Capítulo 7

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É madrugada. Nicholas vê a hora em seu relógio de pulso e suspira. Já tinha passado a hora de se deitar. Precisava acordar muito cedo no dia seguinte. Enquanto isso seu estômago reclama. Não havia alternativa a não ser preparar alguma coisa para comer, pois com fome não conseguiria dormir. Fecha o notebook e se dirige até à cozinha. Enquanto prepara um sanduíche ele pensa em Rebeca.

Tinha se apaixonado por ela desde o momento que a viu pela primeira vez. Diferente das outras, Rebeca não demonstrou grande admiração ao vê-lo. Não que ele se considerasse um Adônis da vida, mas era acostumado a ter garotas a seus pés por causa de sua beleza. Rebeca nem ao menos continuou a olhar para ele, ao contrário das outras que se derretiam diante dele. Diferente de Ellen, que várias vezes se insinuou para ele. Até hoje ele não entendia como elas podiam ser tão amigas sendo tão diferentes. Isso foi o que despertou sua atenção, além da beleza, claro, não podia negar que ela era muito linda, mas tinha algo a mais, indecifrável, que prendeu sua atenção e não conseguiu mais tirar os olhos dela. Juntando isso à indiferença por parte dela, tinha sido perfeito. Pois Nicholas gostava de jovens difíceis, aquelas que exigiam trabalho de sua parte para conquistar.

Mas nem sempre ele foi assim. Teve que pagar um preço para aprender isso. Quando era mais jovem namorara quase todas as jovens da escola onde cursara o Ensino Médio. Bastava ser bonitinha e dar mole já estava no papo. E seu charme não tornara isso difícil. Nicholas podia ter a garota que quisesse. Até a cobiçada Natasha, uma loira que parecia mais velha que seus dezessete anos devido o corpo escultural que exibia. E ele se sentia "o cara" por isso.

Nicholas não sabe explicar como foi que uma certa garota começou a chamar sua atenção.

Quase sempre ele a via sozinha no pátio, geralmente lendo um livro. Era ruiva, tinha um olhar sereno e parecia que o fato de não ter amigos não a incomodava. De certa forma aquela garota o perturbava, mas ele não conseguia deixar de olhar para ela. Procurando saber mais, descobriu que se chamava Lorena e cursava o primeiro ano.

O que mais o incomodava era o fato de ela ignorá-lo. Diversas vezes tinha cruzado seu caminho de propósito e ela nem parecia notá-lo. Isso o deixou intrigado. Que garota era aquela? Começou a perseguí-la no pátio, corredores, refeitórios, bibliotecas, muitas vezes dizendo um oi mas ela não respondia, fingindo não ouvir. Seu amigo Leon percebendo seu "desespero" lhe aconselhou:

-Desiste, ela é cristã, não quer ninguém.

-Cristã???

-Sim. Aquele livro que ela sempre ler é uma Bíblia. Tenho uma prima que frequenta a mesma igreja que ela. Por isso é um pouco esquisita.

-Eu diria misteriosa...

Nicholas achava os cristãos um bando de fanáticos, antiquados e irritantes, mas isso não mudou a opinião formada que tinha a respeito de Lorena. Aliás, foi a partir daí que ele tentou de tudo para trocar algumas palavras com ela, como se sua honra dependesse de fazer ela conversar com ele.

Depois de inúmeras tentantivas, ele conseguiu algumas palavras por parte delas. Falava sempre por monossílabos, respondendo apenas ao que ele perguntava e se afastando quando ele tentava prolongar o diálogo.

Algumas semanas depois ele conseguiu aos poucos, à base de muita perseverança, quebrar um pouco a resistência por parte dela. Conversavam alguns minutos no intervalo, ela sempre lhe mostrando alguma passagem bíblica, e ele fingindo interesse, curtindo apenas a companhia dela. Aos poucos se tornou um hábito se encontrarem no intervalo para conversar, lanchar juntos, e Nicholas já estava comemorando sua vitória quando um belo dia lhe contou que estava apaixonado e queria namorar com ela.

-Você não faz o meu tipo - ela responde sem nem ao menos olhá-lo.

Nicholas ficou sem reação ao ouvir essa resposta. Ainda mais assim: curta e grossa. Nunca na sua vida tinha escutado um não, pelo contrário, as garotas se ofereciam para ele e diversas vezes iam até à sua casa procurá-lo.

De repente ele sentiu um misto de raiva e decepção. Quem aquela garota pensava que era? Ele era o rapaz mais popular de toda escola, desejado por todas lindas meninas que ali estudavam. E ali estava uma menina que não conseguia fazer amigos, que muitos a achavam esquisita, lhe rejeitando! E ainda por cima, cristã! E ele sendo caçoado por vários colegas por está interessado nela! Sentiu vontade de dizer várias coisas e fingir que aquela rejeição não lhe afetou. Mas não conseguiu. Tinha doído sim. Por incrível que pareça ela tinha conseguido fazer com que ele sofresse por aquilo.

Com o orgulho ferido, ele só conseguiu perguntar:

-Não faço seu tipo por quê?

-Simples - ela responde,  dessa vez lhe direcionando o olhar- Em primeiro lugar, você não é cristão, e em segundo, você já namorou com todas as meninas dessa escola, não quero ser apenas mais uma da sua lista.

Era o que bastava para Nicholas sair dali sem nem ao menos olhar para trás. Lorena tinha ido no mais profundo de seus sentimentos, e pela primeira vez ele se viu obrigado a repensar suas atitudes. De quantas meninas ele tinha tirado proveito! A maioria era como ele: só queria uma aventura. Mas outras eram um pouco inocentes, procurando que ele viesse assumir um compromisso. E ele tinha brincado com seus sentimentos, partido corações e provocado desilusões. E pela primeira vez também, pensou no quanto essas pobres meninas deviam ter sofrido. Sentiu o impulso de ir até elas, se é que tinha memorizado o nome ou mesmo o rosto de alguma, e pedir perdão. Sentiu vergonha de si mesmo. Um homem de verdade não possui essas atitudes. Agora ele dava razão aos conselhos de seu pai, que antes parecia sermões ultrapassados. Mas foi necessário uma garota falar isso para ele. Uma garota maravilhosa que ele teve a chance de conhecer. Inteligente, meiga, Lorena tinha muito o que oferecer, e ele achou que poderia ser uma pessoa melhor ao seu lado. Lorena era a primeira pessoa de quem ele gostara de verdade, e ironicamente, a primeira que lhe rejeitara.

Por isso que ele se apaixonou instantaneamente por Rebeca naquela tarde, quando a vira no portão de sua casa. Rebeca lhe fez lembrar de Lorena: o mesmo olhar, a sensação de mistério, a indiferença... Tinha sido mais fácil conquistar Rebeca. Talvez o fato de não ter conhecido o velho Nicholas tenha ajudado.

Sonhos de uma jovem cristã (completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora