No caminho de casa sentada no banco do ônibus eu pensava em toda está história, pesava nas possibilidades e caminhos que a minha conversa com a Helô poderia nos levar. É isso não saía da minha cabeça, como também não havia outra maneira de resolver tudo isso a não ser dizendo a verdade. Passei a elaborar falas comigo mesma, na tentativa de ser claramente compreendida diante de tudo que eu tinha a dizer. Se você pudesse ver a cena cairia no riso.
Em casa no meu quarto as paredes as quais eu conhecia cada relevo pareciam pulsar diante dos meus olhos, palavras surgiam diante de mim e eu pensava em quais poderiam usar? Rolei na cama de um lado para o outro durante toda a noite. Fui tomada por um misto de ansiedade e medo que me assombravam. Como era difícil tentar explicar e ao mesmo tempo se desnudar diante de alguém que não se conhece, não tenho liberdade e nem intimidade para falar da minha vida privada à Heloisa.
Tenho certeza que não seriei julgada pela Helô, ela me parece ser uma pessoa justa, tão pouco preconceituosa, mas não tenho como ter certeza do preço das cobranças que podem recair sobre ela ao me desnudar. São somente as minhas impressões pois, nunca falamos sobre isso. Não sei seu posicionamento e pensamento a cerca destas questões. Saberei após contar-lhes sobre mim e qual a consequência disso?
Minha angustia resume-se em como meu irmão irá encarar o fato de todos saberem sobre as minhas preferência sexuais. Dilemas de uma irmã que não quer expor seu irmão também ao crivo do julgamento ou chacota das pessoas. Por outro lado, não me vejo perguntando à ele se devo ou não me expor? Como é maluco isso, porque tenho que passar por isso? Melhor eu desligar, pois não chego a lugar algum!
Eu buscava agir naturalmente e percebi que as pessoas continuavam sem saber de nada. Tudo permanecia em perfeita harmonia em nosso Pequeno mundo. Ensaiava em pensamento como iria começar a conversa, fazendo-me perguntas e pensando nas respostas que poderiam surgir de ambas as partes.
Perto das nove horas meus raios de gente passam por mim correndo na secretaria, isso significava que a Helô havia chegado. Sem pensar duas vezes corri para o banheiro e lá permaneci, acho que eu não estava pronta para encará-la. Não demorou muito e alguém estava batendo na porta do banheiro e uma voz doce e calma do outro lado me dizia:
- Bom dia, o café está pronto. Te espero na cozinha, trouxe pão quentinho, não demora.
Eu estava sentada no chão atrás daquela porta, agarrada em minhas pernas tentando arranjar coragem para sair e encarar de frente o que tinha que encarar. Coloquei-me de pé, me olhei no espelho, respirei fundo e disse a mim mesma, me olhando dentro dos olhos:
- Coragem moça, coragem você é igual todo mundo, você não fez nada de errado!
Segurei firme na maçaneta da porta e saí, caminhei até a cozinha e lá estava ela, sentada com uma xícara de café nas mãos a me olhar. Inicialmente ficamos as duas em silêncio, eu me sentia nua diante dela e não sei bem o porquê aquilo acontecia, ela me olhava com aqueles olhos que me deixavam nua e não sei explicar. Aos poucos a sensação de inquietude foi me tomando e não consegui comer, tomei um gole de café e fui logo dizendo:
- Helô, vamos conversar?
- Calma Fernanda, será que podemos tomar café antes, não gosto de conversar de barriga vazia. Está tudo bem! Acalme-se.
Eu não aguentava mais aquela espera e parecia que a Helô estava se divertindo com a minha angústia. Sem mais nem menos eu a deixei tomando o seu café e fui para a secretaria. Por mais que eu gostaria de conversar o mais rápido possível, essa conversa só aconteceria no tempo dela, então não me restava mais nada a não ser esperar.
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Vidas pra Contar
RomanceDilemas, sentimento, escolhas e consequências. Um marido capaz de tudo para manter a sua família. Heloísa e Fernanda duas mulheres fortes e empoderas, porém cheias de traumas e perdas, terão coragem de romper com os padrões e viver este amor. Vidas...