Ele me deixou ir

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Espero impacientemente o dia amanhecer e, quando o sol finalmente aparece, por mais iluminado que ele seja, meu dia continua completamente sem brilho.
Queria me despedir das pessoas que conheci aqui mas, se eu fizer isso, sei que não conseguirei partir.
Rosalinda ainda dorme em seu quarto. Com certeza, não irei acorda-la, afinal o que eu poderia dizer?
E Theo? Apenas pensar nele, doe tanto que me tira o ar.
Tenho que parar de pensar! Tenho que ir! Tenho que voltar para a família que eu abandonei na tentativa de ajudá-los mas, enquanto eles estiverem lá, nada adiantará.
Parece que eu me tornei uma profissional em abandonar as pessoas. Isso não é algo de que me orgulho.
Pego minhas economias que restaram e guardo-as na mochila. Noto que minhas mãos estão trêmulas. Será que uma passagem aérea para Belta custa caro? Concluo que não, afinal ninguém quer ir para lá.
Desço as escadas, abro a porta e saio. Não olho para trás. Mas, num lapso de loucura, decido que há um lugar que eu gostaria de ver pela última vez: a nossa casa. Ou o que poderia ter sido a minha casa e de Theo.
Pego um táxi, que me deixa exatamente em frente a casa. Hesito em descer e tenho certeza que até o motorista apercebe-se disso.
Entro na casa. Tento proibir minha mente de pensar no quanto ela é linda e no quanto eu seria feliz nela. Subo até o que seria nosso quarto e passo a mão pela cama, notando assim, algo que está em minhas mãos porém, não deveria estar mais.
Lentamente, deslizo meu anel de noivado para fora do meu dedo e deixo-o em cima da cama. Sussurro: "Me perdoe meu amor".

-Não acha que eu mereço ao menos uma explicação?

Assustada, viro-me rapidamente e me deparo com Theo parado a poucos passos atrás de mim. Ouvir sua voz, dispara meu coração e eu não consigo dizer nada. Ele me olha, um olhar que revela suas desconfianças sobre o que estou fazendo.
Eu não respondo e não digo uma palavra. Ele merece uma explicação mas, eu não mereço me explicar. Assim, deixo-o falar:

-Você não vai me dizer o que significa isso? Por favor, me diz que não é o que eu estou pensando.

Permaneço em silêncio e o meu silêncio por si só responde à pergunta de Theo. Ele passa as mãos pela testa e por seu cabelo, bagunçando-o, se aproxima de mim e diz:

-Eu não entendo porque decidiu ir e nem ao menos me avisou! Você nem quis me dar a chance de te fazer mudar de ideia! Falta apenas um dia para o nosso casamento. O que você estava pensando? Simplesmente sumir e me deixar aqui igual um louco procurando por você?!

Ele para por um instante e anda alguns passos para longe de mim, em seguida, começa a falar novamente:

-Se eu não tivesse ido até a sua casa, se não tivesse ligado e ninguém tivesse atendido, você iria embora e eu nem saberia.

Em desespero, digo:

-Não, Theo! Você não foi para minha casa! Aquela casa não é minha! Nada aqui é meu!

Theo, num tom de voz decepcionado, responde:

-Essa casa em que você está agora é sua! Você está tão focada nas coisas ruins que te aconteceram que não consegue enxergar as coisas boas bem na sua frente. Por favor, ir embora é loucura! Voltar para o meio da guerra não vai ajudar sua família! Por favor, fique comigo e nós dois vamos dar um jeito nessa situação juntos.

Uma lágrima desce pelo meu rosto e sei que se eu continuar aqui por mais um segundo, mudarei de ideia.
Me aproximo de Theo e o abraço fortemente. Tento conter as lágrimas e digo:

-Você é a melhor pessoa que conheci em toda a minha vida, não só porque eu me apaixonei por você mas por quem você é. Você merece mais do que eu posso te oferecer!

Ele diz, numa voz trêmula:

-Não diz isso, por favor, você é tudo que eu preciso.

Tento fazê-lo entender:

-Theo, me perdoe mas, minha família precisa de mim.

Nesse momento, Theo se afasta do meu abraço e diz:

-Eu amo você mas, se você precisa tanto ir embora e não confia que nós dois podemos resolver essa situação se estivermos juntos, talvez você deva mesmo ir.

Ao ouvir isso, sinto como se uma das bombas que eu ouvia explodir em Belta tivesse explodido no meu coração.
Eu achei que seria muito pior ir embora vendo Theo me pedir para ficar mas, doeu milhões de vezes mais ter que ir embora vendo ele me deixar partir.

Permanecer ou partirOnde histórias criam vida. Descubra agora