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Quarta-Feira.

Confusão.

Estar sozinho não me parecia mais uma coisa boa depois de descobrir que meu agora ex-marido estava no hospital e talvez eu fosse o culpado por estragar sua vida. Nosso casamento estragou sua vida e isso só me fazia querer chorar ainda mais do que eu já tinha chorado no hospital. Dois idiotas que 70% do tempo estavam ou bêbados ou drogados -se não os dois- tentando provar que podiam ser adultos se casando com a desculpa ridícula que se o sexo era bom podia durar. Nos primeiros meses tentando ficar limpos, um já estava viciado em remédios e o outro sexo. Aquele casamento era uma grande bagunça. Nós dois sabíamos disso mas nenhum dos dois sabia o porque de continuar torturando um ao outro.

Nada mais fazia sentido e eu não sabia o que fazer. Bert já tinha outra pessoa que, pelo o que vi no hospital, gostava dele de verdade e eu estava feliz por ele mas me sentia miserável por dentro. Não queria sair de casa e Frank disse que poderia ir até mim depois da ultima consulta, e mesmo eu insistindo que era melhor ele ir pra casa, ele disse que já tínhamos perdido uma consulta aquela semana e iria até meu apartamento de qualquer jeito. E se fosse qualquer outra pessoa eu pediria pro porteiro mal humorado não permitir que subisse mas não existia outra pessoa na minha vida e eu queria ver Frank.

Minha campainha tocava e eram por volta das 6 da tarde e Frank deu um sorriso tímido assim que eu abri a porta. Ele entrou e pude perceber que olhava o lugar como se nunca tivesse entrado ali. Adorável. Eu poderia dizer que era bem mais confortável continuar naquele apartamento com ele ali mas não acho que ele concordaria comigo sobre isso.

"Gerard, Bert me ligou pela manhã" Ele parecia não saber como continuar a falar mas fez do mesmo jeito "Ele certamente não te disse isso mas na verdade os papéis do divórcio já estavam sendo preparados quando ele propôs a você a terapia de casal" Aquilo era uma piada. Só podia ser uma piada "Pode não fazer sentido pra você agora mas ele me explicou da melhor forma que pode e me pediu para conversarmos sobre isso. Ele quer seu perdão e não se arrepende de nada"

"Meu perdão? Bert, quer meu perdão?" Minha voz saia tão fraca e eu só conseguia pensar que talvez nós fossemos o pior que podia ter acontecido um pro outro e Bert nunca teria tido uma overdose se não tivéssemos casado "Acho que eu quem deveria pedir por perdão"

"Acho que você não entendeu ou eu não fui muito claro. Ele não se arrepende de nada e isso inclui você. Segundo ele, vocês ensinaram muito um ao outro e ele te acha uma pessoa maravilhosa" Aquela voz confiante e os olhos calmos estavam ali mais uma vez "Ele propôs a terapia de casal com a intenção de que você, mesmo sozinho, tivesse alguém pra conversar e fazer você perceber o quão incrível você é. Alguém que ele nunca foi como marido. Por isso antes de sair por um final de semana inteiro ele preparava algo que era especial para vocês dois e talvez você não saiba disso mas aquela era sua forma de agradecer por você ainda estar ali com ele, como sua avó esteve com você quando seus pais o expulsaram de casa. Ele também me disse que doía muito te deixar sozinho ali mas ele queria ser feliz assim como você também deveria ser. Ele estava preparado para amar outra pessoa e a terapia, que na verdade desde o início deveria ser sua apenas, era um pedido para que você aprendesse a se amar e estivesse preparado para amar outra pessoa também"

Não sei em que momento eu comecei a chorar ou Frank chegou mais perto de mim para apertar minhas mãos entre as suas e, Deus, como eu estava perdido. Abracei Frank sem querer sentir mais nada além do conforto de um abraço acolhedor e Frank me apertava tão forte entre seus braços que eu só conseguia chorar mais sem nem me importar se a camisa dele estava ficando encharcada com minhas lagrimas pesadas.

E eu poderia ficar pra sempre ali entre seus braços.

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Sábado.

Surpresa?

Aquela semana foi uma mistura de lágrimas, sorrisos e tubos de tinta acrílica vazios jogados pelo chão de meu estúdio já bem menos bagunçado e igualmente sujo de todo tipo de tinta. As poucas telas que eu tinha em branco estavam ganhando uma forma nova e não podia dizer que todas expressavam sentimentos bons mas eu estava muito satisfeitos com os quadros. Minhas pinceladas continuavam tão leves como anos atrás mas definitivamente estavam mais precisas e isso me deixava feliz.

Visitei Bert no dia anterior no hospital e o médico disse que ele poderia receber alta mais cedo se voltasse semanalmente para um grupo que eles tinham para viciados em álcool e drogas e quando Bert disse que já tinha um psicólogo eu sorri ao perceber que Frank não mentiu quando disse que foi tudo como um plano. Foi um pouco desconfortável ver Quinn o beijar quando nós recebemos a noticia, sabendo que eu ouvi Bert gemer seu nome tantas vezes enquanto ainda éramos casados. Mas eles estavam felizes juntos e isso me deixava feliz também.

Quinn viria aqui buscar as coisas de Bert mais tarde e eu esperava terminar uma daquelas pinturas antes que ele chegasse. Era estranho receber como visita alguém que eu quase cheguei a odiar por destruir meu casamento e agora quase considerar um amigo nem uma semana depois de o conhecer e ver o quão bem eles faziam um ao outro até em um quarto de hospital.

Não demorou muito para que a campainha tocasse e praguejei baixo por não ter conseguido progredir tanto quanto queria naquele quadro mas fui atender a porta assim mesmo. Foi um pouco estranho encontrar Frank do outro lado da porta com uma garotinha no colo sorrindo pra mim. Eu não estava esperando receber ninguém alem de Quinn, principalmente meu psicólogo e sua filha, e eu ainda estava coberto de tinta, o que deveria ser engraçado para uma criança pequena já que a fez rir quando sua atenção se prendeu em mim.

"Hey, entra" Dei abertura para que Frank passasse com a pequena no colo que logo começou a olhar todo o meu apartamento bagunçado como se fosse algo encantador "Eu não estava esperando então talvez não tenha nenhuma coisa no lugar que deveria estar"

"Talvez" Frank disse com um sorriso encantador que me fez ficar ainda mais constrangido "Eu a Cherry viemos ver se tinha como te ajudar a se sentir um pouco melhor. Bert disse que você estava se sentindo sozinho"

"Certo" Não sabia muito bem o que falar. Poderia ser considerado bem normal Bert falar que eu tava me sentindo sozinho para meu psicólogo mas era normal meu psicólogo aparecer na minha casa com a filha pra me fazer companhia? Eu realmente não sei "Cherry é um nome bem bonito. Como se chama a sua outra filha?"

"Como você sabe que eu tenho outra filha?" Eu não deveria ter falado aquilo. Merda. Ele não parecia assustado pelo menos, só surpreso e talvez... Animado? "Ela se chama Lily mas como pegou um resfriado eu não pude traze-la"

"Eu vi as duas brincando uma vez perto do seu consultório enquanto esperava o horário da consulta e logo depois você apareceu chamando elas e sua es-"

"A babá. Você me viu chamar por elas e pela babá"

"Oh" Ele parecia estar se divertindo com aquele assunto e eu queria me esconder por ser tão idiota.

"Lily queria vir também mas eu disse que ela poderia vir outras vezes" Outras vezes. Ele estava supondo que não só planejava me visitar mais uma vez como mais de uma? "Então, Cherry e eu podemos ajudar a colocar as coisas no lugar certo"

Era certo que Frank não sabia que aquela conversa era algo que eu esperava em segredo e o quanto tinha me dado esperanças. Eu poderia ter pessoas ao meu redor e certamente faria de tudo para mante-las próximas.

What's Your Poison?Onde histórias criam vida. Descubra agora