DURA REALIDADE

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Após aquele longo abraço, posso perceber a tristeza que aumentava a cada segundo nos olhos de minha mãe, sua tentativa de disfarçar não funcionou, diante da situação que certamente era impossível.

Tentando não me explicar ela muda o assunto.
Mãe: Ei filha, você chegou mais cedo.
Quer comer alguma coisa antes do jantar?

O abraço então  se encerra, e meus pais se separam enquanto eu tento manter o assunto.
Eu: Ei mãe, eu saí e vim direto, não esperei por Carla hoje.
Oque estão conversando?

Percebo meu pai se afastando de nós seguindo de cabeça baixa.

Olho para minha mãe com esperança de receber uma resposta. Mas também com medo do que estava por vir.
Mãe: Filha, estávamos aqui conversando sobre o dia de seu pai.

Percebo que a tristeza se transforma em ira e minha mãe já não pode conter suas lágrimas que rolam de seus olhos.
Eu: Mãe, oque está acontecendo?
Me diz, por favor!
Digo e me jogo em seus braços procurando um carinho, que é prontamente atendido.

Olho para trás e já não consigo visualizar meu pai.
Percebendo que não conseguiria saber além de mentiras, me solto dos braços de minha mãe, e vou a procura daquele que causara tanto desgosto à  ela.
Vasculho a casa e não o encontro, aos gritos vou conferindo cômodo por cômodo.
Eu: Pai! Onde está!
O chamo sem ouvir uma resposta.

Subo até o terraço e já ouço um gemido abafado de choro, vou me aproximando calmamente daquele som e vejo meu pai sentado em sua cadeira olhando para rua, abaixo de nossa casa.
Jamais havia me deparado com meu pai naquela situação, ele estava verdadeiramente devastado por algum motivo, estava transtornado e chorando sem conseguir parar.
Me aproximo e seguro sua mão na tentativa de acalma-lo.
Me sento na cadeira ao lado e tento descobrir.
Eu: Pai, oque aconteceu?
O Senhor bebeu novamente?
Pai: Um pouco Ana, socialmente!
Eu sabia que aquela frase "beber socialmente" não se aplicava.
Com lágrimas nos olhos o questiono.
Eu: Mas o senhor prometeu não beber de novo pai!
Falo e logo vem o choro que embarga minha voz.

Sinto nos olhos de meu pai que o arrependimento era verdadeiro.
E sabia que algo muito ruim provocara aquele sentimento.
Ele respira e me explica.
Pai: Filha eu bebi um pouco, saí com uns amigos do trabalho e fomos direto para o bar. Ficamos jogando sinuca, eu não ia beber, mas foram me oferecendo, e eu aceitei tomar umas doses com meus amigos.
Só para relaxar mesmo filha.
Ele diz enxugando suas lágrimas.

Respiro e tento assimilar.
Eu: Pai então a mamãe está assim por isso?
Certamente ficamos preocupadas quando o Senhor bebe, mas nunca a vi assim. Nunca a vi naquele estado pai!

Ele segura em minha mão mais forte e parece que toma coragem para me contar toda a verdade.
Pai: Não filha, sua mãe tem razão por estar assim. Aconteceu um acidente e eu não consegui evitar.

Me assusto e questiono.
Eu:Como?
O Senhor disse que bebeu pouco pai, um acidente?
Questiono sabendo que não era verdade. De certo ele havia bebido muito.

Ele abaixa a cabeça, e com seus olhos cheios de vergonha e me conta sobre o acidente que provocara.
Pai: Sim filha,  mesmo sendo pouco, ao sair do bar liguei o som ao ligar o carro. Tinha um outro carro na frente do meu, precisei dar ré pois estava com a caminhonete do trabalho, que dificulta a direção. Até aí tudo bem, mas ao dar ré, não  pude ver uma senhora que estava passando na parte traseira do carro.
As pessoas disseram depois que gritaram para tentar com que eu parasse, mas o som alto também atrapalhou e mesmo com os gritos das pessoas eu não consegui parar. Não consegui frear, não deu tempo, meu reflexo estava comprometido, aí aconteceu o inevitável filha.
Passei com o carro em cima da perna da senhora e a derrubei, ela bateu a cabeça e desmaiou.
Filha me perdoa, por favor.

Ao ouvir aquele relato me vem em meu pensamento, toda a minha infância.
Aquele dia  no meu aniversário de 7 anos, o dia em que infelizmente acabara triste, pois meu herói, meu pai, chegou em casa sendo carregado por amigos por estar bêbado e não conseguir andar, me lembrei também de outra vez que ele brigou em uma festa e tivemos que vir embora para não piorar a situação e acabar em morte, e também outras várias vezes que ele chegou e minha mãe precisou dormir comigo por não suportar o cheiro de álcool em seu quarto.

Essas lembranças eram dolorosas demais, eu as guardava em um lugar secreto em mim.
Não gostava de lembra-las e não as partilhava com mais ninguém além dos que vivenciaram comigo.

Eu estava triste em vê-lo mais uma vez naquela situação vexatória.
Eu o via como um super herói, mas sabia que essa era a forma que eu queria vê-lo, e não como ele realmente era.
O abraço, e me sinto impotente, não podia fazer nada.
Ali abraçados, escuto ao longe minha mãe nos chamando.
Mãe: Ana, avisa seu pai que a polícia está aqui e quer falar com ele.
Olho para meu pai e percebo o desespero em seus olhos.

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O INÍCIO DA METAMORFOSE 🦋💜Onde histórias criam vida. Descubra agora