9 de Agosto de 2022
- Acredita mesmo nisso?.
Levi me encarou com um esgar. Estávamos num canto da padaria, sentados sobre o cobertor, devorando um pedaço de pão que recebemos de Helena minutos antes.
- O Osvaldo disse que ouviu no radio, o exército está limpando as cidades logo vão chegar aqui.
Por um minuto acreditei que Levi ficaria animado com a noticia, mas é claro que não.
- Não imaginei que fosse tão ingênuo, parceiro.
- Como assim?.
- Ele não disse que estavam recrutando qualquer um que pudesse segurar uma arma? O que acha que isso significa?.
- Que.... Toda ajudá é bem-vinda?.
Sorriu.
- Não chego nem perto, o que isso quer dizer é que eles estão tão desesperados que estão jogando armas nas mãos de qualquer catarrento ou debilóide capaz de segurá-las. Acha que um "exército" desses tem alguma chance de fazer algo contra uma horda de zumbis? O que eles vão conseguir é engrossar a fileira dos mortos e ferrar com as nossas vidas.
- Mas ele disse...
- Ele disse o que ele quer acreditar, só isso! Ele é velho, não é capaz de processar algo tão inacreditável, não viu como a coisa está realmente feia lá fora. Levi deu uma mordida no pão e, com a boca cheia continuou. - Por isso, não seja estúpido pra cair nesse conto de fadas de que o exército vai aparecer com tanques de guerra e helicópteros e afastar o bicho papão; não há ajuda nenhuma vindo, não tente fugir dos problema, parceiro. Não espere que alguém vai surgir pra salvar a Elice por você.
- Droga, já entendi, já entendi.
Esfriei completamente por dentro.
Por mais que eu não quisesse ouvi-lo, o que ele dizia fazia sentido, todos aqueles seres naquele estacionamento... Não consigo ver um exercíto sem preparo algum sendo capaz de confrontar algo como aquilo.
Merda. Droga. No final, não há esperança mesmo! Preciso chegar até Elice e depois descobrir o que fazer, até lá, não vale a pena pensar em salvação ou em algum exercito estúpido... Concentre-se no agora, é o que me resta.
Pouco tempo depois, Helena e Rogerio apareceram, os dois vestidos uniformes do controle de animais: Calça social escura e camisa de gola verde, além de grandes mochilas nas costas, pra trazer a comida. Helena também estava com grossar luvas que iam até seus cotovelos, provavelmente usadas pra lidar com cães raivoso. O revólver encontrava-se aconchegado no cinto de Rogerio.
Levi se aproximou dele.
- Que tal me devolver o revolver agora?.
O homem cuspiu no chão, perto de seu tênis.
- Sequer sabe usá-lo, pivete!.
- Me dá ele que a gente descobre?.
- Não, acho que vai ficar melhor comigo! tenho treinamento, entendi? E como dizem, crianças não devem brincar com armas.
- Levi. Falei, precisava acalmá-lo. - Deixa para lá, pega o martelo.
Entreguei para ele, que guardou-o no interior da jaqueta de couro. Podia ver as marcas de dente nela de quando fomos atacados na avenida.
- Estão prontos?. Perguntou Helena metendo-se entre nós.
Ela tirou uma das luvas que estava usando e me entregou, enfiei-a na mão esquerda seu interior estava quente e úmido.
Em seguida nos dirigimos pela mesma porta pela qual entramos ali na primeira vez, antes de irmos para fora Osvaldo veio até nós, seu rosto demonstrava aflição.
- Boa sorte pra vocês, tenham cuidado por favor e caso pareça muito perigoso não hesitem em voltar, mesmo que sem a comida, entenderam? Nós damos um jeito!!.
- Obrigado, Osvaldo. Disse Helena, e beijou-o na testa enrugada. - Nós vamos voltar com as mochilas cheias de comida, não se preocupe! E também vou trazer um daqueles cigarros fedorentos que você adora, só prometa que vai fuma-los bem longe de mim.
- Sim, não se preocupe velhote. Adicionou Rogério. - Vou garantir que todos voltem em segurança, até esse pivete aqui. Disse depositando a mão sobre a cabeça de Levi, que a afastou com violência.
E então nos despedimos e atravessamos a porta.
O beco no qual estávamos seguia até a cerca metálica e depois a calçada. Não havia sinal dos desgraçado por ali. Nós avançamos e Helena destrancou o portão, e assim que saímos trancou-o de volta.
Não tivemos problemas do lado de fora, sempre vigiando os arredores nós quatro fomos na direção do mercado. Helena fazia a dianteira, com um facão enorme na mão esquerda, enquanto eu e Levi no meio e Rogério com o revólver por último, algo me dizia que ele havia ficado naquela posição para nos previnir de fugir. Que confiança.
De alguma forma, a cidade parecia mais medonha do que da última vez. Não havia nenhum barulho enquanto caminhávamos, somente nossos passos temerosos hesitantes cruzando aquela paisagem solitária, observávamos as casas e prédios abandonados com suas portas e janelas abertas e elas eram como bocas negras, prestes a vomitarem terror sobre nós. O perigo jazia por todos os lados.
Eu estava quase acreditando que chegariamos ao nosso destino sem encontrar nenhuma criatura, quando surpresa, nos deparamos com uma já na frente do mercado.
Era um homem gordo, com um crachá no peito da camisa, provavelmente o gerente do lugar. Ele estava lá, diante das portas de vidro, como guarda! Exceto que guarda nenhum estaria em serviço coberto de sangue, como se tivesse acabado de devorar um bife cru com as mãos.
Ao vê-lo, rapidamente nos agachamos e nos escondemos detrás da mureta que servia para manter os carrinhos de compras.
- Deixe ele comigo. Disse Levi, passando a frente com martelo na mão.
- Calma!. Sussurrou Helena e segurou sua jaqueta. - Pode ter mais deles.
- O que sugere então?.
- Espera.
Ela então procurou algo no chão e encontrou uma pedra, segurou-a sobre a cabeça e arremessou-a em um ponto distante, na direção do estacionamento.
A pedra acertou a latarua de um carro e um ruido metálico ecoou no silêncio supulcral daquela manhã.
O guarda foi tomado de súbita energia, soltou um grito arrepiante, e correu até lá. Ao mesmo tempo, outros dois berros elevaram-se do estacionamento, em uníssono.
- Vamos.
Tão depressa quanto possível, nos adiantamos até as portas e entramos no mercado.
O interior jazia imerso em sombras, a única iluminação provinha da rua, através da janelas altas, o que nos permitia enxergar somente até os caixas e o começo das prateleiras vazias. O cheiro, assim que nos aproximamos delas tornou-se horrível, como nada que eu havia experimentado antes, uma combinação de carniça, umidade e chorume.
- Jesus Cristo. Falou Rogério, enterrando nariz e boca na manga da camisa. - É pior que os piores dias do canil, quando todos os cachorros ficavam com diarréia ao mesmo tempo.
- Não é tanto assim. Disse Helena, mas nem ela conseguiu evitar uma careta.
Quando chegamos mais perto e investimos pelo corredor mais distante da porta, entendemos o motivo.
As prateleiras estavam vazias, mas o que não havia sido saqueado estava espalhado pelo chão, fora de suas embalagens, em poças escuras... No meio dessas poças, ao longo do corredor, encontramos os copos de meia dúzia de indivíduos, em avançados estágios de decomposição, envoltos em nuvens de moscas.
Por um momento julguei ver um deles se movendo, e me preparei para me defender, então alguém acendeu uma lanterna e seu feixe caiu sobre esse mesmo corpo e eu entendi o que era! Ele não estava se movendo, apenas havia tantos vermes se contorcendo sobre sua carcaça putrefata que na penumbra pareciam compor um único ser em movimento. Diante de tal visão o que restava do pão que eu consumi mais cedo prontamente subiu por minha garganta e despejou-se no piso ao lado do que restava do corpo, minha pequena contribuição aquela cena infernal.
- Está bem?. Perguntou Helena, apontando a lanterna na minha direção.
Protegi os olhos da luz.
- Tudo... Tudo, vamos em frente!.
Depois de cobrimos nossos rostos com panos ou camisas, para evitar o cheiro e as moscas, contornamos os corpos da melhor maneira que conseguimos. Helena ia na frente com a lanterna, no caso de encontrar alguma aberração, nós atrás tinhamos que nos virar na penumbra.
Era difícil enxergar, e no meio do caminho Levi estava dando a volta em uma das poças quando o pé de Rogério se meteu entre os seus e o fez perder o equilíbrio. Levi caiu para frente e afundou os joelhos no chorume, enquanto as mãos à procura de apoio enterrou-se no peito repleto de vermes de um dos corpos.
- Merda, me desculpe. Disse o homem. - Aqui. E estendeu a mão para ajuda-lo a levantar.
Senti um frio na espinha.
No entanto, para meu espanto, Levi sorriu e pegou a mão de Rogério.
- Não foi nada. Disse. - Acidentes acontecem.
Ao chegarmos ao final do corredor, demos de cara com os balcões do açougue... As únicas carnes neles estavam alimentando as mesmas colônias de vermes. Contornamos, afinal chegamos a porta do depósito.
Era uma porta de metal dupla, grossa e lisa, pintada de azul. Helena puxou a chave do bolso e inseriu na fechadura dela.
- Considerando tudo. Falei. - Foi mais fácil do que imaginei que seria.
- Isso foi só metade do trabalho. Disse Helena, girando a chave. - Mas com certeza, estamos com sorte.
Quando ela abriu a porta foi tão abrupto, tão ridiculamente estridente e potente que a princípio fomos incapazes de esboçar reação, ficamos apenas lá, congelados, ouvindo os belos de incontáveis mortos emergirem de todos os lados, abafados pelo som do alarme do depósito.Regra.20
Mate com eficiência: nunca use as mãos para matar um zumbi. Simples. (Volte nas regras 11, 12 e 13... E em todas as outras se possível).
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Diário De Um Sobrevivente - Concluído
Teen FictionQuem você seria em um apocalipse zumbi? Se sua resposta foi um singelo e confuso... Nao sei. Venha, se desenrrole, e descubra quem você realmente seria em um apocalipse zumbi. Aqui o protagonista terá que enfrentar não apenas os mortos, mas também a...