VINTE E TRÊS | Perseguição

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A minha ansiedade me fazia quase roer as unhas, mas não cheguei a esse ponto. Mais uma vez havia levantado da cama muito cedo, estava parecendo aquelas pessoas mais velhas que ficam perambulando pela casa de madrugada, era a consequência de se dormir com as galinhas, como dizem. Mas pelo menos me dava a melhor sensação que pudesse ter em relação ao sono, me sentia revigorado, sem olhos pesados e sem cansaço aparente. Era ótimo, pois não iria parecer um morto-vivo quando fosse me encontrar com Cedric. A ficha custou a cair em relação a isso. Quem diria que a minha vida mudaria tanto assim.

Confirmei novamente o endereço, lendo-o pela milésima vez, a garantia de que não iria esquecer caso perdesse o papel. Não foi combinado nenhum hora exata, o que me dava um pouco mais de liberdade nesse sentido, um atraso não seria algo negativo a se acrescentar em um suposto currículo que não teria praticamente nada de relevante, nenhum experiência, nada. Resolvi que apareceria no salão no mesmo horário de ontem, no qual ainda estaria fechado.

Vesti um conjunto de roupas melhor do que o outro, como num instinto para tentar parecer mais sério — apesar de saber que não precisava de tal coisa, Cedric com certeza não se importaria. Percebi que Enrico já não estava no apartamento, por algum motivo decidiu sair mais cedo que da outra vez. Menos mal. Não queria começar o dia com energias ruins, e odiaria ter que encontrá-lo novamente, nós simplesmente não somos compatíveis no mesmo lugar, é algo natural.

Com a certeza de que estava pronto para sair, destranquei a
porta e segui, tendo em mente que isso faria parte de uma nova rotina, se tudo terminasse como o esperado. Dez minutos depois eu estava na esquina do quarteirão, torcendo para que um taxi aparecesse o quanto antes. Para minha sorte, um deles percebeu o meu aceno, e um senhorzinho se mostrou ao volante, com um sorriso amigável. Destravou a porta e em seguida entrei.

— Para onde você quer ir, rapaz? — Perguntou com gentileza. Reparei em seu visual clássico que o deixava meio fofo, à moda de séculos passados. Peguei o endereço no meu bolso, que quase não consegui tirá-lo, e entreguei ao senhor.

— Sabe onde fica? — Ele pegou seus óculos antigos e os pôs no rosto. Ainda assim franziu o cenho para compreender melhor a ortografia. Ao ler, abriu um sorriso.

— Mas é claro! Levo sempre a minha filha naquele lugar, é um dos melhores, segundo ela. Eu mesmo não conheço nada do que fazem. — Afirmou com a sua voz rouca e cansada, logo depois engatinhou a marcha. O carro começou a se mover, o motorista era cuidadoso com o trânsito. — Vejo que não precisa cortar os cabelos e nem poderia, já que eles não atendem a homens pelo que sei, então, o que vai fazer lá, meu jovem? — Estava atencioso ao volante. Eu não queria parecer grosseiro e dizer que não era da conta dele.

— Ah... estou indo para uma entrevista. Se tudo der certo, terei o meu primeiro emprego. — Disse. Ele soltou uma risada empolgante.

— Bom menino! Na sua idade eu já trabalhava que nem um adulto. Juntei dinheiro, casei, consegui construir minha casinha, tive filhos, me aposentei e agora vivo sossegado. — Revelou entusiasmado, antes de tossir umas três vezes.

— E por que o senhor ainda trabalha? Digo, não é cansativo? — Indaguei curioso. Estava interessado na conversa que ele intencionava começar.

— Garoto, depois que você se tornar um velho como eu, vai perceber que, mesmo com toda a sua experiência de vida, sendo boa ou não, sempre lhe faltará algo, um propósito para querer continuar vivendo. Ser taxista me mantém em movimento constante, acordado para o que ainda possa ser proporcionado a mim. É uma forma de estar conectado ao mundo, em vez de estar com o traseiro em uma poltrona empoeirada de frente para uma televisão.

Seu comentário me invadiu de uma maneira inspiradora. Por um momento, me senti mal por saber que muitas pessoas da idade dele são abandonadas a cada dia em algum lugar qualquer, sem receberem atenção nem amor. A sorte a dele ter o que tem, um refúgio. Era o que estava precisando, algo que pudesse me fazer continuar acreditando, algo que me desse um propósito. Esse trabalho me parecia ser o início de alguma coisa maior.

Meu Dono Irresistível (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora