4 - Evelyn

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No vigésimo primeiro andar do luxuoso prédio em que vivia com Fabíola, Evelyn estava muito ansiosa perto do telefone fixo. É claro que o mais óbvio seria que Fabíola ligasse para seu celular, caso o fizesse, mas sabia que, às vezes a bebida leva a pessoa a fazer coisas incompreensíveis. E mais se essa pessoa era Fabíola.

Ela era uma mulher intensamente surpreendente. Evelyn era muito ligada a ela, tinha uma doentia relação de transferência de cuidado e responsabilidade, era quase a mãe de sua própria mãe. Ninguém quer se sentir mãe de sua mãe aos dezessete anos, mas, sua vida era apagar os incêndios provocados por Fabíola e já não fazia ideia desde quando. O telefone fixo tocou e Evelyn atendeu praticamente antes do fim primeiro toque.

— Alô!? — Atendeu aflita.

— Evelyn? Sou eu, seu pai. — A decepção se refletiu em sua expressão ao ouvir a voz de Gustavo.

— Ah, é você? — Indagou sem empolgação e vontade. — O que quer? Não posso ficar ocupando o telefone, estou esperando uma ligação.

— Eu não queria incomodar, só que... senti saudades. Estava observando umas fotos de seu aniversário de dezesseis anos e me lembrei que... faz mais de um ano que não nos vemos. — Gustavo estava nostálgico e lamentoso.

— E desde quando isso te incomoda? Desde que se separou de minha mãe, me convidava apenas nos meus aniversários e sempre acompanhada daquela mulher. E como esse ano, mamãe e eu viajamos...

— Filha, você sabe que nos primeiros tempos, nosso contato foi dificultado por sua mãe. E sempre que eu tentava te convidar para algo, você me dizia que não queria...

— Por causa do que você fez com minha mãe! — Gritou Evelyn. — Eu não podia ficar do seu lado! Eu não podia ficar contra ela.

— Evelyn, o que houve entre sua mãe e eu, diz respeito somente a nós dois. Fabíola nunca devia ter te colocado nessa posição de escolher um lado, eu sempre vou ser seu pai!

— Você ligou para falar mal da minha mãe? Eu já disse que preciso manter o telefone desocupado, depois nos falamos.

— Não liguei para isso, liguei porque senti saudade. E estou te notando preocupada, há algo que eu possa fazer para te ajudar? — Gustavo se preocupou com a filha.

— Não tenho nenhum problema que te importe! — Disse Evelyn. — Tenha uma boa noite.

— Filha, se algum dia você tiver algum problema, qualquer um, não hesite em me ligar.

— Está bem. — Concordou ela mais como uma maneira de terminar aquela incômoda ligação do que cogitando realmente contar com seu pai.

Depois do fim da ligação Evelyn voltou à sua realidade de esperar uma ligação de Fabíola e se preocupar com quem, na verdade, devia se preocupar com ela. Gustavo, por sua vez refletiu sobre a distância, cada vez maior, que sentia da única filha. Em poucos meses, Evelyn completaria dezoito anos e há quatro anos ele mantinha com ela uma relação quase burocrática que provavelmente não mudaria quando Evelyn se tornasse maior de idade.

Gustavo não havia se empenhado muito em mudar aquela realidade nos anos anteriores e Fabíola sempre soube usar bem o poder que tinha sobre Evelyn. Com a fragilidade da Romero Produções, empresa que herdou do pai, e à qual havia se dedicado tanto e que praticamente via ruir, sentiu muita necessidade de recuperar esse elo perdido com Evelyn. Mas como?

Fabíola chegou em casa, madrugada adentro, muito alterada. Evelyn cuidou da mãe e a colocou na cama. Sentiu seu coração apequenar-se ao perceber que Fabíola estava cada vez mais perto de se jogar em um abismo sem volta. Se ela o fizesse... quem cuidaria dela? E o pior: e se ela a levasse junto?

Tom de VingançaOnde histórias criam vida. Descubra agora