Depósito Prisão

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9 de Agosto de 2022

Os gritos dos mortos elevaram-se de todos os lados, através das paredes, atraídos pelo barulho do alarme, todos vindo em nossa direção. Suas sombras se projetavam na parede diante das portas de vidro do mercado a medida que entravam sem parar, investindo pelos corredores, tropeçando nos corpos no chão e seguindo em frente.
- Entrem!. Gritou Rogerio, e começou a nos empurrar para dentro do deposito, que estava escuro como o fundo do oceano. - Vão vão vão...
Ele foi o último a entrar, e enquanto puxava a porta, podíamos ver pela fresta as criaturas se aproximando a toda velocidade. Assim que a porta se fechou, no mesmo instante, ouvimos eles do outro lado se chocado contra ela. Saltamos para trás, aterrorizados, imaginando que a derrubaram-na e nos pegariam.
- Relaxem. Disse Rogerio ofegante, iluminado pela lanterna. - Eles não vão derrubar essas portas, são grossas de mais, vejam. Apontou para a fechadura. - Ela sequer esta trancada e os imbecis não conseguem abrir.
- Prefiro não arriscar. Helena foi até ela e a trancou.
- Oh Zeus, essa foi por pouco.
- Sim, mais um segundo e teríamos...
- Não sei se perceberam. Disse Levi. - Mas precisamos dar um jeito de desligar esse alarme, antes que ele convide cada maldito zumbi dessa cidade para o jantar. E caso não tenham entendido, nos somos o jantar.
- Tem razão.
Helena investigou os arredores com a lanterna.
- Rogerio, ali. Disse, e apontou para a caixa metálica presa na parede, logo acima da porta.
Rogério apontou o revólver porta ela e disparou. Após uma pequena explosão, o interior pegou fogo e o alarme morreu. Os violentos ataques a porta por outro lado, continuaram. O som de socos, cabeçadas e investidas daquelas coisas preenchiam o deposito escuro.
- Bom, e agora?. Falei.
- Pegamos a comida e encontramos uma saída.
- Ótimo.
Contudo, após duas horas vasculhando cada centímetro do deposito, chegamos a amarga conclusão de que não havia outra saída. Havia outras portas, uma enorme que servia para os caminhões entrarem com as mercadorias e outra menor ao lado dessa, para os funcionários, mas ambas apresentavam o mesmo problema da que havíamos usado para chegar ali; estavam bloqueadas por dezenas de mortos vivos.
- Merda!. Praguejou Rogério, coberto de suor, deixando-se cair encima de meia dúzia de paletes empilhados.
Helena apoiou a lanterna em um local que iluminasse aonde estávamos, formando uma pequena ilha de luz em meio a um oceano de escuridão, e se sentou encima de um monte de fardos de arroz. Sentei-me ao seu lado.
- Infelizmente é isso mesmo. Disse ela, gotículas de suor percorriam a linhas de seu pescoço bronzeado. - As janelas são pequenas de mais para passarmos, e as portas, bem...
-

Alguma coisa no segundo andar?. Perguntei.
  Rogério passou a mão pelos seus ralos cabelos loiros.
-  Está cheio de papel higiênico e bebidas. Tem janelas, mas não da pra abrir nenhuma! Estão emprradas, as desgraçadas. Claro, a gente pode até quebrar os vidros e passar por ela, mas só vamos encontrar uma descida direta paro inferno. Não tem nenhum lugar seguro para pular, o prédio mais próximo está longe demais e os desgraçados estão pulando por todos os lados lá em baixo.
  - Pelo Menos. Falei. - Temos bastante comida... Arroz, feijão, massa, bolachas, carne seca, enlatados e muito mais, o problema é que a maioria precisa ser cozida e o fogão dos funcionários não tem gás.
- De que diabos isso vai nos servir se tivermos que ficar aqui pra sempre?. Questionou Rogério.
  Levi estava de pé, diante de nós.
- Não vamos ficar pra sempre. Disse.
- Ora. Retrucou Rogério. - E porque não disse que tinha poderes mediúnicos? Podia ter nos avisado que o alarme estava ligado.
-  Pelo visto, o tamanho do seu cérebro não é proporcional a cabeça. Levi suspirou. - Pense camarada, não somos os único vivos por ai, entende? alguma hora, alguém vai fazer a mesma estupidez que nós e produzir algum barulho que vai atrair os mortos para longe daqui. Pode ser algum acidente, um incêndio, um prédio desmoronando... Tanto faz, só precisamos esperar.
- Quanto tempo?.
- Como vou saber? Algumas horas, dias, talvez semana ou meses... Temos comida e água, podemos aguentar até lá.
  - E quanto as pessoas que deixamos pra trás?. Perguntou Helena. - Elas vão morrer de fome se não voltarmos logo.
- E quer que eu faça o que?. Levi olhou para longe. - Estou apenas sendo realista, se quer ir la fora e tentar abrir caminho a ferro e fogo, fique a vontade! Só não me inclua nessa aventura suicida.
- Helena deixou escapar um riso amargo.
- Você realmente não se importa com nada além de você mesmo, não é?.
- Pode me demonizar o quanto quiser, se isso for aliviar sua consciência; mas lá no fundo, você sabe que eu estou certo! Se tentarmos sair com essas coisas ai fora, seremos devorados em questão de segundos, e então, aquelas pessoas lá na padaria irão morrer de fome de qualquer forma.
- Pelo menos teremos tentado. Disse ela.
- Temos que concordar com a Helena. Falei. - Não tem como saber se eles vão mesmo sair, e nós nos comprometemos a levar comida para aqueles idosos e crianças. Por mas que eu não queira enfrentar mais daqueles monstros, e Deus, como eu não quero, nós temos uma obrigação.
- Como eu disse, façam o que quiser. Eu ficarei aqui, em segurança, até o momento oportuno surgir. Afirmou Levi.
-  Helena. Interveio Rogério, hesitante. - Por mais que eu odeie admitir, o garoto está certo, não vai adiantar de nada se a gente morrer sem conseguir levar a comida! Vamos esperar algumas horas, pelo menos; talvez surja um momento melhor pra sairmos e então, iremos todos juntos!. Teremos mais chances de conseguir.
Ela suspirou.
- Tudo bem. Esfregou as pálpebras. - Vocês tem razão, estou me deixando levar, ainda é muito cedo pra decidir alguma coisa. Vamos esperar e ver o que vai acontecer.
Ela levantou e pego a lanterna.
- E já que estamos presos com toda essa comida, vamos aproveitar e comer como não pudemos nesses últimos tempos. Há mais do que o suficiente aqui pra todos do grupo aguentarem até a ajuda chegar, então não precisam se segurar. Assim, quando formos sair, estaremos bem alimentados e prontos pra sobreviver. Só tentem não sofrer uma indigestão.
- Finalmente uma boa ideia. Disse Levi. - Hora de tirar o estômago da miséria.
-  Depois de enchermos as mochilas com alimentos imperdíveis, encontramos alguns pacotes de velas e cada um foi comer o que estava com vontade. Levi e eu reunimos um monte de porcarias, salgadinhos, bolachas, chocolate, refrigerante... Devoramos tudo como duas criança há muito tempo sem açúcar. Rogério pegou alguns pacotes de carne defumada e foi até o segundo andar buscar uma garrafa de uísque. Helena foi mais modesta; comeu alguns biscoitos salgados, depois abriu uma lata de pêssegos e misturou com creme de leite.
- Durante o resto do dia, ficamos observando a situação pelas janelas do segundo andar, esperando, taciturnos, pelo tal momento oportuno de sair. Mas ele não chegou.
- Assim que anoiteceu, perdemos a pouca luz do sol da qual dispúnhamos e se tornou impossível enxergar se quer a própria mão diante do rosto. Para evitarmos de causar um incêndio ali dentro, apagamos as velas e nos reunimos para dormir, usamos sacos de batata como cobertores e estamos sobre os fardos de arroz.
Foi a pior noite da minha vida.

Regra.21
Aproveite as pequenas coisas: já que está a beira da extinção humana nesta merda de mundo, porque não comer todas as besteiras possíveis? Acelerar a Ferrari até o último ponteiro ou zonear a casa do vizinho?.

Diário De Um Sobrevivente - ConcluídoOnde histórias criam vida. Descubra agora