perceber o quanto ele era bonito; seus olhos, nariz e boca. Seu cabelo castanho desarrumado. Seu maxilar e queixo. Era tudo tão perfeitamente simétrico que eu acabava me perdendo no meio de tanta beleza.

— Não é só isso, Lucy – Ele sussurrou. – Não estou falando apenas da morte da Júlia. Eu estou triste porque... eu te decepcionei. Eu descontei tudo o que estava sentindo em uma noite de farra, enquanto você não sabia de nada. Eu fui preso, Lucy. Você deve estar achando que eu sou um idiota.

Segurei suas mãos imediatamente, com o coração acelerado. Estava olhando fundo nos seus olhos quando comecei a falar.

— Escuta aqui, Miguel – Disse, cautelosa – Você jamais me decepcionou, de forma alguma. Desde que eu te conheci, naquele escada, o meu mundo ganhou novas cores, novos sorrisos. Você foi o motivo para eu acreditar que poderia ser feliz de novo, que eu não podia desistir. Que eu tinha que ser forte. Eu descobri que amar é como aprender a andar de bicicleta: não devemos desistir na primeira queda e...

Eu teria continuado o discurso se ele não tivesse selado nossos lábios em um beijo calmo. Eu ainda tinha muito a dizer, sobre o quanto o amava e quanto precisava dele, mas honestamente, acho que aquele beijo falava por si só. Passei os dedos entre seus cabelos, aprofundando o beijo, o que o fez sorrir.

— Eu te amo – Ele disse suavemente.

— Eu te amo – Repeti, com um sorriso bobo.

Ele foi se inclinando sobre mim, até eu estar deitada, o que me assustou inicialmente.

— O que está fazendo? – Perguntei.

— Você já vai saber – Respondeu rindo, continuando a me beijar em seguida.

· · • • • ✤ • • • · ·

O que me acordou foi a luz do sol, atravessando minhas pálpebras num brilho avermelhado. Eu estava verdadeiramente cansada, então apenas permaneci de olhos fechados, absorvendo a realidade de que teria de levantar. Quando finalmente tomei coragem de abrir os olhos, avistei Miguel ao meu lado, dormindo de costas. Eu... eu tinha mesmo... feito aquilo. Era demais para acreditar. Eu sorria tanto que minhas bochechas doíam, então apenas me levantei rapidamente e coloquei um vestido qualquer, antes que ele acordasse.

Oh, céus, como eu o amava! Não haviam palavras que pudessem expressar isso. Quem era Gustavo perto daquele ser maravilhoso? Ele nem sequer existia mais para mim. Corri até a cozinha, colocando a água do café para ferver e indo fazer qualquer coisa para passar o tempo. Eu me sentia tão feliz, que poderia sair dali saltitando. Era incrível como eu estava completamente diferente desde que Miguel entrara na minha vida. Ele não fazia ideia do quão importante era.

A campainha tocou e eu congelei. Eram Pedro e Hugo. Eles haviam passado a noite fora, então eram os únicos que poderiam ter chegado. Ajeitei o cabelo, respirei fundo e atendi a porta.

Parados do outro lado estavam duas pessoas; uma delas era meu primo. A outra, minha melhor amiga.

— Alana? – Perguntei, surpresa.

— Saia da frente, queremos entrar – Disse meu primo, que certamente era Pedro. Abri caminho para eles passarem, ainda confusa, e fiquei seguindo-os com os olhos enquanto se dirigiam à cozinha e sentavam-se à mesa.

— O quê...? – Comecei, acompanhando-os.

— O que eu estou fazendo aqui? – Completou Alana. – Bem, digamos que agora eu faço parte da família.

Senti como se meu cérebro tivesse bugado. Fiquei passeando meu olhar entre Pedro e Alana, tentando decifrar alguma coisa, mas eu realmente estava confusa.

— Como assim? – Perguntei, demorando-me a analisar Alana, que estava bem vestida e com o cabelo amarrado para trás, como se viesse de algum evento importante. – Vocês... não me diga que...

Pedro agora tinha ido fazer o café, então apenas falava sem se importar em ver a minha reação.

— Alana e eu casamos, como você queria. – Encolheu os ombros. – Somos oficialmente o casal que adotará Pietro.

Abri a boca para responder, mas fechei logo em seguida, fazendo bico.

— Não aja como se eu tivesse obrigado os dois – Resmunguei, abrindo um sorriso em seguida. – Ah, mas isso é ótimo! Não sei como poderia agradecê-los!

Deveria ter algo diferente na minha expressão, pois Alana franziu o cenho imediatamente para mim e perguntou:

— Tudo bem, Lu? – E ainda acrescentou. – Você está metida com drogas?

Eu até responderia, se Miguel não tivesse aparecido do nada, usando apenas uma bermuda e espreguiçando-se. Os olhares que recebi tanto de Alana quanto de Pedro me fizeram ruborizar e querer cavar um buraco e pular dentro. Alana arregalou os olhos, mas então começou um sorriso que ia aumentando cada vez mais, como se quisesse dar a volta completa em sua cabeça. Pedro, ao contrário, apenas ergueu as sobrancelhas e depois revirou os olhos, continuando a fazer o café.

— Oi, Miguel – Disse Alana, num tom malicioso. – Você por aqui.

Miguel agiu com tanta naturalidade que eu queria morrer.

— Ah, claro. – Ele se dirigiu a uma cadeira, sentando-se. – E então, como vai a vida?

— Sou uma senhora casada – Alana forçou uma risada, fazendo Pedro olhá-la por sobre os ombros. – Aliás, daqui a algum tempo, mãe de família também.

Miguel apanhou uma torrada do cesto que estava no centro da mesa e comeu despreocupadamente.

— Nem vem com essa história – Disse ele. – O pequeno Pietro vai ser meu filho.

— Quem disse que eu estava falando do Pietro?

Arregalei os olhos; Miguel engasgou com a torrada; Pedro quase deixou o bule cair, e praguejou baixinho. Em consequência, Alana caiu na gargalhada.

— Meu Deus! – Ela ria. – Só estou brincando!

Enquanto Alana ria, senti meu celular vibrar no bolso e pesquei-o, acendendo o visor. Meu coração quase parou quando li o nome na tela... era Aisha.

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⏰ Última atualização: Jun 21, 2017 ⏰

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Apaixonada por um idiotaOnde histórias criam vida. Descubra agora