Eu não conseguia tirar aquilo da cabeça: Você sabe que a Zoe está apaixonada por você, não sabe?
Mas tocar no assunto agora que estávamos de boa seria o equivalente a pisar com galochas enlameadas no chão que acabei de encerar.
Essa era uma parte da conversa que eu deixara de fora quando contei a Zoe.
Depois da bomba que Candice jogou em mim, eu discuti. Disse que era loucura. Mas era mesmo?
Não me permitiria encanar com isso. Decidi jogar aquele pedaço da conversa com Candice para Alderaan, um segundo antes de Darth Vader explodir o planeta com a Estrela da Morte, assim, levando aquela dúvida com ele.
E eu de fato apenas curti o dia com minha melhor amiga, sem me preocupar com coisas complicadas como sentimentos que poderiam ou não existir.
Confesso que não deixei o assunto completamente quieto. Tomando meu chá de manhã com Zoe, no sábado de manhã, me lembrei do dia em que esbarrara nela de modo que ficamos os dois molhados.
Lembrei-me do desconforto estampado em seu rosto quando levantei a camisa para ver as consequências provenientes de água quente em contato com a pele.
Não fui tão inocente ao andar pela casa com o torso exposto. Só queria me provar que estava sendo paranóico e que Candice estava imaginando coisas. Autossabotagem ou vingança, ponderara ela antes de me dizer aquilo. Mas… vingança pelo quê?
Acontece que a reação de Zoe foi estranha. Fora Maggie quem zombou de mim enquanto minha amiga claramente fingia um ataque de tosse. Zoe quase nunca perdia uma chance de fazer piadas que normalmente me deixariam constrangido, mas não com ela, por que era nosso lance.
Me obriguei a parar de me achar tanto. Muito presunçoso da minha parte presumir que meu corpo no máximo razoável lhe causaria reações.
E aí começou a aula sobre tortas. E era muito interessante. Não havia dúvidas do porquê Maggie era uma chef tão disputada pelos restaurantes.
Nossa torta era doce, meio fora do meu elemento, mas Zoe dominava mais a “arte do açúcar”. Seu suco no café da manhã era prova disso. Ou qualquer coisa que ingeria. Me admirava que ela não comesse bife com mel. Eu é que não lhe daria ideias.
A bruxa de João e Maria não encontraria sua casa-armadilha se Zoe passasse por ela perdida na floresta.
- Está muito doce? - perguntei sobre a geleia. Ela experimentou.
- Pra mim é como se nem tivesse sido adoçado.
Não esperei ela terminar e a cortei.
- Nesse caso está no ponto - provoquei, desligando o fogo.
Ela mostrou a língua.
- Você sabe, né, que eu faço doces ótimos porque não sou autocentrada e acho que meus gostos são universais? Ou não sabia?
Senti a alfinetada. Eu merecia. Ainda mais depois de quase matá-la de frio com as mãos congeladas - pelo gelo que ela mesmo colocara em minha roupa, me lembrei.
Pra quem dizia gostar do frio, ela se arrepiava muito fácil.
- Não é autocentrada, mas tampouco modesta, huh?
De qualquer forma, Maggie elogiou nossa torta, assim como as criações de todos ali, e depois que fechou a porta da frente para a última pessoa que havia vindo pela aula, nos deu uma bronca por nos sujarmos tanto.
Jantamos todos os cinco. Depois de um bom banho, sem dúvida.
Tyler havia comido quase todos os biscoitos do pote de cerâmica em forma de ursinho. Zoe e eu sem perceber esticamos a mão ao mesmo tempo para pegar o último.
- Vá em frente - disse ela, recolhendo a mão.
- Você está precisando. - Repeti o gesto. Achei ter visto Tyler revirar os olhos.
- Você também - insistiu ela.
Eu estava sim, triste por Candice. Mas não achava que as coisas poderiam ter acabado diferente. Não terem acabado. Porque talvez não se pudesse mesmo ter tudo.
Eu gostava de Candice, mas me via pensando na vez em que fomos ao restaurante italiano e ela ficou brava pelas piadas que eu fazia, como a pergunta com trocadilho ao garçom: “Mas você diria que este trabalho é… maçante?” Quase podia ouvi-la pedir: “Um, Alex, mas sem as gracinhas durante as refeições, por favor”.
- Aqui. - Peguei o cookie com gotas de chocolate, dividi ao meio e entreguei a ela.
Chloe e Maggie estavam apreciando suas taças de vinho branco, indiferentes ao Impasse do Cookie.
Acabamos dando-o para Tyler após apenas uma mordida, no entanto. Ele realmente amava biscoitos.
Maggie bocejou do outro lado da mesa, criando efeito dominó.
- Façam-me o favor e durmam na cama essa noite - falou ela, se levantando e pegando a mão de Tyler. - É pra isso que foram inventadas.
Minhas costas estavam mesmo doendo de passar a noite no chão. Coloquei a mão na base da coluna instintivamente.
Zoe tirou os óculos e apoiou a cabeça nos braços dobrados.
- Vamos. - Puxei seu braço delicadamente. Ela resmungou, mas subiu as escadas.
Do quarto ao lado, ouvimos Chloe sussurrar sobre preocupações com o trabalho e Maggie começar uma canção de ninar em espanhol.
Olhei para Zoe, que mais uma vez bocejava, os óculos pendurados nos dedos da mão direita que pendia ao lado do corpo de pijama.
E tive que perguntar:
- Você não gosta de mim, gosta? - Não sabia se minha voz tinha transparecido o quanto eu me sentia nervoso.
Zoe me olhou tão surpresa quanto olharia pela janela se acordasse e descobrisse que estava em Marte.
- Q-quê? - gaguejou. - Não. O quê? - continuou, apertando os olhos com o indicador e o polegar. - Vamos dormir.
A segui para dentro do quarto, onde uma única cama de casal se encontrava e a encaramos. Eu estava pronto pra me acomodar ali do lado no chão mesmo. Quem sabe com alguns edredons e cobertores. Um colchão inflável.
Zoe me viu por a mão nas costas e se deitou. Com um suspiro, foi para o lado. Não usou palavras, mas me dera permissão para deitar ao seu lado no colchão macio.
"Não." Fora essa sua resposta. Eu queria que tivesse sido sim? Eu queria que Zoe estivesse apaixonada por mim?
Talvez eu quisesse…
Ela se virou na cama e acabou com a cabeça apoiada no meu peito. Algo se agitou dentro de mim e eu soube que estava ferrado.
- Droga.
Não; não talvez.
Eu tinha total certeza de que queria que ela tivesse dito sim. Porque minha resposta teria sido essa se ela me perguntasse exatamente a mesma coisa.
Porque, droga, eu estava apaixonado por ela.
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Nós Podemos Ter Tudo
RomanceZoe era boa em manter promessas. Como quando sua mãe disse que ela deveria voltar até as 22h na primeira vez que foi a um show, e 21h59 ela estava girando a chave na porta. Ou quando sua irmã pediu que ela guardasse o que era o maior segredo dela n...