"A música é celeste, de natureza divina e de tal beleza que encanta a alma e a eleva acima da sua condição."
Dois dias antes...
As notas no piano soavam pela espaçosa sala de estar. Com maestria Leonardo Mello tocava as teclas do seu piano de cauda, presente que seus pais deram assim que se formou em Composição e Regência.
Sonata ao Luar era o que acalmava sua alma. Podia fechar seus olhos e esquecer-se da escuridão imposta no auge dos seus 21 anos.
Apesar do som penetrando seus ouvidos, aprendeu com tudo aquilo a aguçar ainda mais sua audição e seu olfato. Logo percebeu a presença de alguém no ambiente.
− Sei que está aí, conheço seu perfume. – deu meio sorriso, sem deixar de tocar a bela composição de Beethoven.
Afastou-se para o lado, deixando uma beira do banco de veludo vermelho para que sua mãe se sentasse.
− Sabe que me faz chorar toda a vez que toca Sonata ao Luar, não sabe?!
Leonardo, ainda de olhos fechados, meneou sua cabeça em concordância. Miriam, sua mãe, era uma das pessoas mais importantes de sua vida, por quem ainda valia a pena viver.
Todos os três meses em que ficou em coma no Hospital, não saiu do seu lado, praticamente mudando-se para lá e passados seis anos após o acidente, é a única que ainda aguenta seu mau humor.
Seu pai acabou perdendo a vida naquela noite trágica. Chovia forte e um carro desgovernado ultrapassou o sinal vermelho, os atingindo com violência, deixando Leonardo cego por conta do traumatismo craniano que sofreu.
Acordar do coma e descobrir a perda do seu amado pai, a dor foi maior do que saber que não poderia mais enxergar.
Os amigos depois disso, se afastaram. Não os condenava. Quem iria querer andar com um cego por aí?
Teve que fazer novas adaptações e com isso isolou-se, ficando apenas com seu piano e sua mãe, que a todo custo tentava animá-lo.
Sentia também sua dor, perder o marido e ter o único filho cego não era fácil, mas como se diz: a vida segue...
Mas depois de tudo o que aconteceu, Leonardo não quis seguir a vida, desistindo até de uma proposta para reger a orquestra filarmônica do interior do Paraná.
Como um cego iria reger? Como um cego iria ler uma partitura e conduzir os músicos? Essas eram as desculpas que dava, para se afastar das pessoas e do seu maior sonho: ser um Maestro.
Mas ele não previa que a vida lhe reservava uma grande surpresa, e essa que não demoraria a chegar.
Sua mãe insistiu em contratar uma Musicoterapeuta, para ajudá-lo a lidar com as perdas e o mau humor, por conta da baixa autoestima e depressão que sofreu por todos esses anos.
− Não adianta fazer essa cara, meu querido. Não suporto mais que viva seus dias assim, enclausurado nesta casa... sem objetivo... tocando estas músicas melancólicas... – disse Miriam, chorosa.
Uma coisa que deixava Leonardo irritado era a intromissão de sua mãe e de quem quer que fosse à sua condição de vida. Parou de tocar e levantou-se abruptamente. Pegou sua bengala encostada ao lado do piano e saiu resmungando.
− Sabe que não preciso de nenhuma ajuda, estou bem como estou. Hoje vou jantar em meu quarto. – avisou sem parar de dar pequenos passos tropeçando no primeiro lance da escada. – Maldição! – praguejou, jogando a bengala no chão com força.
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Notas de Esperança (Completa)
General FictionMelody Stuart, uma musicoterapeuta, não imaginava que a sua vida mudaria drasticamente, depois de conhecer seu possível cliente, Leonardo Mello: um maestro, pianista e cego. Ela vê nele um grande desafio em sua carreira, mas o primeiro encontro frus...