Capítulo 2

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Eugênio acordou sobressaltado. Por alguns instantes, pensou que tudo não passara de um pesadelo. Elisa deveria estar na cozinha, como todas as manhãs, as crianças preparando-se para o café. Ele tomaria seu banho como sempre fizera e iria para o trabalho. Apanhou o relógio sobre a mesa de cabeceira. Nove horas. Passou os olhos em volta. Sobre a cômoda, viu os papéis dobrados. Sentiu um aperto no coração. Fora mesmo verdade. Ali estavam o atestado de óbito, os documentos do cemitério.

Aflito, passou a mão pelos cabelos em desespero. O que fazer agora? Olivia era a única família de Elisa, cujos pais haviam morrido há tempos. Lembrou-se de sua mãe. Precisava de alguém para cuidar das crianças. Olivia recusava-se a fazê-lo. Tinha de trabalhar e alguém teria de tomar conta delas. Por causa dos acontecimentos, conseguira uma semana de licença na firma, mas nunca cuidara de crianças e não tinha a menor ideia de como fazer isso.

Talvez Olivia concordasse em ajudá-lo. pelo menos nos primeiros dias, até que conseguisse uma solução. Pretendia falar com Eunice e pedir-lhe que ajudasse a cuidar delas. Afinal, ele queria viver com ela e juntos poderiam ser felizes. Agora estava livre até para casar de novo.

Não. Casar de novo, não. E se Eunice mudasse como Elisa? As mulheres adoram o papel de boa esposa. Mas como lhe pedir para assumir seus filhos sem dar nada em troca?

Mesmo que Eunice concordasse, ele precisava deixar o tempo passar. As crianças estavam muito ressentidas com ele. A culpa era de Olivia, que o colocara no papel de vilão. Era fácil julgar os outros. Ele sabia que nunca desejara nenhum mal a Elisa. Jamais poderia supor que as coisas acontecessem daquela forma. 

Suspirou angustiado. De qualquer maneira, seus filhos não aceitariam a presença de Eunice depois do que acontecera. Era preciso dar algum tempo. Eles esquecerem e, então, tudo seria mais fácil.

O difícil era resolver a questão do presente. Temia que sua mãe não aceitasse tomar conta da casa e das crianças por algum tempo, o suficiente para ele resolver tudo. Ela residia no interior de Minas Gerais e era muito metódica. Nunca deixava seu pai sozinho por nada do mundo. Nem ao enterro viera. Apenas suas duas irmãs haviam comparecido na ocasião. Eugênio dava-se muito bem com a família. Possuía bom relacionamento com as irmãs e os cunhados. Mas sabia que não podia contar com elas para o que queria, porque eles tinham filhos. Suas irmãs tinham suas próprias obrigações, não podiam tomar conta de sua casa.

chocado com o que acontecera e pelo fato de o corpo de Elisa haver sido colocado em lugar refrigerado em meio aos indigentes, ele apressara o velório e o sepultamento. Não queria prolongar a espera para que suas irmãs pudessem vir. Melhor assim. Elas não haviam convivido muito com Elisa. Gostavam dela, admiravam-na por ser uma ótima esposa e mãe, nada mais.

Agora, arrependia-se um pouco disso. Odete ou Diva talvez lhe dessem alguma sugestão. Olivia era intratável. Não podia esperar nada dela, a não ser recriminações e rancor.

E se ela já tivesse ido embora? Apesar de tudo, sentia-se mais seguro com ela por perto. Tratar de crianças era coisa de mulher. Não sabia como proceder.

Apressado, levantou-se e abriu a porta do quarto. Escutou a voz de Olivia na cozinha e respirou aliviado. Tentou encorajar-se. Reagiu. Era uma bobagem. Afinal o mundo não se acabara. Decidiu agir. Tomou banho, fez a barba, vestiu-se e desceu.

A mesa estava posta e as crianças já haviam tomado café. As xícaras usadas ainda estavam sobre a mesa. Eugênio notou que não havia uma xícara para ele. Ficou esperando, parado na porta da cozinha.

Olivia falava com as crianças tentando confortá-las e ajudá-las a enfrentar a nova situação.

- Eu não quero que mamãe vá embora para sempre - queixava-se Nelinha. - A avó de Márcia morreu e nunca mais voltou. A mãe dela disse que morrer é para sempre, a gente nunca mais vê a pessoa.

A verdade de cada um - Zibia GasparettoOnde histórias criam vida. Descubra agora