Novidade

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— Vamos lá, Caesar.

Marie disse, enquanto estávamos sentados no gramado do quintal de - me obriguei a pensar - nossa casa. Eu fechei os olhos e me concentrei, e senti uma dor latejante neles. A dor não passou rápido.

— Ai...

— Vamos... Você consegue.

Tentei abrir os olhos, mas não consegui. Minhas pálpebras pareciam pesadas. Só consegui abrir os olhos quando a dor e o peso passaram. Receoso, abri-os devagar; minha visão estava embaçada e a claridade incomodava, mas aos poucos fui me habituando. Quando minha vista melhorou, a primeira coisa que notei foi a expressão de surpresa de Marie.

— O que foi? — Perguntei, apreensivo. Algo havia dado errado?

— Caesar, você é um gato! Caramba — Ela riu — Seus olhos estão como os meus. Quer dizer, como os nossos, humanos. E estão azuis.

Ela me emprestou seu celular, com a câmera frontal ativada. Ao observar minha imagem refletida na tela, inclinei minha cabeça para o lado de forma inconsciente, expressando um pouco de confusão, e pisquei. Aqueles eram mesmo meus olhos? As escleras eram brancas, com pequenos capilares por elas; as pupilas eram negras, pequenas, assim como as íris, que eram de um tom de azul que lembrava o mar. Eu parecia completamente humano.

— Acho que consigo manter.

— Perfeito. Essa sua habilidade é o máximo, sabia? 

Eu ri.

— Oi, meninos — Adele apareceu na porta com um pano de prato nas mãos — O que estão fazendo?

— Testando os poderes do Caesar — Marie respondeu a mãe — Olha só isso, mãe!

— Não são exatamente pode...

— Caesar! Seus olhos! 

Dei um sorriso sem jeito.

— Você parece um ser humano perfeito. Está incrível! — Ela sorriu para mim de um jeito maternal que me fez sentir saudades da minha mãe. — Não vai precisar mais usar óculos escuros o tempo inteiro e vai poder aproveitar a Terra conosco, finalmente. 

— E sair à noite — Marie acrescentou.

— Vou voltar a preparar o almoço, meninos. Continue cuidando dele, Marie!

Eu e Marie estávamos a me "testar" porque em breve eu iria para a escola. A ideia de escola nunca havia me agradado, mesmo em Nawos, porque eu adorava aprender as coisas experimentando e lendo, não sentado em uma sala por incontáveis horas. Mas dessa vez, era diferente; mesmo que Adele e Colin não me obrigassem a frequentar uma escola, eu gostaria de ter essa experiência. Já que teria que passar um tempo na Terra, queria fazer o que outros seres humanos fazem, aprender tudo o que os seres humanos aprendem.

Adele e Colin já haviam dado um jeito em tudo que eu precisava para frequentar uma escola, e eu não sabia como, mas havia ganho documentos; e aparentemente, meu nome terráqueo era "Caesar Korander [meu nome de família em Nawos] Wright". Eu era um Wright agora. Marie, Paul e eu passaríamos a frequentar uma escola de grande porte no Queens. Eu e ela no segundo ano do Ensino Médio, e seu irmão, no terceiro. Mas ainda teríamos mais tempo para que eu me habituasse, até lá. Na medida em que as semanas passavam, eu aprendia cada vez mais coisas; o significado de algumas palavras complexas, leis da Física, Química Orgânica, revistas em quadrinhos, videogame, baseball, culinária. 

Mas só uma coisa não mudava: a antipatia de Peter por mim. 

Já fazia algum tempo que ele quase não parava em casa e evitava se reunir com sua própria família, principalmente quando eu estava por perto. Família era algo que não tinha diferença entre a Terra e Nawos; nos dois lugares ela era algo de suma importância e não era bom que as pessoas vivessem afastadas. Mas eu estava causando isso em uma família que havia me acolhido, mesmo que minha presença - e minha existência - contrariasse toda a sua lógica.

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