Capítulo XVII

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Havia dor. E havia agonia.

Meu coração batia descontrolado, fazendo meu peito doer.

Tudo estava escuro, meu cérebro forçava meus olhos, querendo enxergar, mas a escuridão era intransponível. Estava frio. A dor me envolveu novamente, mas meu corpo não reagiu. A agonia parecia perfurar meu peito, envolver meus músculos, afundar meus ossos e confundir minha mente.

— Atalya! — Uma voz, de muito longe, clamou meu nome.

Tentei encontrar meus lábios para pedir ajuda. Nada. Tudo parecia desconectado ou fraco. Meu corpo se retorceu em um espasmo. Meu peito se ergueu. Doía.

Toque frio na minha pele, que agora parecia mais grossa e pesada.

— Torturem-na até que ela entregue seus comparsas.

Não era a mesma voz que disse meu nome. Era uma mais fria, mais familiar e ressoava como uma lembrança.

­— Você é uma aberração, seu erro foi nascer! ­— a voz feminina acusou-me.

Dor. Agonia. Frio. Outro espasmo. Afundei mais nas águas escuras e turbulentas. Era real? Ou invenção da minha cabeça? Uma fogueira acendeu-se em meu coração, consumindo-o. O restante do meu corpo continuou padecendo em friagem.

Poderá levar a vitória ou a destruição, tudo depende das suas escolhas ­— ecoou outra voz, velha, feminina e sábia.

Meu corpo foi eletrocutado, meu peito se elevou, meus músculos voltaram a responder meus comandos. Em uma péssima hora. Meus olhos enfim abriram e um arfar de dor escapou pelos lábios. Algo pesado imobilizou meus braços e um rosto familiar flutuou acima de mim, preocupado. Eu queria pedir para que ele tirasse aquelas sensações ruins de dentro de mim.

Minhas costas se curvaram, minhas mãos crisparam-se e eu gritei. O rosto virou-se, para além do meu campo de visão e ordenou algo que eu, perdida em agonia, não consegui compreender. Senti uma pontada de dor na altura da coxa e uma dormência se espalhar dali para o restante do meu corpo. A dor, a agonia e o frio foram me deixando, a fogueira do meu coração foi diminuindo até tornar-se apenas um fogo cálido. A paz foi se instalando dentro de mim e lambendo tudo de ruim.

— Kelenius — suspirei, nomeando o rosto familiar.

Deixei que a inconsciência pacífica me levasse.


A quinta estátua se desfez em um milhão de cacos e espalhou-se pelo chão polido do castelo. Um ódio sem precedentes corria pelas veias de Rogath. Os seus planos não estavam saindo como ele esperava. A quimera, que ele pensava ter em suas mãos, escapou e o traiu. Markus e a família estavam todos vivos e também deram um jeito de fugir, graças ao príncipe. Em um último assomo de desespero, possuiu a quimera na tentativa de limitá-la física e psicologicamente, quem sabe até matá-la, mas foi repelido.

Visualizou novamente em sua mente o rosto que surgiu diante dos olhos da quimera. Não o conhecia. Devido a todo o tormento, a consciência de Atalya não registrou o local onde estava. O que mais o incomodava foram os sentimentos que leu nela quando fitou o homem desconhecido. Havia estima. Uma miríade de sentimentos confusos, raiva, carinho, frustração, simpatia e vários outros que deixaram Rogath em fúria. Seu único alívio era que não existia amor. Pelo menos não o que ele sabia e pensava ser amor.

Como a quimera ousou se envolver com alguém? Atalya pertencia a Rogath. Era sua rainha. Mesmo que fosse apenas emocional, ela não podia amar ninguém. Seu coração e sua alma não podiam pertencer a mais ninguém.

Rogath via todos os seus planos desmoronarem como um castelo de cartas. Ainda tinha a coroa, mas ela não era sua oficialmente. A ideia de se considerar um usurpador o enjoava. Ele não era um simples ladrão de cargo. Markus e seu filho deveriam morrer para que a coroa pertencesse de verdade a Rogath. Sentia tudo o que merecia ser seu escapar-lhe. Não podia deixar isso acontecer.

As Crônicas de Ravena - A Ascensão da QuimeraOnde histórias criam vida. Descubra agora