Capítulo 4 🌙 Amarga noite

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Nota inicial: E chegamos com mais um capítulo. Espero que gostem...

Boa leitura♥

🌙

O fogo já havia tomado uma proporção catastrófica quando Aranel chegou no campo, e a relva, sob seus pés, bruxuleavam na luz maligna daquela chama vil, e que, cruelmente, arrancou de Ruby e seu marido, a vida que eles levavam. A casa, em chamas covardes e maldosas, caía, aturdida, sobre seus donos. Nel pôde, mesmo que brevemente, ouvir o grito de horror do casal que queimava lá dentro. E chorou.

Ela caiu de joelhos na estrada de pedras que levava até a entrada, e sentiu seu coração quebrar-se. Tudo aquilo era a única coisa que ela possuía, as únicas pessoas que ela amava como família. Ruby lhe deu abrigo, comida e conforto quando Nel bateu à sua porta, estremecendo de frio. Eären a tratou como uma filha, e a ensinou muitas coisas. Se hoje ela estava de pé, e não jazia em alguma ravina ali por perto, foi por ajuda deles. E agora eles tinham partido. Da morte dos homens nada se sabe, e aquilo a consumiu mais que o fogo que ardia, à sua frente. Ela observou aquela destruição, chorando, quase caindo em loucura e treva, e engoliu em seco. As paredes não queimavam pois eram fortes, mas o telhado não suportou o calor. Despencou do alto, fazendo um estrondo sombrio e terrível, ecoar dali.

Aranel olhou para trás, para a cidade que se alegrava com uma festa em torno da Fogueira, e não perceberam seu desespero. Ela sabia que as únicas pessoas com quem poderia contar estavam mortos, e tentou parar de chorar. Tentativa vã e mal-sucedida. Ela se pôs, por sobre os pés, a chorar,  enquanto que o fogo consumia a única casa que ela conhecia.

Esperava que as coisas mudassem. Os elfos haviam retornado, conseguira um trabalho para restraurar, e Ruby estava forte depois de uma gripe terrível. Os dias ficaram mais quentes, e o verão chegou com força. Então, como um castelo de areia varrido pela maré, tudo se foi e ela não conseguiu entender o quê havia acontecido. Seu semblante abalado e obscurecido pela dor, encarou a casa em chamas e não chorou mais.

O fogo cessou no meio da madrugada, e Aranel permaneceu sentada na grama, em frente a casa, calada. O silêncio só era reprimido pelo piar das corujas, muito ao longe, e da água do lago batendo contra as casas de madeira. A festança ainda ocorria na cidade, e aquilo só a deixava ainda mais abatida. Uma sombra se curvou sobre ela, e, friamente, a abraçou. Era a sombra de sua angústia, e de seu desespero. Nel se calara por um longo período e não chorava mais, mas sua pele estremecia com o vento gelado, e seus músculos pulsavam uma adrenalina sombria e escusa. Ela estava enlouquecendo por dentro, encoberta por angústia, medo, terror de sua própria sombra e aquilo a deixava febril e paralisada. Estarrecida, puxou as pernas para perto e as abraçou. Um silêncio sepulcral tomou conta da casa, pois estava escura e vazia, porém, as paredes que restaram em pé estavam quentes e cheias de assombros. A luz pálida que vinha das estrelas, e da Foice, acima da Montanha Solitária, encheu aquele local de forma fantasmagórica. Uma atmosfera arredia e consternada, cheia de pavor e medo, se instalou ali e o local ficou amendrontador. O vento uivava através das janelas e trazia consigo o odor podre de tudo que queimou. E aquilo entrava dentro de Aranel como uma faca, e doía, e ela fitava ainda mais o nada; calada e ensandecida.

Então, ela ouviu um piar distante, e olhou para o telhado queimado da casa. Sua visão aguçada observou Sthyrp piar, olhar para ela e sair voando rumo ao sul. Ele sobrevivera ao Fogo Malígno, e se desgarrou daquele lugar, voando para longe, e piou para Nel – despedindo-se. Aquilo fez ela se mexer, e olhou para o céu. A lua estava lá, grande e redonda, coberta de cristal prateado, reluzindo sobre o Mundo como uma moeda de prata. Nel, então, pôs-se de joelhos, ergueu as mãos em súplica, e falou:

— Ai de mim, pedir para que quebre esta Maldição, pois sou amaldiçoada por não me lembrar de nada, e carregar um peso desconhecido e desleal. Ouve-me, Grande Voz da Lua, pois sois tua serva e a ti, imploro: piedade! Diga-me por que tanto sofrimento? Por que sou condenada a essa loucura e desespero? Fiz algo de muito ruim em minha outra vida? Pois não sei nem mesmo a que raça pertenço! Estou em pranto, as pessoas que me amavam se foram, e estou sem lugar neste mundo. Por favor, ajude-me! Peço-lhe ajuda, imploro seu poder. Pois não aguento mais carregar esse peso todos os dias, e todas as noites, e todas as horas dos dias. Não peço, nada além, de me mostrar qual caminho devo seguir. — então, uma lágrima escorreu por sua face aterrorizada e tocou a grama sob seus joelhos.

Lua de Cristal - Ela é do Príncipe - Vol.3 - CONCUÍDOOnde histórias criam vida. Descubra agora