O Encrenqueiro

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Era tarde da noite de quinta, eu tava assistindo o D-Noite com Daniel Gentil no meu quarto. O dia tinha sido horrível e estressante, prova de matemática e química, trabalho de biologia e preparação pro ENEM. Depois disso tudo eu tava precisando mesmo dar umas risadas.
E olha , parece que o presidente Tender autorizou que todos os criminosos mutantes sejam levados a uma prisão no Amazonas. Bom, pelo o que parece ele quer ser o único bandido mutante a aparecer na mídia;— Fala o apresentador enquanto eu dou risada. Foi quando bateram na porta, era o meu irmão, que estava usando seu traje de Trovão.
— Mano não acredito que cê não tá pronto;— Ele reclama.
— Pronto pra que Toni?
— Pra nossa ronda da madrugada, dãã. Vai dizer que esqueceu?
— Na verdade sim. E desde quando cê resolveu levar essa coisa de super-herói mais a sério?;— Eu pergunto achando estranho meu irmão querendo fazer algo altruísta.
— Desde que vi que nós estamos tendo cada vez menos destaque no jornais;— Ele responde. Tava demorando.
— Lá vamos nós de novo;— Eu respondo cansado.
— Mas é sério, a nossa região não tem nem tantos crimes comparando com outros lugares do Brasil, mas mesmo assim a gente pisca e já surge um mutante tentando ser herói. Uma hora é uma garota com poderes de gelo e fogo, outra, um negão com asas voando por aí, sem contar aquele pessoal de Guará. É muito cacique pra quase nenhum índio;— Ele fala como se eu nunca tivesse ouvido essa ladainha dele antes;— Foi por isso também que eu fiz um fã-clube pra gente no Face.
— Comé? Volta a fita. Cê criou um fã-clube pra gente?
— Sim, temos uns cinquenta seguido-...
— Cê é idiota ou o que? Agora podem descobrir o dono da conta e chegar até você;— Eu falo tentando me controlar pra não gritar e acordar nossos pais.
— Relaxa fiz uma conta falsa, ninguém vai desconfiar, além de que os caras ainda não resolveram autorizar a caça aos mutantes;— Toni fala tranquilo;— O fã-clube vai nos ajudar a melhorar nossa reputação.
— Se você não fosse tão cabeça dura, a gente poderia ter feito uma parceria com aquele pessoal de Guará. Garanto que teríamos o destaque que cê quer;— Eu falo enquanto ele faz uma careta.
— Nem vem, já falamos disso mais de uma vez. Eu não quero ficar numa equipe, ainda mais se aquele baixinho azulão estiver nela. Agora vamo logo, quem sabe não encontramos um mutante dando uma de loco por aí;— Ele responde saindo do quarto. Eu perguntaria que mutante em sã consciência tentaria chamar atenção de madrugada, mas como eu tava cansado demais, fico quieto, desligo a TV e coloco meu traje.
A gente tava no mesmo telhado de sempre, observando a cidade, praticamente vazia, com exceção de um carro ali, um motociclista aqui, nada demais. Eu já tava pronto pra ir embora e deixar Toni sozinho, quando rolou uma explosão à alguns quilômetros dali. Não era uma explosão grande, mas mesmo assim não dava pra não notar.
— Viu, eu disse que teria alguma coisa pra fazê;— Fala Trovão se animando.
— Tá, tá vamo logo;— Eu falo e fomos pro local da explosão, e como a gente não tinha mais corrente, o Trovão teve que me levar nas costas. Eu não quero mais falar sobre isso.
Chegamos no local e vimos um carro-forte com a parte traseira parcialmente destruída. Em volta dela tinha quatro caras fardados cercados por uns nove caras de máscara. Não precisava ser nenhum Sherlock Holmes pra sacar o que tava acontecendo.
— Eu cuido dos da direita e você os da esquer-...;— Eu falo pra Trovão, mas quando eu vi, ele já tava prendendo todos em um poste. Depois tira uma foto dos caras presos.
— Essa vai pro grupo;— Ele fala rindo.
— Obrigado pela ajuda;— Diz um dos caras fardados.
— Não há de que;— Trovão fala tirando foto dos caras e do carro-forte. Depois disso voltamos pro telhado. Eu fico olhando irritado pra Toni, aquilo tinha sido a gota d’água. Então ele olha pra mim e diz:
— Que foi, perdeu alguma coisa?
— Quer saber cara, cansei, cansei, pra mim chega;— Eu respondo;— Tô cansado de você ficar bancando o meu chefe, fazendo o que quiser sem nem perguntar minha opinião.
— Que?
— É isso mesmo. Eu sempre soube que cê é um egocêntrico mas isso já foi longe demais. Nós somos uma dupla, mais do que isso, nós somos irmãos, a gente deveria ajudar um ao outro. Deveríamos ser parceiros de verdade.
— E o que nóis tamo fazendo?;— Ele pergunta aumentando o tom de voz.
— Até agora te ajudei em tudo que podia, sempre, mas quantas vezes cê me ajudou? Nenhuma. O que custa pedir e respeitar a minha opinião de vez em quando? O que custa me ajudar às vezes e agir como meu parceiro?;— Eu digo com raiva.
— Mentira, eu já pedi sua opinião e te ajudei várias vezes, tipo quando... aquela... vez que...;— Ele fala tentando se lembrar de alguma coisa;— Quer saber, Foda-se!!;— Ele grita.
— Foda-se você;— Eu grito ainda mais alto.
— Cê quer sair da dupla, tudo bem, pelo menos eu não vou ficar com um peso nas costas me atrasando, não vou ter ninguém cortando o meu barato ou enchendo o meu saco porque não concorda com as coisas que eu faço pelo bem da dupla;— Ele grita ainda mais alto.
— pelo bem da dupla? Sei. Cê só faz o que é pro teu próprio bem, eu não sei como cê não resolveu virar um daqueles vilões que querem dominar o mundo. Sinceramente, pra ter um irmão desse jeito eu preferiria ser filho único;— Eu grito com toda a força que eu tinha.
— Quer saber, eu também;— Ele fala, mostra os dois dedos do meio e sai correndo, me deixando sozinho no telhado.
Olho no relógio, eram 05:50h da manhã, eu não tinha conseguido dormir direito, na verdade eu nem dormi. Me levanto da cama, coloco o meu uniforme da escola e arrumo minha mochila, depois vou pra cozinha e me sento numa ponta da mesa, meu irmão tava na outra. Nossos pais ficam nos olhando.
— Tá tudo bem gente?;— Minha mãe pergunta quebrando o silêncio.
— Sim;— Nós respondemos sérios.
— Não, não tá. Muito bem os dois, contem logo o que tá acontecendo;— Meu pai fala.
— Nada demais, só que o ego de certas pessoas tá me deixando com muita dificuldade de respirar;— Eu respondo com raiva.
— Pelo menos eu não fico reclamando de tudo que alguém faz só porque essa pessoa não me contou;— Meu irmão reclama se levantando da cadeira e pondo às mãos na mesa. Nossos pais nos pedem calma, mas nem demos bola.
— Eu só quero que você entenda que somos uma dupla, que você não é o meu chefe;— Eu falo também me levantando da cadeira. Meu irmão ia dizer alguma coisa, mas nossa mãe o impede gritando:
Agora chega!!!
Meu irmão faz uma careta, pega sua mochila e sai correndo, saindo de casa. Depois disso sou obrigado a explicar tudo o que tinha acontecido na noite passada, então depois de um longo e cansativo sermão, eu vou pra escola.

Guerreiros Vol.01Onde histórias criam vida. Descubra agora