Pandemônio na Avenida

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 7 de Agosto de 2022

 Levi estava pendurado no muro, o cabelo suando agitado pelo vento, observando na tarefa de encontrar o melhor lugar pelo qual atravessar a avenida.
 Abri a mochila e peguei uma das latas de sardinha.
 - Não quer comer?. Perguntei.
 - Não, esse negócio só iria revirar meu estômago.
 - Você que sabe. Guardei a lata de volta, havia um nó, no meu estômago também.
 Cerca de 15min depois estávamos prontos.
 - Eu salto pro outro lado e você me joga a mochila. Disse ele, então esticou os braços e dobrou o corpo até desaparecer por cima do muro.
 Arremessei a mochila e rapidamente subi também.
 Cai o mais silenciosamente possível na calçada. Podia ver as cabeças dos infectados indo e vindo por sobre os capôs dos carros, dezenas deles percorrendo aquele labirinto de morte e metal. Corremos agachados para trás do veículo mais próximo.
 Lado a lado, trocamos um olhar. Então ele seguiu em frente de martelo na mão, comigo na reta, de revólver.
 Assim que contornamos o carro, nós deparamos com uma menina, devia ter uns 12 anos, com um buraco vermelho onde devia estar o nariz e o braço terminado num toco dilacerado.
 Ao nos ver, ela rosnou os dentes. Levi segurou o martelo com as duas mãos, e num golpe horizontal, acertou-a na fonte. A cabeça da menina foi propelido para o meio da rua e ela tombou no asfalto, emitindo gemidos agonizantes. Passamos por cima dela e nos apressamos.
 Fazia um sol de rachar lá em cima e eu sentia o suor escorrendo pela minha pele como insetos peçonhentos. Enquanto Levi avançava como se nada pudesse abala-lo, dedicando apenas breves olhares por cima dos carros, eu, por outro lado, olhava febrilmente ao redor, pressionando o cabo da arma até o ponto de doer. Duas vezes precisei agarra-lo pela jaqueta para impedi-lo de seguir direto para um grupo de infectados. A tensão era absoluta.
 Depois de alguns minutos evitando da melhor maneira possível encontrar um deles, enfim chegamos a mureta a qual separação as duas vias da avenida, saltamos por ela e continuamos nos esgueirando por entre os veículos. Foi quando tudo deu errado.
 Estavamos contornando um caminhão de carga tombado, com sua traseira formando junto com os carros do outro lado uma espécie de corredor, quando dois deles surgiram lá na frente.
 Era a loira baixinha, com os seios de fora, e um homem careca, de terno. Antes que pudessem nos ver, nos viramos, e agachados disparamos na direção oposta.
 Mas, subitamente Levi parou e eu bati com o rosto em suas costas.
 - O que houve?. Sussurrei, exasperado. - Ande logo!.
 Então escutei um uivo furioso lá atrás e soube que era o fim. Olhei por sobre o ombro e vi as duas criaturas vindo pelo corredor, martelando o asfalto com seus pés descalços. A lingua da morte percorre minha espinha e meu corpo petrificou.
 - Merda.
 Levi se virou para mim.
 - Correndo, vai, vai, vaaaaaai.
 A princípio não entendi. Ele queria correr direto para aqueles dias aberrações quando podíamos fugir e dar a volta pelo outro lado. Foi quando olhei para frente que me toquei. Na outra ponta, meia duzia de figuras maltrapilhas também adiantavam-se para nós, prestes a nos transformar em sanduíche de carne.
 - Puta que pariu.
  Voltei-me para o lado com menos deles e corri, rangendo os dentes numa careta de desespero. Apontei o cano do revólver para os dois desgraçados e disparei.
 Um choque correu pelos meus braços e o barulho do tiro pareceu ecoa através de toda a cidade. De imediato, berro monstruosos elevaram-se de todos os cantos no caos da avenida. Era a sineta de almoço servido.
 A primeira bala atravessou o pescoço da loira e ela oscilou, ameaçando cair, mas equilibrou-se e continuou sua corrida.
 A adrenalina irrompeu como eletricidade em minhas veias e gritei, disparando de novo e de novo, até ouvir o click do tambor vazio e a risada desvairada de Levi as minha costas.
 Um dos projeteis atravessou o olho do careca e ele desmoronou para a direita como um saco de batatas. A loira, contudo, permaneceu de pé, com dois buracos jorrando sangue, um no peito e outro no pescoço.
- Levi. Gritei, quase em lágrimas. A maldita continuava vindo em nossa direção e não havia como contornar; o corredor era estreito demais.
- Deixa comigo, parceiro!.
Desacelerei e ele tomou a dianteira, o martelo ao lado do corpo, preparado para o impacto.
Quando se encontraram, a loira esticou os braços para agarrar, faminta, os seios para balançando de um lado para o outro.
Levi saltou para o lado, batendo as costas em um dos carros que forma o corredor, enquanto os dedos dela passavam rasgando o ar, quase o atingindo no rosto. Ele aproveitou a abertura e, segurando firme o martelo,  traçou uma linha vertical de baixo para cima. O impacto na nuca dela foi tão forte que ela caiu para frente, de cara no chão.
- Vamos!. Disse, sem tempo para finaliza-la, as criaturas se aproximavam.
Passamos por cima dos dois e dobramos a direita, na cabine do caminhão.
Nosso caminho então foi interrompido pelos destroços de um carro e uma van batido, entrelaçados em metal formando uma barreira impossível de se transpor.
- Porra, e agora?!
- Sobe!. Disse Levi, apontando para a cabine.
Completamente desnorteado, meti um pé numa porta carbonizada e usei-a para me impulsionar até os limpa-para-brisas do caminhão. Escalei-o como um macaco bêbado, agarrando-me a qualquer saliência, pressionando o momento em que pegariam minhas pernas e me puxariam para a morte.
Só voltei a respirar no momento em que desci do outro lado do acidente e deixei para trás as artes da hora faminta. Entretanto, já não havia tempo para descanso. Não era mais necessário nos agarrar, pois todos sabiam que estavamos ali. Dúzias daqueles seres avançavam pelos corredores de carros, batendo de um lado e do outro como bolas de pinball enlouquecidas, procurando uma forma de nos alcançar enquanto íamos para lá e para ca, subindo por cima dos capôs e saltando de uns pros outros, sempre com mãos e bocas famintas tocando nossos pés. Os gritos das aberrações eram como o ruido de ondas se elevando a medida em que se aproximavam para nos engolir em espuma e sangue. O menor deslize seria o nosso fim.
 Depois do que pareceram horas, de repente, alcançamos o outro lado da avenida.
 Ansioso para chegar em segurança, pulei do teto de um carro para a calçada, ao chegar ao chão, contudo, cai com o pé sobre uma garrafa pet de coca-cola e perdi o equilíbrio. Quase quebrei o pescoço ao me estatelar contra uma  parede e terminar deitado sobre o lixo.
 - Que diabos foi isso?. Disse Levi.
 Ele aterrissou ao meu lado e me ajudou a levantar. Procuramos então a esquina mais próxima e fomos em sua direção.
 No meio do caminho, um morto-vivo, um homem negro emergiu de entre dois automóveis e não houve tempo para reação.
 Ele atirou-se de dentes no braço de Levi, abocanhando-lhe a jaqueta na altura do antebraço enquanto tentava acerta-lo no pescoço com as unhas e o rapaz usava o outro braço para impedir. O martelo havia escorregado de seus dedos, ele gritava em terror, avancei para socorre-lo.
  Agarrei o martelo, segurei o cabo de madeira maciça o mais alto possível e investi toda a minha forma na pancada.
 Ao atingi-lo, o aço deformou-lhe o topo da cabeça, formando uma depressão.
 Sua mordida imediatamente afrouxou e Levi acertou-o com o capacete, então enfiou a perna entre os dois e, com um empurrão, mandou para o chão. O morto não tornou a levantar.
 Com a agitação dos mortos-vivos fervendo em nossos ouvidos, deixamos para trás a avenida e alcançamos a esquina para a próxima rua. Finalmente estávamos na metade do caminho.
 Estou chegando, Elice.

Sem regras novas por aqui, se você tem uma boa memória, acredite a regra 1 é essencial nesse momento.

( Regra.1 Mantenha-se em movimento, abaixado, quieto e alerta. Em duvida, apenas corra coleguinha. )

Diário De Um Sobrevivente - ConcluídoOnde histórias criam vida. Descubra agora