Apenas Cinco

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Já tentou cobrir um machucado com maquiagem? Bem, se não, eu conto como é.

A pele vermelha parece tomar um brilho solar sobre a cobertura da base costumeira. Nada pode esconder isso certo? Não é apenas um corte no lado esquerdo próximo ao olho, ou o outro corte na boca. Droga!

Nada vai cobrir isso.

Apanhei o casaco e a bolsa. Tinha algo a fazer antes de ir ao trabalho e tinha remoído isso a noite inteira em como não ceder.

Desci as escadas e por sorte ele estava lá. Ao lado dela. Na sala de TV que sempre ficava desligada por que ele não suporta o barulho. Deixei a bolsa próxima a porta, e fui até ele. Sentei bem a sua frente. Tremia inteira, mas não voltaria atrás.

-Está orgulhoso? - Ele me olhou baixando o jornal. Minha mãe deixando o tricô de lado quase estava da cor de poltrona. Um vermelho tão intenso quanto sangue.

-O que disse? - Papai inqueriu.

-Está orgulhoso do que fez comigo?

-Escute aqui sua fedelha...

-Escute você. - Rebati. - Vem nos humilhando e pisando a vida inteira. Nunca soube ser um pai e talvez nunca vá saber. Mas João, eu tenho um aviso. Encoste em mim mais uma vez, apenas mais uma e esquecerei que é meu pai e o faria apodrecer em uma prisão.

-Clen. - Mamãe pediu.

-Tudo só acontece por um motivo. Não sei qual é o seu pai, mas ser amargo e cruel não vai mudar nada. Está avisado. As coisas vão mudar.

Levantei e quase corri até a porta. Peguei a bolsa e antes que a primeira lágrima despencasse fechei a porta atrás de mim.

A incompreensão dos fatos é sempre o pior. Não saber os motivos para que as pessoas façam o que fazem. Enxuguei os olhos e desci os degraus da varanda. Eu ia...

Ia mesmo pegar a bicicleta, mas pior do que enfrentar o meu pai era o olhar de morte de Matt. Encostado no carro preto ele olhou pra mim com tanta determinação que mal cabia em mim a compreensão de que alguém pudesse ter esse olhar.

Engoli em seco quando ele começou a vir até onde eu estava. Não importava o que acontecesse, eu não podia deixa-lo entrar.

-Matt. - Fiquei a sua frente.

-Vai defendê-lo?

-Não! - Segurei seu rosto que tentava me deixar de lado. Ter alguém que defenda você é além de uma prova de amor. Só pessoas boas realmente se importam com o que o outro passa. Eu já sabia que Matt era assim mesmo antes de realmente conhece-lo. - Não vai valer a pena e eu já resolvi isso. - Falei depressa.

-Me deixe passar Clen.

-Matt, por favor! - Tentei e ele também. Segurou firme meus braços, me fazendo sair do caminho. - Ai! - Gemi. Ele é grande demais pra mim.

-Machuquei você? Está ferida?

-Meu amor, por favor, vamos sair daqui e só conversar em outro lugar.

-O que disse? - Pisquei confusa. Tinha passado dos limites?

-Por favor. Não faça isso. Vem comigo. Converso com você em outro lugar.

-Entre no carro. - Não era um pedido. Segurei sua mão e ele me levou de volta para o carro.

Sentei ali e suspirei aliviada quando ele também sentou do meu lado. Eu tinha conseguido convencê-lo a vir comigo, só ainda não sabia o que iria dizer.

Uma Gota de Sangue - Ruth CostaOnde histórias criam vida. Descubra agora