2. Lembranças

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  Os três passaram alguns minutos conversando,  falaram sobre a faculdade, a decisão dela de voltar para casa e da saudade por tantos anos distantes.
- Agora eu acho que você deveria subir e descansar um pouco. - disse Olga
- Você tem razão minha irmã,  vá descansar filha, agora teremos muito tempo para matar a saudade. -Nícolas abraçou-a e beijou-lhe o rosto. - Havia mandado-a estudar longe, porque pensara que assim ela entenderia que o seu sentimento por Érick era passageiro. Ela estava entrando na adolescência e era compreensível que se encantasse com um garoto mais velho, com quem convivia e que a tratava com tanto carinho.
- Tá bem. - levantando-se, abraçou novamente o pai e a tia e subiu para seu quarto que Olga fizera questão de manter limpo e arrumado mesmo com sua ausência.
 Em seu quarto, Lisbela sentiu-se voltando no tempo. Tudo continuava igual, a mesma colcha com estampa florida cobria sua cama, entre os três travesseiros havia sido colocado o seu tão querido urso de pelúcia, ele era azul com um laço branco no pescoço. Sua mãe havia comprado aquele urso quando soube que estava grávida e Lisbela sempre o  abraçava à noite antes de dormir, talvez ninguém entendesse, mas para ela, era como se estivesse abraçando a mãe. Quando foi embora pensou em levá-lo, mas desistiu, o lugar dele era aquele, em meio aos seus travesseiros esperando o seu retorno, como sua tia esperara e como, tinha certeza, sua mae também esperaria. Sentando-se na cama abraçou o urso que continuava com o mesmo cheiro suave, o que também devia a Olga que sempre cuidara das suas coisas com tanto carinho, até o quarto tinha o mesmo aroma de jasmim do qual ela tanto sentira falta por todos aqueles anos e por mais que no dormitório da escola e depois no da faculdade, tivesse suas colegas, que lhe ajudavam à suportar a saudade, ainda assim, não houve um só dia em que não desejasse estar de novo em sua casa, com sua família.
 Olhando em volta, para a cortina em um tom suave de rosa, combinando com o da colcha da cama, para o guarda roupas branco, que tinha alguns adesivos colados nas portas, para a pequena mesa com cadeira, que ficava diante da janela e era usada para estudo, Lisbela voltou à lembrar do dia em que chorando muito, saiu do quarto, acompanhada da tia, que também chorava enquato carregava a mala com as roupas da sobrinha e que entregou à Nícolas, antes de abraçar Lisbela e vê-la partir com o pai.   Naquele dia ela não vira Érick, o que não acontecia desde o dia em que cometera o erro de lhe declarar o seu amor, três dias antes.
Um amor tão forte, que nem mesmo os seis anos passados longe dele, foram capazes de fazê-la esquecer. Levantando-se, foi até o banheiro, lavou o rosto e olhou-se no espelho do pequeno armário que ficava sobre a pia."Qual será a reação do Érick quando ele me vir?" Perguntou-se. Não era mais uma garotinha tímida, agora era uma mulher, que continuava tão apaixonada por ele, como quando partira e que voltara disposta à lutar por seu amor. Sorrindo imaginou como Érick estaria, estava ansiosa para vê-lo e se evitara perguntar a tia sobre ele fora porque não queria magoar o pai. Voltando para o quarto seguiu o conselho da tia e deitando-se dormiu algumas horas.

- Mas você não descansou quase nada minha querida. - Reclamou Olga quando a viu entrar na cozinha.
- Eu estou bem tia.
- Está com fome?
- Um pouco, não sabe o quanto eu senti falta do seu tempero. -Disse Lisbela sorrindo.
- Pois hoje você vai compensar todos esses anos longe do meu tempero.
- Mas vamos com calma tia, assim eu vou acabar engordando.
- Minha querida, você está tão bonita que nem mesmo alguns quilinhos à mais fariam diferença, ao contrário,
só lhe deixariam ainda mais linda.
- Não exagere tia. - Disse Lisbela lembrando do quão magra e desengonçada fora na adolescência. O que felizmente mudara, pois da mesma forma que as várias espinhas com as quais sofrera desapareceram, aquela garota desajeitada dera lugar a uma mulher naturalmente sensual e cheia de curvas. - Tia eu quero conversar com a senhora... - Ela parou de falar quando uma mulher morena de estatura mediana e  com um sorriso simpático no rosto entrou na cozinha.
- Filha esta é a Irene, - Falou Olga, - Ela começou a trabalhar conosco depois que a Célia se aposentou. - Explicou.
Célia trabalhava para os pais de Lisbela desde antes do seu nascimento, era uma senhora maravilhosa que ajudou Olga a cuidar da sobrinha e que se aposentara quatro anos depois de Lisbela viajar.
- É um prazer conhecê-la Irene. -Lisbela disse sorrindo.
- O prazer é todo meu senhorita.
- Pode me chamar de Lisbela.
- Lisbela, sua tia falava em você todos os dias.
- E eu pensava nela todos os dias.
- Oh querida! - Disse Olga abraçando-a, - Mas você queria conversar comigo filha?
- Sim tia.
- Irene o frango está no forno.
- Pode deixar que cuido de tudo. - Respondeu Irene.
- Vamos até o escritório.
As duas entraram no escritório de Nícolas e Olga fechou a porta.
- Onde está o meu pai?
- Ele saiu, mas disse que não demora.
- E o Érick tia? - Perguntou ansiosa.
- É sobre ele que você quer conversar. - Afirmou Olga.
- Sim, se não falei antes foi porque não quiz chatear o papai.
- Eu entendo filha, eu também não disse nada sobre ele depois que o seu pai apareceu por esse mesmo motivo.
- E então tia, onde está o Érick, ele está trabalhando como advogado?
- Sim querida e é um ótimo advogado, até hoje ainda não perdeu nenhuma causa.
- Que bom, então ele realizou esse sonho.
- Dele e da mãe. - Falou Olga.
- E ele está trabalando agora?
- Está, mas a noite você vai vê-lo no jantar.
- Isso se ele aparecer! - Observou Lisbela.
- Mas eu tenho quase certeza que ele irá aparecer.
- Será tia?
- Ele ainda não sabe que você está aqui, o seu pai até tentou avisar, mas o celular dele estava desligado. - Disse - Mas tem uma coisa que você precisa saber antes de encontrar com ele...
- O que é tia? - Perguntou Lisbela aflita.
- Faz uma semana que ele ficou noivo. - Olga esperou a reação da sobrinha.
- Com quem ele  vai casar? -Lisbela perguntou em meio ao choque e a dor que aquela notícia lhe causou.
- O nome dela é Carolina, os dois namoram há um ano.
- E por que a senhora nunca me falou nada sobre ela? -Perguntou Lisbela sentindo-se traída.
- Eu nao queria que você sofresse querida, e pela tristeza que estou vendo nos seus olhos, eu fiz o certo. Além disso o próprio Érick me pediu para que eu não te contasse.
- Por quê?
- Ele também não queria te magoar.
- E como ela é? - Perguntou Lisbela tentando parecer indiferente.
- Ela me pareceu ser uma boa moça e está muito apaixonada pelo Érick.
"Claro que está", pensou Lisbela, que mulher não iria amar um homem como Érick.
- E onde eles se conheceram?
- O Érick defendeu o tio dela de uma acusação de assédio, logo após fazer a prova da ordem e conseguiu provar que ele era inocente. E em uma das reuniões com o cliente a Carolina e os pais dela estavam presentes. Após esse breve encontro ela sempre dava um jeito de vê-lo e alguns meses depois ele a convidou para sair...
- Eu vou dar uma volta tia. - Disse Lisbela interrompendo-a, precisava ficar sozinha para colocar seus pensamentos em ordem.
Saindo da casa, percorreu todo o jardim, onde uma enorme variedade de rosas, de cores, tamanhos e aromas diferentes não só embelezavam, como também davam vida a área externa da propiedade. Lisbela esboçou um sorriso melancólico ao pensar nas vezes em que ajudara Olga a plantar as rosas e também a arrancar ervas daninhas e como a tia a ensinara a preparar a terra e a amar as plantas. Até mesmo aquele local da casa a fazia lembrar de Érick, ele não era um amante das flores, mas sempre que Olga pedira ele ajudara as duas. Próximo de onde estavam as rosas, haviam dois bancos de ferro pintados de branco, ao lado de cada um, fora colocado um cisne esculpido em argila, também branco e com o bico vermelho. Quando era criança Lisbela gostava de sentar-se ali e imaginar que as aves éram de verdade. Sentando-se em um dos bancos, seu pensamento voltou para o momento em que confessou para Érick que estava apaixonada por ele.
Ela o abraçara enquanto ele  chorava, seu corpo estremecia em meio ao choro e ela o apertara em seus braços e sussurrara palavras de consolo em seu ouvido.
- Agora eu estou sozinho no mundo. - Dissera ele soluçando.
-cNão é verdade, você tem o papai, a tia Olga e... a mim. -Disse Lisbela. Nesse momento ele a encarou com olhos vermelhos e inchados e sem pensar Lisbela o beijou. Ao sentir seus lábios colados aos de Érick, ela soltou um gemido de puro prazer, mas sua alegria durou pouco, afastando-se dela, Érick a encarou arrependido e muito confuso. - Você enlouqueceu? - Perguntou ele levantando-se e ficando o mais longe possível dela.
- Érick eu... - Lisbela não sabia o que dizer.
- Nós somos irmãos! - Falou ele.
- Eu não sou sua irmã. - Disse ela entre dentes - E desde que eu te conheci...- Ela fez uma pausa, passou as mãos pelos cabelos e encarando-o outra vez, - Eu te amo e não é um amor de irmãos, eu estou apaixonada por você. - Enquanto falava ela viu diferentes emoções atravessarem o rosto dele, dor, confusão, medo e principalmente arrependimento.
- Já chega,c- Imterrompeu-a ele -Eu não devia ter permitido que isso acontessesse, - Ele passou a mão direita nos lábios e olhou-a aterrorizado. - Meu Deus, eu beijei a minha irmã! -Balançando a cabeça atordoado ele saiu correndo da sala.
Aquela  foi a última vez que o viu antes de o pai decidir mandá-la estudar em outro estado.

para  sempre  proibido?Onde histórias criam vida. Descubra agora