|Prólogo|

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Eu não acredito que estou aqui.

Eu sei que os meus pés estão pisando no estúdio fotográfico da Trend, a revista de moda mais conhecida da Alemanha, umas das mais prestigiadas da Europa, mas o medo de que tudo seja um sonho faz com que eu me belisque cada vez que a realidade parece fantasiosa demais.

Eu deveria parecer tranquila, deveria me comportar como o resto da equipe, como se fosse normal caminhar sobre esse solo sagrado, como se nada fosse deslumbrante ou fabuloso. Mas eu não sou como o resto da equipe. Eu sou alguém que sonhou muito em estar aqui. Sou a garota que quase teve um ataque cardíaco quando avistou as penteadeiras abarrotadas de paletas e pincéis das marcas mais desejadas do mercado, alguém cujo cérebro fritou com a visão de alguns dos modelos que já viu em editoriais de moda de todo o mundo.

Essa sou eu.

E talvez eu esteja hiperventilando agora.

Meus olhos estão bem abertos, observando a movimentação ao redor, memorizando cada detalhe, cada interação como um ensinamento valioso. Meu corpo está em êxtase, dividido entre eletrizado e anestesiado. Eu não consigo me conter, tudo é muito excitante. Há um nó de ansiedade no meu estômago que venho tentando ignorar desde que saí de casa nessa manhã. Deus sabe como foi difícil dormir na noite passada com todos esses pensamentos loucos sobre como seria o meu primeiro dia de trabalho.

Deslizo meus dedos sobre os pincéis na penteadeira e as cerdas fazem cócegas em minha pele como um carinho encorajador.

"Sua carreira está começando hoje. É hora de colocar as inseguranças para de baixo do tapete e conquistar seu futuro", eles dizem em minha cabeça.

É claro que eu só estou fugindo da realidade, mas ainda assim, isso ajuda.

— Tatiana! Onde estão as garrafas de água que lhe pedi há dez minutos? — A diretora do ensaio grita em inglês.

Scheiße[1], xingo mentalmente.

Esse foi o primeiro palavrão que aprendi em alemão. Eu estou vivendo em Berlim há uma semana e isso foi o que melhor se fixou na minha cabeça.

É engraçado como o nosso cérebro funciona, às vezes.

— Já estão a caminho! — respondo, apressadamente.

Droga, eu esqueci de reabastecer o carrinho de bebidas.

Me tornar uma maquiadora profissional é o meu objetivo na vida. Me encantei por esse universo desde o meu primeiro batom. Minha família mineira não gostou muito da ideia de ter a sua caçula pintando os rostos das pessoas, mas quando comecei a me especializar e a me destacar, eles me apoiaram e agora estou aqui na Alemanha, fazendo o que amo.

Bem, talvez não no momento.

Eu gostaria de poder exercer a profissão que o meu diploma diz que sou formada, mas parece que um pedaço de papel não importa nesse ramo. O que conta mesmo são os contatos que você faz durante a carreira e é exatamente por isso que eu vim para Europa.

Assim que completei dezoito anos e me formei no curso profissionalizante que fiz em paralelo à escola, pus toda a minha coragem em exercício, entrei em um avião e distribuí meu currículo até esgotar todas as folhas de papel A4 do planeta. Eu só não esperava que o único emprego que conseguiria seria de assistente de elenco.

Sim.

Uma assistente.

O cargo se resume a fazer o que me pedem, dar suporte às suas necessidades. Café, lenços umedecidos, colírio, massagem... Eu sou a 'faz-tudo' do estúdio. Entrar para a revista como uma "ajudante" não me fez dar pulos de alegria, mas foi o mais próximo que consegui do que realmente queria e também é um meio de conhecer pessoas, então me obriguei a ficar animada. Yay.

Por Trás das Aparências (RETIRADO)Onde histórias criam vida. Descubra agora