Prólogo

763 69 48
                                    

Meu corpo doía por inteiro. Estava duro, pesado e eu encarei os céus sendo tingidos de um azul claro, bonito. O cheiro era adocicado, uma mistura de hortelã e mel. O sol deslizava pelo firmamento, uma moeda dourada quente lá em cima.

Seria um ótimo dia de verão se eu soubesse quem eu era. Eu estava confusa, e não me lembrava de nada de antes daquilo. Então uma onda de dor percorreu meu corpo, e gemi. Queria gritar se minha boca estivesse maleável, engoli a saliva com dificuldade e fechei os olhos. Ouvi canários cantando, sons estáticos de abelhas, e cavalos relinchando para o sol. Fiquei ali deitada, com uma água veloz e turva batendo contra a ponta dos meus dedos, sentia frio e não vestia nada além de uma blusa e uma calça de malha fina. Meus cabelos estavam desgrenhados e minha pele ardia.

O sol, apino, me fez abrir os olhos. Com muita dificuldade, sentei-me e senti uma dor descomunal percorrer minha coluna e minha cabeça. Parecia que tinha ficado anos sem se levantar, meus ossos estalaram e meu estômago roncou com uma fome terrível. Minhas orelhas estavam doloridas e eu passei a mão nelas, gritando de dor. Doeu muito e senti lágrimas nos olhos. Eu precisava sair do relento. Olhei em volta mais uma vez e do meu lado estava uma espada, encoberta por algumas folhas de salgueiro. Era a coisa mais linda que tinha visto até então. Brilhava sob o sol, prateada e cintilante, simétrica em cima e ponteaguda na parte de baixo. Engastada de letras bonitas e desconhecidas para mim, mas pareciam dizer grande significado. A haste era metálica e prateada. Era mortal, certeza, para algum inimigo em potencial, mas não havia nada ali, exceto as borboletas imperadoras que perambulavam pela grama alta. Então, a peguei e a usei para me erguer.

Finquei a lâmina no chão e me apoiei ali, tentando me levantar. Então gemi com a dor que senti ao me erguer, e me apoiar nas pernas. Suguei o ar com força e tentei mais duas vezes, até que consegui ficar de pé. Olhei para a campina, um rio descia vale abaixo até um rio maior e mais veloz, e sumia na curva sinuosa das árvores. Usei a espada como bengala e andei, lentamente, entre as árvores por um longo tempo.

No começo da noite encontrei uma casa pequena, na beira de um rio. Mais a frente uma cidade se erguia acima de um grande lago, as casas eram de madeira e pontes foram erguidas em todas as direções. A casa era de madeira, o teto era curvo, e havia uma varanda ampla em frente a ela. Da chaminé saía uma fumaça tímida e pálida. Aproximei-me com dificuldades, mancando e sentindo meu corpo reagir com dor a cada movimento.

Um vento gelado soprou e eu espirrei. Funguei e tossi. Meu corpo inteiro se arrepiou e bati na porta com dificuldade. Demorou um pouco antes da porta ser aberta, e dois olhos escuros me olharem. Era uma senhora idosa, rechonchuda e de olhar amigável. Ela tinha os cabelos brancos e usava um casaco de veludo preto sobre os ombros.

— Boa noite. — disse ela — No que posso ajudá-la, minha bela menina?

Eu era bonita? Não! Definitivamente, minha aparência devia ser deplorável.

Espirrei mais uma vez, antes de dizer: — Boa noite. — coçei os olhos — A senhora teria um pouco de pão e água?

A senhora abriu um sorriso bonito. — Ah, pequena menina, está frio e você pode ficar resfriada. Venha. Entre. Vou preparar um banho quente e colocar a sopa para esquentar. — ela me envolveu pelos braços e me colocou dentro de casa.

Olhei em volta. Apesar de ser uma casinha humilde, os móveis eram cuidados e havia uma lareira aconchegante acesa na sala de estar. Ela me olhou e tirou o casaco para me cobrir.

— Meu nome é Ruby. — apresentou-se ela — Como se chama?

— Aranel. — respondi, ainda não acreditando naquilo, e minha voz saiu quase que como um sussurro.

— E de onde você vem? — perguntou ela, curiosa.

Eu franzi. — Não lembro.

— Como assim?

— Minha boa senhora Ruby — falei tentando não parecer uma maluca. —, eu não lembro nem quem eu sou!

🌙

Lua de Cristal - Ela é do Príncipe - Vol.3 - CONCUÍDOOnde histórias criam vida. Descubra agora