Capítulo 61

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  Eu tentei ser forte. Juro que tentei. Mas não aguentei por muito tempo.
  Entrei no meu quarto e caí no chão, chorando silenciosamente, sentindo meu coração destroçado.
  Eu não sabia que doía tanto. Mas eu sentia, bem no fundo do meu coração, eu sabia que o que eu tava vivendo era bom de mais para ser verdade. Todas aquelas vezes em que eu senti medo, eu me obrigava a esquecer, a não pensar que eu poderia sofrer tanto.
  A dor que eu estou sentindo é tão profunda, que não posso nem exteriorizar.
  Pensei que eu poderia ser feliz. Sinceramente eu pensei que esse casamento poderia dar certo. Me iludi ao ponto de pensar que Ian pudesse sentir algo por mim, nem que fosse apenas amizade.
  Me enganei. Me enganei ao ponto de estar aqui, nessa condição deplorável, chorando e sofrendo por alguém que não tem nem respeito por mim.
  Desde criança eu sonhava com o amor. Sonhava com o homem perfeito, aquele das histórias em que vinham em um cavalo branco, que beijaria minha mão e me faria juras de amor eterno. Sonhava com um casamento perfeito, onde o amor seria a base da nossa família, e iríamos educar nossos filhos para serem cavalheiros apaixonados e damas apaixonantes. Sonhava em ficarmos bem velhinhos, com cabelos grisalhos, sentados na varanda cheios de netos ao nosso redor, eu tricotando meias para eles enquanto meu marido contava a eles a história de como nos conhecemos. Sonhava em morrermos juntos, para que nehum pudesse sofrer a ausência do outro.
  Eu era uma criança tola!
  Me deitei no chão e deixei minhas lágrimas molhar o tapete.
  Quando descobri que estava noiva, me senti totalmente perdida, desiludida e enganada. Como posso ter crescido com aquela ideia mágica que era o amor se a realidade é muito diferente?
  Desde o primeiro instante em que vi Ian, eu soube que não seria um conto de fadas. Por mais que sua beleza fosse estonteante, ele era irritante, mau humorado e rude. Não chegava nem perto de um cavalheiro das histórias que eu lia. Eu o detestei na mesma hora, e naquele dia tive a plena certeza de que eu nunca seria feliz. Casamentos arranjados tendem a não ter um final feliz. Conheci muitas mulheres na alta sociedade que eram infelizes em seus casamentos. Elas eram mais frias que as outras, mais reservadas e confidenciavam umas as outras que eram traídas por seus maridos, trocadas por mulheres mais jovens e deixadas para cuidar da casa e dos filhos. Crescer ouvindo essas histórias, me fez ter certeza de que eu nunca poderia ser feliz em um casamento arranjado. Eu sempre quis mais que apenas cuidar da família enquanto meu marido sai para beber com os amigos e conhecer novas mulheres.
  Com o tempo, fui conhecendo Ian melhor, nos aproximamos e eu descobri nele uma paixão avassaladora que jamais pensei que pudesse sentir. Pensei que pudesse dar certo, pois Ian era diferente. Ele era gentil, inteligente, amável e bondoso. Pensei que Ian fosse diferente daqueles homens. Me vi completamente enganada outra vez.
  Posso não saber muito sobre o amor, mas sei que ninguém que tenha o mínimo de respeito ao seu noivo ou noiva, por mais que não o ame, esse nunca se deitaria com a própria cunhada. Cunhada cujo é inimiga da noiva. E tudo isso por que? Por causa de um beijo que ele nem me deixou explicar? Por causa de uma vingança? Ian quis atingir eu e Dorian usando Pietra?
  Garanto que a única ferida nessa história sou eu. Porque o amor que eu achava que sentia, não existe. O amor é uma terrível ilusão. Ilusão essa que destruiu meu coração. O amor é uma palavra bonita que serve apenas para iludir e nomear um jogo de interesses, como eu sempre soube que era e ignorei. O casamento por amor não existe, é apenas uma moeda de troca, um jeito mais eficaz de fazer negócios. Como se os sentimentos das pessoas não importassem.
  E no fundo não importam mesmo.
  Eu sabia o que tinha que fazer.
  Levantei e sequei minhas lágrimas. Desci as escadas de dois em dois degraus e quase caí no último, mas cheguei a mesa e ainda estavam todos lá.
  Parecia um velório. Dorian estava de cabeça baixa, provavelmente bêbado e arrependido. Ian estava em silêncio mexendo na comida sem vontade. Pietra estava com a cara amarrada como de costume, mas esta também estava de cabeça baixa e parecia pensativa. Virgínia comia tranquilamente sem saber o que se passava com seus filhos, e Ferdinando pareceu desconfiado com tanto silêncio.
  Quando fui vista, Ian se levantou imediatamente. Eu o ignorei e fui até a ponta da mesa, onde fiquei frente a frente com o meu detestável ex sogro.
  Ele não pôde se conter e logo foi falando:
-está atrasada! Sabe que odeio atrasos!
-isso não vai mais acontecer!- falei determinada.
- Espero que não! -disse ele voltando a comer.
- Peço a atenção de todos!-falei séria.
- Mas o que é agora ?-perguntou o Senhor Seymour irritado.
- deixe ela falar querido, parece ser importante! -disse Virgínia.
  Logo, todos os olhares estavam pousados em mim. Me recusei a encarar Ian ou Pietra.
- Ande logo menina. Não tenho o dia todo.- disse o Senhor Seymour.
- não vou tomar muito do seu tempo. Só vim comunicar que estou voltando para minha casa. O casamento não irá mais acontecer! -falei determinada.
  Apesar de toda coragem que eu reuni, minhas mãos estavam trêmulas e senti que poderia desmaiar a qualquer momento.
  Ian olhou para mim com uma pergunta silenciosa no olhar, mas eu o ignorei. Os demais apresentaram expressões semelhantes de surpresa e confusão.
- e desde quando você tomou essa decisão? Pelo que eu sei, quem decide isso sou eu e seu pai. Não você. Por um acaso sabe o que está falando? Ou só quer chamar atenção?
- estou certa disso. Exijo ser devolvida imediatamente! -falei decidida.
- você enlouqueceu garota? Está tentando me irritar?-perguntou ele furioso.
- longe disso Senhor. Quero apenas ser respeitada, e  acho que o mínimo a ser feito agora é que o senhor me devolva.
- Helena... - começou Ian.
  Levantei a mão em um claro sinal para ele ficar quieto.
- não estou entendendo nada. Helena, explique o por que tomou essa decisão. O que está acontecendo? -perguntou Virgínia nervosa.
- Vou explicar de maneira bem simples para que todos entendam. Não vou me casar com Ian, ele desonrou Pietra. - falei sem sentir pena de ninguém, afinal eles não pensaram em mim.
   O silêncio que se fez em seguida foi terrível, as expressões de todos variavam entre confusão, decepção, fúria e desgosto.
- COMO É QUE É? - gritou Dorian se levantando da cadeira com tamanha rapidez que  a derrubou.
- sente-se Dorian! -ordenou o Senhor Seymour.
- é verdade meu filho? -perguntou Virgínia com as mãos na boca.
  Ian soltou os talheres com violência no prato, fazendo um barulho terrível.
  Pietra estava chorando silenciosamente enquanto eu continuava de pé, esperando e resistindo.
- sim!-disse Ian cansado.- Eu... Eu acho que sim!
-VOCÊ ACHA?-gritou Dorian socando a mesa.
- EU NÃO ME LEMBRO!-gritou Ian.
- Calados, os dois! -ordenou o Senhor Seymour.
- estou indo arrumar minhas coisas! -comuniquei.
- não será necessário. Você não vai!-disse ele determinado.
- Como é? -perguntei incrédula.
- se foi só uma noite e Ian estava bêbado, não tem porque desfazer o arranjo.
- não. Não vou me casar com ele!-falei irritada apontando para Ian.
-você não tem querer Helena. Você vai casar querendo ou não. Você é apenas uma garota fútil e não sabe o que é melhor pra você.
- e é você quem sabe o que é melhor pra mim?-perguntei petulante.
- obviamente! -disse ele sorrindo.
- Ian não é o melhor para mim!-falei furiosa.
- não quero saber. Você vai casar e ponto.
- sabe como estou me sentindo agora? Humilhada. Isso não pode ficar assim!
- uma hora você esquece! Não vai ser a primeira vez que Ian fará isso. Acostume-se.
- NUNCA! -gritei batendo na mesa.
  As lágrimas já estavam escorrendo sem que eu tivesse controle.
- Calada. Você não tem escolha Helena. Ou casa ou casa.- disse ele furioso.
- isso é uma ameaça? -perguntei com toda fúria contida.
- Tome como quiser!-disse ele.
- nunca me casarei por livre e espontânea vontade. - falei enojada.
- Como eu disse, você não tem querer! Vai casar e cumprir seu dever como esposa...-disse ele encerrando o assunto.
- Pietra, vá para a biblioteca. Teremos uma conversa muito séria! - disse Virgínia com a voz fria e distante.
- AGORA JÁ CHEGA! COMO TEVE CORAGEM? - perguntou Dorian furioso.
- Dorian, eu...
  Ian não teve tempo de completar a frase. Dorian deu um soco em seu maxilar, o soco foi tão forte que Ian caiu da cadeira.
  Senti um pouco de pena dele, mas no fim das contas, eu bem que queria acertar a cara de Ian. Fico contente por Dorian ter me poupado esse esforço.
- Chega Dorian! - disse o Senhor Seymour rindo.
- vai se arrepender de ter ferido os sentimentos de Helena!-ameaçou Dorian apontando para Ian que ainda estava no chão.
- Helena? Mas e Pietra? -perguntou o Senhor Seymour achando graça da situação.
- dane-se Pietra. Ela é uma cobra venenosa mesmo!-disse Dorian dando de ombros.
  As palavras começaram a ficar distantes. Estou tão furiosa e tão triste, que meu corpo está fraco e minha mente confusa. Comecei a ver embaçado e ouvir tudo muito distante.
   Desmaiei antes mesmo de chegar ao chão.

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