Eu nunca mais tinha ido a uma festa na casa da Luíza. Lembrava-me que a casa era grande. Mesmo assim, me espantei com a quantidade de gente que cabia lá dentro. Sério, tinha muita gente. Eu olhava por cima dos ombros dos outros e só conseguia enxergar blusas iguais. Malditas lojas de departamento.Depois de andar até o final da casa, atravessar o quintal, perguntar "você viu a Luíza?" para umas três pessoas, achei-a. Ela estava agarrada a uma menina com rosto familiar, que não conseguia lembrar o nome. Eu conhecia muita gente, mas passei tanto tempo fora de órbita que me esqueci das pessoas. E acho que elas acabaram esquecendo de mim também."Nicou! Caralho, quanto tempo!". "É, porra, muito tempo". Ela me olhou com os olhos brilhando de interesse, mas com uma expressão de 'depois a gente se fala'. Saquei. "Vou pegar uma bebida", e fui embora. Não da festa, mas do quintal.Luíza adorava fazer essas sociais. Era um ótimo jeito de gastar dinheiro e continuar sendo o centro das atenções. E de pegar algumas garotas bonitas que viviam cercando ela. Lucas também adorava as sociais da Luíza. Foi numa dessas que a gente se conheceu.Talvez eu só estivesse lá para me convencer de que eu conseguia olhar o canto onde ele me beijou pela primeira vez e não desejar a retórica. Mas eu não conseguia. Fechei os olhos e quase pude ouvir de novo o barulho dos lábios dele repuxando os meus. Abro-os e vejo a quase cinco metros, um rosto familiar. "Droga. Ele. Veio".Tentei disfarçar. Não consegui. Travei. Tudo parou. Pedi socorro interno. Aviso: perigo. Pisca alerta cerebral. Tentei catar meus cacos que se espalhavam por cada metro quadrado. "Calma". "É só a droga do amor da sua vida do outro lado da mesa de bebidas".Socorro. Socorro."O que é isso, Nicolas? Que desespero idiota é esse? Controle-se".Pensei em ir embora de vez. Ele ainda não tinha me visto. Mas alguém deve ter falado alguma coisa.Ele olhou pro copo e depois, como se soubesse exatamente onde eu estava, fixou os olhos em mim. Tarde demais. Sem saída. Choque instantâneo.Ele estava mais bonito do que eu lembrava. Alto, mais do que eu. Mudara o corte do cabelo dourado. A pele mais bronzeada. Bem mais. Os olhos continuavam iguais. Serenos, cor-de-mel. Mas me olhavam de outro jeito. Não era amor. Não o que eu enxergava ao acordar do seu lado. Era saudade. Parecia não me conhecer mais. Mas mesmo assim, queria voltar. Me reconhecer. Isso doeu. Foi um tiro. Dois. "Preciso parar de me martirizar". Eu sabia que ele e Luíza eram muito amigos, provavelmente ele estaria lá. Erros. Estou cercado deles. Foi um eu ter me arriscado a ir. Acho que tinha me acostumado a pegar o caminho errado. Desastre.Ele saiu da rodinha de amigos – lembrava-me do nome de 2/5 – e foi falar comigo.

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AMNÉSIA
RomansEm um mundo onde os ponteiros do coração se partiram no término de seu romance com Lucas, Nicolas vagueia à beira do colapso emocional. Três anos de autodescoberta se estendem diante dele, uma jornada para costurar as lacunas abertas por essa doloro...