R É Q U I E M . F O R . A . P S Y C H O

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Deus, ao mar dos teus olhos,
o perigo magnetizante e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.

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Acredita-se que todo ser humano, irremediavelmente, sentir-se-á arruinado uma vez na vida. Tão perdido com a própria essência que será incapaz de enxergar o todo e agir. Engraçado como nunca fui dado a crendices populares ou filosofia de autoajuda, mas naquele instante o verbete me pareceu verídico e eu estava catatônico diante dos meus algozes.

O quarto um tanto escuro ganhou nuances aterrorizantes, tudo parecia ter silenciado para que meus pensamentos pudessem gritar, desesperados, incrédulos e ao mesmo tempo, frios. A imagem borrada do delegado não parecia mais acalentadora ou protetora como sempre me foi, pelo contrário, seus olhos nutriam um brilho sedento. Havia um oceano de sentimentos que vazava pelas pupilas, mas diferente do Hoseok, as águas eram agitadas, furiosas, conturbadas. Não te faziam querer se aproximar, não te puxavam e tão pouco faziam convites cautelosos.

Como eu pude ser tão cego? Como pude acreditar fervorosamente que havia alguém em quem me apoiar? Não havia, era tudo uma grande e majestosa encenação. Minhas costas doeram pelo peso da culpa que recaía, um misto de decepção, ódio e tristeza sem tamanho me invadiu aos poucos, fazendo-me ouvir o trincar dos meus próprios alicerces.

Não conseguia aceitar, não podia. Todas aquelas vidas inocentes tiradas como se não fossem nada, tiradas pelas mãos daquele em quem confiavam! Não... Por que? Como ele teve coragem de rasgar ao meio aqueles que por anos respeitaram-no? Seokjin... Namjoon... Por que? Por que? Por que?!

Meus olhos escorriam lágrimas sem que eu pudesse ter controle, minhas pernas estavam fracas e pouco a pouco ameaçavam a ceder. À minha frente o loiro apenas assistia minhas expressões com um ar de regozijo acompanhado de um sorriso torto. As mãos na cintura me mostrando certo nível de impaciência... Tão diferente do Jung e paradoxalmente, tão semelhantes.

Desviei meus olhos para Hoseok, ele havia se sentado na poltrona, as pernas estavam cruzadas com elegância, o cotovelo direito apoiado no braço do móvel enquanto a cabeça repousava sobre o punho, inclinada em tom de graça. O sorriso completo acompanhava o flamejar dos olhos, não desgrudando sua atenção de mim. O tronco desnudo pintado de sangue apenas contribuía para aquele retrato tornar-se ainda mais perturbador. Ele estava esperando novamente, esperando por algo. Desviei, incapaz de sustentar tamanha pressão.

— Hyung... Eu... Por que?! — Minha voz estava baixa e falha, como se estivesse agarrada na garganta.

Yoongi soltou um riso soprado, inclinando-se para frente de maneira um tanto exagerada.

— O que? Por que matar? Por que mentir? Qual resposta você quer primeiro? — Ele deu um passo em minha direção, mas eu não recuei, não tinha forças. — Ah... — Encarou-me dentro dos olhos. — Veja só... Você sente muito? Está magoado? Está pensando no Jin? Se ele não tivesse andando por onde não devia tão tarde da noite, talvez não precisasse ter partido... Em pensar que ele tentou, tão desesperadamente, avisar-te.

Minha respiração travou no peito, ódio me consumindo conforme as palavras saíam de maneira tão descuidada e debochada, como ele podia? Ousava? A respiração batia contra o meu rosto, um tanto acelerada. A face dele me parecia distorcida ao passo que aquele riso se abria para mim.

— Tudo que precisamos foi de um livro em comum, sua mente brilhante fez o resto... — Finalizou.

Quebrei a conexão e olhei ao meu redor buscando qualquer coisa que pudesse ser útil para atacá-lo, mas não tinha nada ao meu alcance e eu podia ver a arma alocada na cintura, como sempre. O cano estava com o silenciador devidamente ajustado, confirmando minhas suspeitas anteriores. Algo borbulhava no meu interior.

O Silêncio dos InocentesOnde histórias criam vida. Descubra agora