Capítulo 18 - Andryl

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Pela quinta vez eu estava acordando nesta madrugada. Droga de insônia.
Tateio no escuro, a procura do meu celular. 04h27min. Hoje tenho o dia de folga, não tenho motivos para levantar cedo.
Repouso a cabeça no travesseiro, fecho os meus olhos e tento não me odiar.
Foi em vão, pois a culpa me atinge em cheio novamente. O que fiz?!
Droga, não vou conseguir descansar, mesmo assim me viro para o outro lado e tento cair no sono, um sono profundo e confortável, um sono que eu só teria quando a Sophie estivesse ao meu lado.
***
- Acorda Andy, a Sophie chegou.
- O que? Ela está viajando Wendel, não irá vir. - digo meio sonolento.
- Sério? Então a não ser que a Sophie tenha uma irmã gêmea, te garanto que ela esta aqui.
- É impossível ela estar aqui cara, não enche.
- Quer apostar? Juro pra você que é ela lá embaixo! - ele pausa e eu sou obrigado a olhar em seus olhos para ter certeza de que era verídico o que ele dizia. - E por que você acha tão impossível ela estar aqui? Esse show está marcado há séculos, ela foi a primeira a confirmar presença.
- É complicado, nós meio que brigamos. Ela não vai nem chegar perto de mim.
- Eu já vi ela te perdoar por coisas absurdas! Desta vez não vai ser diferente. - Wendel deixa o quarto ao mesmo tempo em que eu pulo da cama. Não podia perder a chance de falar com ela.

Saio à procura daquele rosto tão peculiar, calmo e sereno, que se mostrara o melhor remédio para eu me curar de mim mesmo.
A vejo no meio de uma rodinha com estudantes universitários. Ela estava de costas para mim, então eu teria que ir até eles. Não gostava muito de interagir com grupos de fãs, mas teria que fazer isso, caso contrário, ela não me deixaria se aproximar nem um metro de distância dela.
Não demorou muito para algum deles me reconhecer.
- Não creio! Andryl Evans está aqui na minha frente!? - uma das garotas grita, fazendo todos no lugar se virarem a minha procura.
- Era uma surpresa. Não podia ter gritado. - levanto as mãos em rendição, tentando mostrar simpatia enquanto todos ali começaram a rir, exceto ela.
Me aproximo mais rapidamente até onde ela estava, e por uma fração de segundos nossos olhos se encontram. Ela estava séria, com o semblante fechado, porém quando eu finalmente a alcanço, ela abre aquele sorriso só dela e me abraça.
- Por céus, como senti sua falta! - ela fala no meu ouvido.
- Vem comigo. - É só o que eu consegui responder, afinal não era essa reação que eu esperava.
Ela me seguiu em silêncio por todo o caminho, mas, não largou a minha mão. Era estranho ela estar agindo assim, mas eu não ia reclamar, era mais do que eu realmente merecia.
- Esse é o meu quarto. Pode entrar. - ela entra e fica um tempo analisando tudo ao redor. Como ela não fala nada, eu decido quebrar o silêncio constrangedor. - E então? Tudo bem com você?
- Depois de todos esses meses sem me ver, depois de ter me deixado sangrando sozinha, a espera da morte, e é com um "tudo bem com você?" que você espera começar uma conversa? - eu engulo em seco, merecia todo o ódio dela - Você acha que está tudo bem? Me diga Andy!
- Me desculpe Sophie, - abaixo a cabeça e consequentemente o tom da voz também - eu fui um idiota, confesso. Eu amo você, sabe disso. Nunca faria nada pra te machucar, eu juro! Não era a minha intenção. Eu fiquei meio louco ao saber que ia ter que dividir espaço no seu coração com mais alguém. Me perdoa? Eu vou tentar melhorar, juro pra você! - quando dei por mim já estava chorando e falando descontroladamente. Fico de costas, não queria que ela visse aquela cena. No mesmo instante sinto suas mãos deslizarem pelos meus braços, até chegar em minhas mãos, que estavam, inutilmente, tendo limpar as lágrimas.
- Andy? - ela diz com um tom de voz doce, um tom que ela só usava com quem gostava - Eu também te amo, é claro que te perdoo. Que tipo de mulher eu seria se não fosse capaz de dar uma segunda chance ao pai do meu filho? - no mesmo tempo eu ergo a cabeça e a encaro.
- Ele... Ele... É... Ele não...
- Se ele não morreu? - assinto com a cabeça - Não Andy, ele esta vivo. É um lindo garotinho e... - não a deixo terminar e abraço ela o mais forte que posso. - Não estou conseguindo respirar Andy!
- Desculpa, mas é que...
- Ficou aliviado com a notícia?
- Sim.
- Tudo bem, você quer vê-lo?
- Eu posso? Quero dizer, você me deixa? Eu devo? Veja bem, eu tentei matar ele!
- Andy? Pare de se culpar, você perdeu o controle, e só fez isso porque eu não cumpri minha promessa, de nunca deixar você sair da linha. Veja bem, você merece ver seu filho, pra ver que ele está bem e deixar de se culpar de vez. - calma e serena. - Viu? Só eu consigo te fazer relaxar, fazer você pensar com clareza, eu te ensinei a não ser deixado dominar pela raiva, ou qualquer outro sentimento ruim. Porque eu amo você, e assim como você, só quero o teu bem! - Alguém bate na porta bem na hora. - Vá lá, deve ser ele.
Meio receoso abro a porta e me deparo com uma criança de um ano praticamente, com um sorriso cheio de baba e um dentinho na gengiva de baixo.
- Ele... é lindo. - o pego no colo, fazendo o mesmo gargalhar - Ele tem o mesmo tom de pele do seu, meio bronzeado natural. Os olhos grandes e castanhos também são seus. O sorriso que me acalma também.
- Sim, mas os cabelos ruivos com certeza são seus. - ela ri. Mas ri com muita vontade, como se estivesse sentindo a maior alegria do mundo.
Eu não consigo evitar de a acompanhar, pois por esse breve momento, eu senti uma paz profunda em meu ser, junto com uma alegria avassaladora. Receio dizer que eu estava feliz, como nunca estive antes.
- Andy, eu tenho que te dizer amo você, porém não posso mais estar presente em tua vida. Nós nos esbarramos, seguimos juntos por um tempo, mas agora estamos nos distanciando e não conseguimos mais se manter estáveis um na vida do outro. Precisamos aprender a lidar com nossas dificuldades sozinhos. Eu não posso continuar a jogar o peso dos meus problemas pessoais em você. Você não tem culpa dos acontecimentos melodramáticos que ocorreram na minha vida e merece bem mais do que uma garota carente e triste. Você já fez a sua parte, me ensinou a criar faíscas de felicidade onde eu nem sequer ousaria imaginar.
- Sophie, você não pode fazer isso comigo! Sem você eu fico perdido, instável, eu perco o controle, o sono, perco a noção de limites! - o desespero toma conta de mim - Só Deus sabe do que eu sou capaz de fazer sem ter você por perto para me alertar sobre as consequências dos meus atos! - subo o tom da voz e me repreendo por ter feito isso no mesmo instante em que enxergo medo em seus olhos.
- É exatamente por isso Andy. - ela passa a mão em meu rosto, e eu fecho os olhos para poder apreciar a delicadeza de seu toque. - Você já é adulto, ninguém deveria ter que te alertar. Eu já lhe disse o que você tem que fazer para recobrar o controle dos teus atos. Tente lembrar. - ela sorri fraco e tira a mão do meu rosto para acariciar o filho em meus braços. - Você vai ficar bem! Procure por ele quando estiver são.
- Procurar quem? - pergunto e quando olho para a direção dela, ela já não estava lá.
- Papa?! - o garotinho em meus braços fala e imediatamente eu esqueço que Sophie tinha desaparecido.
- Oi neném. Que coisinha fofa. - faço cócegas na barriguinha dele, o fazendo gargalhar. Aquela sensação de plena felicidade me enche novamente.
Ele para de rir e com as duas mãozinhas pequeninas ele agarra meu rosto e fica com uma expressão muito séria.
- Papa?! Xau. - antes que eu pudesse compreender suas palavras ele também some.
- Que merda aconteceu aqui?! - grito desesperado, já abrindo a porta do quarto e vasculhando cada quanto daquele hotel. Decido procurar no quarto do Wendel, ele não tinha saído. - Wendel?!
- Oi cara, o que houve?
- Eles sumiram! Não sei como nem por que, só sei que sumiram! Me ajude a procurar!
- Calma Andy! Relaxa, respira.
- Calma nada! - me abaixo para ver debaixo da cama. - Anda logo Wendel!! - grito.
- Respira Andy!! Respira! - ele grita como resposta. E sem entender muito bem eu abro os olhos e vejo o Wendel em cima de mim junto com uma mulher.
Com muita concentração eu consigo respirar fundo, fazendo meus pulmões arderem com o oxigênio me invadindo.
- O que aconteceu? Cadê eles?
- O que? Eles quem? Eu entrei no seu quarto hoje pela manhã e te encontrei inconsciente no chão. Estava em volta de muitas garrafas de bebida vazias, sem contar as drogas! Que merda Andy! Estava tentando se matar!? Porque quase conseguiu! - aos poucos eu fui perdendo a fala dele.
- Quer dizer então que foi tudo coisa da minha cabeça? Não pode ser! Foi muito real!
- O que foi real? Você quase morrer?
- Preciso procurar a Sophie! - ignoro o que ele diz e me levanto, logo em seguida sou puxado para a cama.
- Você tem que ficar em observação e sob monitoramento. Então você vai ficar aqui! - ele fecha os olhos, típico de quando ele está muito estressado. - Tem ideia do quanto tive que gastar pra subornar a médica que te atendeu a não dizer nada para ninguém, inclusive para a imprensa sobre você ter quase morrido de uma overdose?
- Foi isso? Eu tive alucinações? - minha voz sai triste, fazendo o Wendel me encarar desconfiado. - Preciso que traga a Sophie até mim.
- Impossível, ela está viajando. Você mesmo disse. Há essas horas ela deve estar se apresentando em algum teatro renomado russo.
Droga, tinha me esquecido completamente da desculpa que eu dei para a Sophie ter sumido.

- Liga pra Helen. Talvez ela saiba quando a Sophie vai voltar.

Enquanto o Wendel tenta ligar para a secretária do senhor Adans, eu ficotentando imaginar onde é que a Sophie se meteu. Será que aconteceu algo? Morreupor perder muito sangue? Se estiver viva, por que ainda não apareceu nem mandounotícias? Por que não veio atrás de mim, me fazer pagar pelo que eu fiz?     

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