Capítulo 13

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Sua cabeça ainda doía, seu corpo pesava e jurava que estava queimando por dentro. Seus olhos se levantaram e encontraram as lagoas azuis da única pessoa que a morena se permitiu direcionar um sorriso, foi involuntário, sem arrependimentos. Nefera a pegou e colocou em seu colo, suas mãos agora repousavam em cada lado de sua face, a encarava com admiração e certa urgência, Arquia sentiu o desejo antes mesmo da outra começar a se aproximar, e quando colocou sua mão na cintura dela já sabia que também queria isso. Queria experimentar novamente a doçura dos lábios macios e carnudos da mulher que lhe hipnotizava com um olhar.


E esse poderia ter sido o final feliz perfeito de uma história infantil qualquer, mas a voz que irrompeu pelos presentes naquele local verde com árvores distantes, atravessando os ouvidos de todos e cravando-se no crânio de Arquia acabava com essa fantasia.

- ...minha discípula - ele sorria sem mostrar os dentes, os braços atrás das costas, usava as vestes de sempre, bata branca, uma faixa vermelha no meio e um terço dourado de puro ouro envolta do pescoço com um cruz no final. Desde que o conhecera ele sempre estivera com as mesmas roupas e o mesmo sorriso sem felicidade no rosto.

O encarava. Suas mãos se fecharam em punho no chão, pela primeira vez estava hesitando. A algumas horas atrás teria se levantado mancando e o seguido sem falar nada. E agora? Agora ela tinha acabo de voltar dos mortos. E acordar nos braços de Nefera a vez perceber que não havia outro lugar em que queria estar. Mas estava com medo, não pelo que poderia acontecer a si mesma. Estava com medo do que poderia acontecer a outra caso se negasse a ir. Seu mestre era inteligente e com certeza após ver essa cena ele já deveria ter algumas ideias. Ela confortável no calor de um estranho. Suspirou. Quando estava prestes a se levantar braços a envolveram e a apertaram contra si. A loira a abraçava como se pudesse a proteger de qualquer coisa.

- Você não vai leva-la a lugar algum! - Sua voz trovejava, seus olhos brilhavam com determinação, ela pegou a espada caída no chão e estava pronta para usar.

- Está se opondo contra a Igreja, protegida do Comandante Joshua?! - A morena sabia o cenário que se desenrolaria no momento que Augustos esboçou um sorriso que não chegava a seus olhos.

Perderia a única pessoa que algum dia conseguiu amar, que a conquistou sem ela perceber, lhe encantou com sua bondade, mesmo sendo algo estranho e errado no seu mundo antigo. Sim antigo. Pois Nefera era seu Novo Mundo cheio de possibilidades. Com a outra ao seu lado ela se imaginava sendo e fazendo qualquer coisa. Se deixasse a loira continuar, no final daquela estória estaria ajoelhada perante o assassino da sua amada e veria suas lágrimas rolarem por sua face enquanto sua alma chora em silencio. Segurou a mão dela que empulhava a espada, seus olhares se cruzaram, enquanto encarava uma a outra houve uma conversa sem palavras. Medo e desespero passaram por seus rostos.

- Não... - a loira falou em um sussurro - Por favor não - Arquia não sabia o que dizer além do que saiu da sua boca:

- Sinto muito... - A Igreja protegia Augustos, e a Aliança dos Reinos recém-formada não seria abalada por um discípulo qualquer. Sacrifícios seriam feitos se necessário para vencer aquela guerra.

Começou a se levantar, saindo dos braços da outra que claramente não queria que aquilo acontecesse. Quando finalmente estava de pé, sentiu todo o peso do seu corpo, sua vista ainda estava embaçada, e estava arfando. No momento que viu que poderia caminhar sem cair, deu o primeiro passo, então um vulto surgiu a sua frente, cambaleou para trás, levantou os olhos se firmando em seus próprios pés. Arfou. Lábios entre abertos e sobrancelhas levantadas, Arquia estava surpresa com a pessoa entre ela e seu mestre. O Comandante do Exército de Cinéreo. Joshua.

- Você não vai leva-la! - Quando sua voz saiu tinha a calma de um felino. Usava sua armadura de combate. Prateada e com o símbolo do reino de Cinéreo, sua espada de folha larga descansava nas costas.

- Como assim? - a voz do seu Mestre saiu estridente. Augustos apertou os olhos em questionamento, sem sorrisos dessa vez. Apenas o seu desgosto claro.

- Você claramente tinha uma ferramenta bem valiosa na manga, bem escondida, que poderia ter sido útil em situações anteriores, mas nada sobre ela foi dito a Aliança - o moreno levantou a mão impedindo o homem de falar e continuo - O acordo era: Disponibilizar todas as informações sobre como lidar com o nosso inimigo em comum, e qualquer arma que poderia ser usada contra ele - Joshua apontou para Arquia sem tirar os olhos do homem a sua frente - Ela vira comigo, e a Aliança terá conhecimento dessa situação e decidirão o que será feito.

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Estava sentado na caverna, suas sombras cobria toda as extremidades do local, o que antes tinha sido uma caverna de jade, paredes verdes, cheias do brilho do sol e a noite o da lua, agora era um breu. E só ele. O senhor das Trevas. E seus filhos conseguiam enxergar bem naquela escuridão.

Seus olhos estavam fechados, mas aquilo não queria dizer que ele estava dormindo. Já tinha dormido por tempo suficiente. Ele gastara seu tempo ali observando. Pelos olhos de seus filhos. Sabia tudo que acontecia a sua volta, naquela montanha em que estava, na montanha que ficava à esquerda e a outra a direita daquela. E não foi diferente quando dois de seus filhos foram ceifados desse mundo. Viu tudo, quem havia quebrado o fio de vida de dois de seus Generais. Um daqueles que o havia aprisionado ainda caminhava naquela terra. E alguém ainda mais surpreendente respirava. Abriu os olhos, um dos braços apoiado no joelho.

- Entendendo... - sussurrou para si mesmo.

Levantou limpando uma poeira imaginaria em suas calças, então começou a caminhar para fora da caverna. A capa atrás de si arrastando no chão. E quando já estava no corredor de pedras sem brilho, escurecidas por suas sombras, indo em direção ao exército de crools que lhe esperava e que só aumentava a cada dia que passava. Falou enquanto um pequeno sorriso distorcia suas feições até agora sem expressão, na de um mostro sanguinário:

- Que comesse. Você estando preparada ou não!

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Correntes prendiam seus pulsos, tornozelos, pescoço e tronco no chão de mármore em tom azul-céu, as correntes eram extensões do mármore no chão, mesma cor mesmo material, quentes, reconfortantes, era nostálgico, como o calor que uma mãe emana quando coloca seu bebê para dormir nos braços. Tentava se soltar, as correntes se apertaram, mas indolor, quando tentou de novo as correntes foram substituídas por sombras que lhe puxavam como se fossem parti-la ao meio, o chão tinha escurecido. Assim que olhou novamente para baixo, a sombras a estavam engolindo-a e puxando cada vez mais para o que agora era um lago negro.

Já estavam subindo pelo seu pescoço em direção a sua cabeça. Então sentiu um calor em seu rosto, e bem a sua frente um ser se formou, feito apenas de chamas azuis. Suas chamas. Sem expressões. E antes que ela pudesse perguntar o ser falou:

- Eu sou você - era calma, mas potente e afiada. E com essas palavras tudo voltou ao normal, embora agora não houvesse correntes - Nunca me negue, nunca nós negue! - no momento em que sua mão saiu da face da morena ela caiu e mergulhou no céu azul acordando em uma cama desconhecida.

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Encarou o teto da tenda, ela sabia pela posição diferente da cama e principalmente pela cor da tenda, que era um vermelho vivo. Estava confusa quando tudo voltou como uma onda. Joshua tinha se envolvido e enfrentado Augustus, não sabia os motivos e não queria, não quando aquele que ela chamava de mestre foi embora com um olhar que prometia sangue. O mais importante ele foi embora. Não sabia por quanto tempo teria aquela liberdade. Respirou fundo. Pela primeira vez em anos ela se sentia viva, seus músculos relaxaram e um sorriso se formou em seus lábios conforme se sentava na cama. Fez uma careta pela pontada de dor que se espalhou pelo corpo.

- Deixa eu te ajudar - aquela voz carregada de doçura a tingiu no peito, o aroma floral a envolveu, e quando finalmente olhou para a loira ela não sabia o que dizer. Tinha medo de abrir a boca e as palavras não se formarem, ou de dizer algo errado. Nefera parou, e a morena percebeu que ela hesitou em toca-la - Se você deixar é claro - ela a encarou, tinha um sorriso de encorajamento, medo também pairava pelos seus olhos, pela resposta que ela poderia dar.

Estava meio deitada, meio sentada, sorriu pra si mesma e com o mesmo sorriso de diversão no rosto se dirigiu para a loira - Sim, por favor, me ajude - a loira sorriu iluminada todo o seu rosto enquanto ajudava a se sentar na cama.

Assim que estava confortável na cama, Nefera sentou à sua frente na cama, as duas se encararam. A morena sentiu falta das mãos da outra em seu corpo, do calor que vinha dela.

- Como está se sentindo? - A loira perguntou.

- Viva - olhou em volta reconhecendo de quem era aquela tenda, foi difícil não franzir o cenho - Onde ele está? - Não precisava dizer a quem estava se referindo.

- Joshua está resolvendo sua situação - quando seu rosto mostrou confusão a outra continuou - sobre a Igreja não ter o direito de permanecer com você. A Aliança está reunida para decidir que decisão tomar.

- E deixe-me adivinhar, Cinéreo deveria ser aquele a ficar de posse de uma ferramenta tão valiosa - não conseguiu ficar deitada, com dor ou sem dor, se levantou passando por Nefera.

De pé viu as roupas em que estava, calças e camiseta branca, as de um enfermo, olhou em volta e não encontrou suas roupas ou armas. Sabia que seu nome estava sendo chamado, mas não olhou para a fonte. Sua mente pensava em mil coisas diferentes, em como tudo poderia dar errando. E só tinha uma certeza em sua vida toda. Ela tinha que está armada e preparada para o pior. Quando estava prestes a quebrar o cadeado de um baú com uma cadeira em busca de vestes e armas, uma mão segurou se pulso.


- Acalme-se! - Nefera falou chamando toda sua atenção, e foi assim que ela percebeu que estava arfando e que seu coração batia acelerado, sem controle - Acalme-se - ela repetiu.

- Você não entende... - sua voz saiu em menos de um sussurro.

- Então me explica - sua voz era acolhedora, ela se aproximou mais, assim que percebeu que não seria afastada.

Não tinha como explicar aquilo, pelo menos não de uma forma coerente, nem na sua cabeça fazia sentido. Então quando começou diz a única coisa que tinha certeza que era a causa daquela confusão

- Você! - falou abaixando cabeça - Você nubla meus pensamentos, me faz hesitar em minhas ações antes nunca questionadas, me faz sentir coisas que foram ensinadas como erradas, me inundando, e me confundindo - apertou os punhos caídos na lateral do seu corpo - E agora meu único medo é de que eu tenha te colocado em perigo e não possa nem te proteger. A única pessoa que amo! - disse tudo que vinha girando em sua mente, assim que as últimas palavras deixaram sua boca, ela levantou os olhos encarando a loira a sua frente. Nefera tinha as mãos sobre a boca enquanto algumas lágrimas caiam rolando pelo seu rosto.

- Por quê? - foi o que saiu quando abriu a boca, confusa, a loira não disse nada, e já com certo desespero deu um passo à frente, a segurando pelos ombros - Esta machucada em algum lugar? - essa era a única coisa que vinha a mente para fazer a outra chorar - Onde é, me diga... - foi pega de surpresa, lábios tocaram o seu, braços envolveram seu pescoço e um corpo se chocou gentilmente no seu.

- São lágrimas de alegria - Nefera falou sorrindo enquanto colocava uma mecha do cabelo preto da morena que ia até seus ombros, atrás da orelha - por que eu também te amo - e com essas palavras a mais velha selou seus lábios.

Estava presa no que poderia ser descrito como armadilha do amor, e não queria sair. Seus braços envolveram a cintura da outra, a apertando mais contra si. Não quis brigar pelo controle, era algo que ainda estava aprendendo, então deixou que a loira liderasse, apenas mergulhou nas sensações novas que sentia, o formigamento que vinha do seu ventre, aos toques da outra na sua pela, no calor que parecia querer subir e se espalhar. E ela teria tentado descobrir a onde tudo aquilo poderia ir, se não tivesse escutado passos adentrando a tenda. Sem armas, ela teria que atacar com chamas. Então rapidamente se afastou de Nefera a colocando atrás de si. Mas a sua frente estava Joshua o Comandante do exército do Reino de Cinéreo e em outra vida seu pai. No entanto a presença que mais pesou naquela tenda foi o homem ao seu lado. O Rei de Cinéreo.

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