Epílogo

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- Vir aqui acionou minhas memórias – Jemma comentou horas depois, em uma cadeira de balanço na varanda, envolvida pelos braços de Fitz, a cabeça recostada no ombro direito do engenheiro.

Cobertos por um edredom, ambos contemplavam a noite, o céu ilustrado de estrelas de um brilho intenso e uma lua imponente. Athena dormia tranquilamente no quarto do casal, de modo que eles podiam conversar melhor.

Fitz deslizava gentilmente os dedos pelas costas de Jemma em um movimento que lhe trazia paz, conforto e segurança.

- Se eu soubesse disso, teria lhe trazido aqui antes.

Ela sorriu e virou o rosto na direção dele a fim de capturar os lábios de Fitz nos seus em um beijo breve, porém afetuoso.

- Tudo isso me fez chegar a uma conclusão.

- E qual seria? – ele perguntou genuinamente curioso.

- Que não importa o que aconteça com nós dois... Sempre encontramos um jeito de voltar um para o outro. Sempre acabamos juntos.

Ela sentiu Fitz abraçá-la com ainda mais força.

- Você está certa. Já fomos testados tantas vezes... Não há um meio de nos separar definitivamente.

- E sempre que algo acontece para tentar nos separar...

- O universo – ele a interrompeu, de súbito.

- O cosmos, o que quer que seja – ela revirou um pouco os olhos – não importa. Eu sempre acabo me apaixonando por você. Novamente.

- E eu por você.

Nem o espaço, nem outras realidades, nem mesmo o esquecimento, a ausência de memória era capaz de superar o que um sentia pelo outro. Eles tinham a certeza, agora maior do que nunca, de que não importava o que acontecesse, que provações surgissem em seus caminhos, sempre encontrariam o caminho de regressar aos braços um do outro. De voltar ao lar.

"Hoje, quando acordei, você ainda dormia. Aos poucos, acordando, senti sua respiração leve. Através dos cabelos que escondiam seu rosto, vi seus olhos fechados e senti uma comoção subindo à garganta. Tive vontade de gritar e acordá-la, pois seu cansaço era profundo e mortal. Na penumbra, a pele dos seus braços e pescoço estava viva e eu a sentia morna e seca. Queria passar os lábios nela, mas o pensamento de perturbar seu sono e ainda tê-la em meus braços me impedia. Preferia tê-la assim como algo que ninguém tiraria de mim, pois só eu a possuía. Uma imagem sua para sempre. Além do seu rosto, via algo mais puro e profundo onde eu me refletia. E via você numa dimensão que englobava todo o tempo da minha vida, todos os anos futuros e os que vivi antes de conhecê-la, mas já pronto para encontra-la. Este era o pequeno milagre de um despertar. Senti pela primeira vez que você me pertencia não só naquele momento, e que a noite era eterna ao seu lado. No calor do seu sangue, dos seus pensamentos e da sua vontade, que se confundia com a minha. Por um momento entendi o quanto te amava e foi uma sensação tão intensa que meus olhos se encheram de lágrimas. Eu pensava que isso jamais deveria terminar. Que toda nossa vida deveria ser como esse despertar. Senti-la não minha, mas uma parte de mim. Uma coisa que respira comigo e que nada pode destruir, a não ser a indiferença de um hábito que considero a única ameaça. Então você acordou, e, sorrindo, ainda adormecida, me beijou, e eu senti que não havia nada a temer. Que seríamos sempre, como aquele momento, unidos por algo que é mais forte que o tempo e o hábito".*


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* A carta não é de minha autoria (infelizmente). Foi retirada do filme "A Noite" de Michelangelo Antonioni, mas consigo imaginar perfeitamente cada palavra sendo escrita pelo Fitz para Jemma. 

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