Paz, com P de Prestígio

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Fico pensando muito nesses últimos dez minutos que passaram desde que acordei. O que me faz pensar que ele largaria a vida dele, com uma esposa, duas filhas, uma carreira, uma casa, e todas essas merdas, para ficar comigo?

Ele te ama ué.

Meu subconsciente larga. Tudo bem, eu acredito de coração, seria hipocrisia minha negar que é recíproco. Entretanto se criarmos uma hipótese em que nela ele ficaria comigo, como que seria? Eu ainda tô no colégio, pretendo cursar uma faculdade, ser instável financeiramente e tals, e ele ia viver uma "aventura universitária'' comigo? Claro que não, ele já passou dessa fase, e se ele ''me escolher'', é óbvio que é pra termos um relacionamento sério seríssimo. Porque, deixar tudo o que eu já mencionei pra ter o que for comigo, e assumindo isso, não vai ser uma "experiência''. Não pra ele.

Ta bom Katherine, qual o ponto por trás dessa paranoia toda?

Eu to fazendo tudo isso, porque eu quero viver a minha vida inteira com ele? Ou por que quero passar esse momento da minha vida agora, com ele e depois, sei lá, a gente se separar?

O que eu tô tentando provar pra mim mesma nessa história toda?

Eu to pronta pra destruir uma família - que pode ter seus defeitos mas é uma família - pra depois não dar certo e puft, acabar?

E depois de tudo isso, eu infelizmente to percebendo o que ta acontecendo. Eu to duvidando o que eu sinto pelo Aaron. Não to confusa, eu amo ele, isso eu tenho certeza. O que eu to duvidando é a intensidade e a segurança que esse amor tem.

- Katherine? - Sento na cama e olho pra porta. - Pode abrir? - Demoro uns instantes pelo fato da autoterapia que acabei de me dar pra reconhecer a voz.

- Oi, claro, espera ai! - Levanto rápido, e tento me desvincilhar das cobertas que vem junto comigo.

- Oi. - Harry sorri depois que abro a porta. - Queria ver se você não quer tomar café comigo agora, ou se vai tomar depois... - Ele coça a nuca.

- Ah sim, vou contigo. - Deixo a porta aberta e volto para o meio do quarto. - Entra ai, só vou vestir uma roupa menos frutífera. - Rio na esperança que ele risse também, ao mencionar minha calça de pijama com desenho de bananas.

- Beleza. - Ele fecha a porta enquanto eu reviro a mala em busca de algo. - Ouvi dizer que o café da manhã deles aqui no hotel é bem bom. - Ele comenta se virando de costas após notar a minha feição.

- Olha, com a fome que eu tô eu acho que qualquer coisa serve.

- Verdade.

- Pode se virar. - Digo fazendo um rabo de cavalo. - O que foi?

- O que aconteceu aqui? - Ele aponta pra cama.

- Eu tive um problema quando acordei. - Harry lança um olhar de quem fingiu que entendeu. - Ai eu me enozei nas cobertas, só vamo. - Passo por ele em direção a porta.



- Mano isso é muito bom. - Digo apontando pra tudo que eu coloquei em cima da mesa.

- Sério, nem dá pra perceber. - Ele ironiza sorrindo de canto.

- Que espontâneo. - Tomo um gole do iogurte o fazendo soltar uma risada que eu daria qualquer coisa pra achar o botão do replay. - Ah que legal, ta rindo do que agora?

- Você... - Ele aponta para a sua própria boca. - Ta tudo suja.

- Ah. - Minhas bochechas queimam. - Acontece.

- Claro, com você deve acontecer toda hora. - Ele brinca com a colher.

- Acho que já deu né. - Olho para a tela do celular. - São só 10h, você tem 14h pra me irritar e não precisa ser logo de manhã. - Sorrio pra confirmar que estou levando na esportiva apesar de querer tacar a tigela de sucrilhos na cara dele.

- Ok, vou poupar pra mais tarde. - Deus é pai.



- Desculpa a pergunta, mas o que você faz da vida? - Tento criar algum assunto enquanto estamos no elevador.

- Eu acabei de me formar em marketing, e como já fazia estágio em uma empresa na época da faculdade, eu já tinha emprego depois que terminei ela. - Ele esclarece olhando para o chão e segurando as mãos atrás das costas.

- Por isso que você tava no Brasil? - Consigo sua atenção. - A negócios?

- Sim, uma multinacional inglesa tava querendo se instalar lá e essas coisas. - Não consigo imaginá-lo em uma roupa formal apresentando algo haver com business. - quer dizer, mano, olha essa cara de neném. - Katherine?

- Sim neném. - Percebo o que disse. - Quer dizer, o que você disse?

- Quer entrar? Ou tem planos agora? - Harry questiona abrindo a porta.

- Sei lá. Pode ser. Você me deixa comer os doces do seu frigobar?

- Se tiverem reabastecido. - Com a porta trancada ele vai em direção a cama. - Comi tudo ontem de noite. - Recebo um sorriso em que só as covinhas aparecem.

- Parece que eu não fui a única então. - O observo abrir a mini geladeira com esperança.

- Será que presta a gente comer isso agora? Acabamos de tomar café. - Sua preocupação transparece ao passar os dedos pelo cabelo.

- Provavelmente. - Ficamos em silêncio e nos encaramos por alguns segundos, até que começamos a rir, e ele trás consigo o que ele consegue carregar nos braços.

- O prestígio é meu. - Recebo a sua ameaça enquanto ele se joga na cama.

- Com todo prazer. - Faço o mesmo e vou abrindo alguns pacotes.

- Que? Você não gosta?

- Coco tem uma textura estranha. Sei lá. É ruim. - Eu digo e pelo olhar que recebo, quase me arrependo.

- Fala mal de novo que eu vou te fazer engolir tudo. - Ele aponta o chocolate na minha cara, porém é tarde de mais pra ele voltar atrás no duplo sentido que acaba de dizer. - Cara, você é maliciosa pra porra.

- E você tem uma boca suja.

E linda.

Já nem comece, sai daqui subconsciente.

Comemos algumas coisas, o suficiente pra não conseguir sair da cama. Harry reclama tanto da dor na barriga que foi obrigado a deitar de bruços. E eu, começo a ter as minhas paranoias de novo.

- O que você tanto pensa? - Ele me olha de canto. - Nele? - Respiro fundo. - Vem cá. - Não penso duas vezes e deito ao seu lado erguendo seu braço para poder olhá-lo. Nem se quer hesito. Deveria?

  - Eu tenho umas paranoias que as vezes doem minha cabeça

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  - Eu tenho umas paranoias que as vezes doem minha cabeça. - O olho, porém ele está de olhos fechados, aproveito que estamos em uma distância que me permite analisar cada detalhe do seu rosto e o faço.

- Shih, relaxa, tente não pensar nisso.

- É impossível. - Ele abre um dos olhos.

- Então pense em tudo isso que comemos, e no barulho que a minha barriga ta fazendo nesse exato momento. - Paramos para ouvir e não tem como não rirmos. - Relaxa essa cabeça que ta a mil, tente pensar em algo feliz, ou sei lá, não pense em nada. Prometo que depois, se você quiser, pode descarregar todas as suas paranoias em mim. - Presto bem atenção em suas palavras. - Juro que vou ouvi-las, quem saiba até exponha as minhas. - Deixo escapar um riso. - Agora fique de boa. - Sinto sua mão passando pelos meus olhos fazendo fechar os mesmos. E a única coisa que sinto antes de adormecer é o cheiro de prestígio - e a bala de melancia que ele comeu - em sua respiração.

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