30. Contato de outras vidas

317 31 6
                                    


 Como esperado, não havia mais ninguém na empresa além de nós três. Mokuba abriu um bocejo enorme enquanto tomava seu último gole de café, o que me fez lembrar de uma coisa.

- E o café da tarde de vocês, como foi?

- Ótimo.

- Tem certeza?

Seto não respondeu, apenas continuou a imprimir seus papéis como se nada tivesse acontecido. Eu já esperava por isso e comecei a tirar uma garrafa térmica e alguns pacotes com pãezinhos e patês. Mokuba chegou mais perto por conta própria e eu me aproximei do meu namorado com um croissant.

- Olha o aviãozi...

Ele abocanhou metade de uma vez e nem precisei insistir.

- Seto, qual foi a sua última refeição?

- O café da manhã. – percebi a contrariedade em sua voz por saber que levaria um sermão, no entanto acabou com a outra metade do pão em segundos.

- Pelo tamanho da sua fome eu já suspeitava. – olhei para o Mokuba, que estava no mesmo barco – E você também, não é, senhor Mokuba?

- Eu deixo o sermão para o Seto.

- Você se salvou dessa vez porque admitiu a sua fome. No entanto... – voltei a encarar o Seto, que roubou uma mordida do meu pão e continuou trabalhando como se nada tivesse acontecido – Esse rapazinho aqui vai entrar em uma rígida política de alimentação.

- Eu ficaria feliz se vocês parassem com a conversa de comadre e compadre e trabalhassem um pouco também.

- Mas é claro, senhor Kaiba. – respondi e não segurei um sorrisinho ao ver a cara feia dele.

- Vou cobrar por essa afronta mais tarde, senhorita Kamisawa.

Ao ver seu sorriso vitorioso, comecei a trabalhar levando os relatórios para seus devidos departamentos e depois trabalhando na programação inicial dos hologramas das cartas.

- Vamos indo, Luka.

- Já? Que horas são?

- Dez e meia.

- Uau, a hora passou rápido.

Deixei para o dia seguinte justamente a programação dos Dragões Brancos. Mokuba voltou de carro e Seto e eu fomos de moto. Contrariado por não ter podido recompensar o jantar, ele acabou dando uma volta maior pela cidade antes de chegarmos em casa.

Tomei um banho e caí na cama, exausta. No entanto, no meio da noite, senti a presença de alguém no quarto. Abri os olhos preguiçosamente e me deparei com uma garota de cabelos longos brancos em pé, olhando para mim. Imediatamente a reconheci como sendo meu outro "eu".

- Kisara?

Ela assentiu.

- Olá, Luka. Acho que temos muitos assuntos para colocar em dia.

- Imagino que sim.

- Primeiro quero agradecer por ter me ensinado tanta coisa desde quando nos conectamos. Nunca imaginei ser capaz de ver e aprender sobre o mundo como ele é hoje. E também, obrigada por estar me suportando durante todos esses anos. – seu olhar mudou para tristeza – Lamento tanto por estar te causando todo esse sofrimento, eu queria ser capaz de te deixar livre disso, mas... Enquanto ele não superar a dependência pelo Olhos Azuis... Não posso fazer nada.

Kisara começou a chorar e infelizmente não fui capaz de abraça-la como conforto.

- Você não tem que se desculpar, sabe. – comecei, me aproximando dela com o colar em mãos – Sei que sua função é estar junto com o Alto Sacerdote, que, por sinal, é uma pessoa importante para nós duas agora. Devemos acreditar no Seto.

- Já ouvi tanto essa frase... Luka, você acha que ele vai conseguir nos salvar? Quer dizer, te salvar desse sofrimento e me libertar?

- Seto pode ser cético e racional demais, mas para tudo tem um jeito. E eu confio nele.

Ela enxugou as lágrimas, parecendo um pouco mais confortada com a minha confiança.

- Kisara, posso te fazer uma pergunta?

- Claro.

- Sobre o que você e Atem conversavam?

- Sobre... Um jeito de convencer Seto Kaiba a acreditar em tudo isso.

Senti uma pontada de hesitação em sua voz, como se algo muito maior estivesse sendo omitido de mim. No entanto, fingi acreditar para não atormentá-la mais e acabei mudando de assunto e a deixei um pouco mais animada.

O sono tomou conta de mim e ia adormecer outra vez, se não fosse por ouvir a porta do quarto se abrindo e um certo Seto Kaiba se deitando ao meu lado, com olheiras profundas de cansaço extremo.

- Você ainda não foi dormir?

- Estou indo agora.

- Acho que errou o quarto.

- Não, não errei. Sua punição por me chamar de "senhor Kaiba" é ceder um pedaço da cama para mim.

Ele se aninhou nas cobertas e caiu no sono no mesmo instante. Ao lado da cama, uma luz branca tomou novamente a forma da Kisara, que abriu um pequeno sorriso antes de desaparecer.

Querido Olhos AzuisOnde histórias criam vida. Descubra agora