Apenas Dezoito

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Que tudo passe

Passe a noite

Passe a peste

Passe o verão

Passe o inverno

Passe a guerra

E passe a paz

Passe o que nasce

Passe o que nem

Passe o que faz

Passe o que faz-se

Que tudo passe

E passe muito bem

O poeta Leminsk estava em minha cabeça feito LP arranhado. Uma falha, um vaco no escuro. O barulho estrondoso da morte ainda berrava em meus ouvidos mesmo quando consegui abrir os olhos. A própria pólvora ainda parecia ter cor e se misturar com tudo ao redor. E ele sorria.

Sorria pra mim com tremenda pretensão que fazia querer desarma-lo e ser eu a próxima a estourar um tiro a dez centímetros do rosto dele.

Levantei atordoada e comecei a vasculhar a minha saída daquele inferno. Inconsciente quanto às coisas ao meu redor, eu apenas lutava contra o choro desmedido e a mente nublada. Esse sem dúvida era um jogo em que - sempre - sairia perdedora. Não me sentia pronta para ganhar sobre a vida de alguém, mesmo que agora cogitasse centenas de milhares de maneira de matar um dos caras que considerava meu melhor amigo.

-Ok! - Adam surgiu a minha frente do nada, ou vai ver me seguirá de perto e eu nem senti. - Fui longe demais.

-Longe? Longe demais? - O ódio subindo pela minha espinha e se espalhando em meus braços e pernas. Eu enxergava tudo em vermelho, deixando apenas o rosto dele em foco. Serrei a mão sobre a arma que eu carregava ciente de que aquilo me ajudaria de alguma forma. Há puxei com força e antes que pudesse pensar aceitei o rosto dele com uma coronhada.

Foi à vez de ficar no chão. Estávamos longe de nos igualar, mas eu sabia que não conseguiria fazer muito mais que aquilo com todo o atordoamento que me cercava. Cai ao lado dele que gemia de dor e me permiti respirar. Fechei os olhos e enterrei o rosto nas mãos.

Algum tempo depois senti a cabeça dele em meu colo e pisquei sem acreditar naquilo. Olhei para o rosto sínico de Adam que apesar de sangrar pelo nariz sorria pra mim.

-Quer que eu peça desculpas? - Ele perguntou.

-Atirou em mim Adam. Você atirou na minha cabeça. Isso não tem perdão, e sem dúvida um pedido de desculpas não basta.

-Luna, se eu quisesse mata-la já teria feito isso muito antes. Fala sério! Quantas vezes já dormiu na minha cama e eu mesmo protegi você.

-Protegeu de que? De si mesmo?

-Não seja dramática.

-Seu filho de uma cadela, você atirou em mim e não quer que eu seja dramática.

-Em primeiro lugar, sim ela é uma cadela escrota que me deixou, mas eu me sentiria muito melhor se você não falasse daquela vaca! - Exclamou. Limpei sangue dele que já escorria até a boca. - Em segundo lugar, são dois tiros Luna. Se quer matar alguém de verdade é de praxe que o primeiro tiro sirva para imobilizar o inimigo e o segundo sempre na cabeça para garantir que o cara não se levante nunca mais.

-Fala como se já tivesse feio isso Adam.

-E quem disse que não?

-Já ma... Você já matou alguém?

-Você quer a resposta pra isso? - Sim! Não! Puta merda!

-E queria fazer isso comigo? - Ele me olhou com algo indecifrável nos olhos me fazendo tremer outra vez.

-Fica calma, ainda não chegou seu dia.

-E quando chegar, será pelas suas mãos Adam?

-Eu gostaria de morrer pelas suas mãos. - Brincou rindo pra mim.

-Lamento desaponta-lo, mas isso nunca vai acontecer.

-Vai mesmo voltar com ele? - Suspirei.

-Não disse a você que vou voltar com ele Adam, nem muito menos quero vê-lo depois de ontem. Mas quanto ao fato de continuar fazendo sexo com você essa é a verdade. Não vamos mais transar. Não precisamos disso eu e você, sei que não gosta e pouco me importo com isso, mas eu gosto de você e não quero perder um amigo porque simplesmente nossa foda não dá mais certo.

-Dá certo. - Ele interveio.

-Está realmente pedindo pra continuarmos?

-Esse "rompimento" significa que vou ter que me afastar e que seremos estranhos?

-Não. - Eu afirmei. - Só significa que não vamos mais transar.

-Ainda posso ver você nua?

-Claro, pode até comprar calcinhas comigo, amiga. - Dei um meio sorriso.

-Bem melhor assim. Você ficou hilária com aqueles olhos de terror.

-Quer levar outra coronhada?

-Você é tão quente querida.

-Eu odeio você sabia?

-Bem, isso quer dizer que consegui fazer você aprender alguma coisa, certo?

Uma Gota de Sangue - Ruth CostaOnde histórias criam vida. Descubra agora