RECADO: depois de 54 anos, cá estou eu de volta. Foram muitas desculpas (rs), muitos dias me sentindo culpada por não atualizar essa história que vocês amaram, mas havia chegado em um ponto onde eu tinha que cuidar de MIM. Eu sei que todas entenderam mas eu me atrevo a utilizar esse espaço para pedir desculpas novamente pela demora e eu pretendo compensa-las com um final digno. Obrigada por me acompanharem e, para as amigas que estavam torcendo pela minha recuperação, obrigada em dobro! <3 Sem mais delongas... aproveitem!
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Rodrigo
Era difícil dizer com exatidão o que estava acontecendo. Eu estava em um quarto de hospital, talvez de uma enfermaria ou clínica, isso era nítido. Agatha estava ao meu lado, chorando copiosamente enquanto segurava minha mão, seu rosto avermelhado colado ao meu, fazendo-me sentir suas lágrimas escorrendo entre nossas bochechas.
O que havia acontecido para eu estar aqui?
Meu cérebro tinha a resposta, mas eu simplesmente não conseguia encaixar as peças. Lembrava-me de ter ouvido barulhos muito altos antes de perder a consciência. Estrondos ao longe que me assustaram. Eu havia sofrido um acidente, mas isso não era tão nítido quanto saber aonde eu estava.
Não, algo não estava certo. Eu não conseguia me lembrar de muita coisa. A única certeza que eu tinha era que eu estava vivo, com a mulher que eu amo ao meu lado naquele quarto branco demais e apertado demais.
- Agatha? – Eu pergunto delicadamente. Por mais tentador e reconfortante que fosse estar ali com ela, eu precisava de algumas respostas. Minha cabeça lateja na esperança de desvendar o que havia acontecido. Eu nunca fui conhecido pela minha falta de curiosidade. – Por que eu estou aqui? Eu sofri um acidente, não é?
- Você não se lembra disso? – Ela afastou o rosto, fitando-me melhor. Seus olhos, encharcados pelo choro, me diziam muito mais do que ela poderia imaginar.
- Eu... eu não consigo... não consigo me lembrar. – Levei minha mão solta à minha têmpora, sentindo cada parte da minha cabeça latejar. Esfreguei por alguns segundos, fechando meus olhos, esperando que a dor evaporasse como um suspiro. Minha outra mão estava ocupada sentindo o toque de Agatha. Quente, delicado, único. Sua presença me desviou da dor, eu não queria perde-la de vista. – Desculpa.
Encarei seus olhos verdes, pedindo desculpas por algo que nem eu mesmo sabia direito. Mais lágrimas escorrem por suas bochechas e ela me beija delicadamente, misturando nosso toque com um pouco de água salgada e uma tristeza profunda. Sua testa encosta na minha e ali ela permanece mais um pouco, sussurrando o quanto me ama.
- Rod, - ela recomeçou. Estava mais calma, recompondo-se do choro e, acredito eu, de algum susto. – bom, eu não sei bem o que aconteceu exatamente. Eu estava te esperando chegar em casa quando recebi uma ligação do hospital dizendo que você estava aqui. Você esteve nessa... situação, se podemos chama-la assim, por quase um ano, talvez mais, menos, nem eu sei mais.
- Então... eu não me lembrava de você? – Minha respiração parou. – De nós?
- De nada, Rod. – Ela fungou novamente, limpando o nariz na barrinha da blusa, como sempre fazia depois de chorar bastante. – Nem de mim, nem da sua família, do nosso casamento...
- Agatha... – Senti as lágrimas molharem o meu próprio rosto.
Como eu pude me esquecer dela? De tudo? Maldito cérebro.
- Tudo bem, tudo bem... já passou. – Ela se levantou, aproximando-se do meu rosto e enxugando a pequena linha molhada por minha face. Depositou um beijo demorado em meus lábios, acariciando minhas bochechas. – Vou chamar uma enfermeira para te checar e avisar que você acordou, pode ser?
- Claro. – Fechei meus olhos. Não haviamos trocado muitas palavras mas eu me sentia exausto. O silêncio entre as coisas não ditas me nocautearam. Eu realmente sentia como se eu precisasse de alguns minutos sozinho para processar tudo o que ela havia me dito. E tudo isso ainda parecia muito superficial. Eu sabia que havia mais coisa nessa história toda que ela esperaria para me contar, em pequenas parcelas, como se a dor prolongada fosse um tanto quanto melhor.
Assim que ela saiu do quarto, procurei por algum pedaço de papel e uma caneta que eu pudesse usar. Coincidentemente havia tudo o que eu precisava em uma mesa móvel nos meus pés. Fiz um pequeno esforço e os alcancei, escrevendo algumas das coisas que eu me lembrava e, caso caísse no sono novamente e me esquece de tudo outra vez, pudesse utilizar as minhas próprias palavras para me recordar.
Eu sofri um acidente. Não esse que me faz estar nessa maca enquanto eu escrevo, outro. Ninguém sabe exatamente o que aconteceu. Parece que eu fiquei algum tempo sem me lembrar das coisas. Agatha ficou o tempo todo comigo. Ela estava aqui quando eu acordei. Ela não está aqui agora porque foi procurar uma enfermeira. Eu a amo. Nós somos casados. Nos conhecemos há alguns anos. Eu sou fotógrafo. Amamos assistir ao pôr do sol. Minha família mora um pouco longe, mas eu os amo. Tenho sobrinhos lindos e espero um dia ser pai. Eu quero ser pai, quero formar uma família com a Agatha.
Eu ainda não havia terminado de escrever tudo quando a porta o quarto fez um clique, abrindo logo em seguida. Uma equipe médica adentrou, sorrindo em minha direção. Dobrei o pequeno papel e o escondi, antes que Agatha pudesse vê-lo. As enfermeiras conversaram comigo e pediram que ela esperasse elas me examinarem.
Agatha relutou um pouco, mas depois de eu afirmar cerca de cinquenta vezes que eu estava bem, ela aceitou a oferta e foi para casa tomar um banho e trazer algumas coisas para ficar mais confortável. Ela havia me dito que trabalhara durante todo o dia e eu a incentivei a ir descansar por alguns minutos. Eu não iria sair dali mesmo.
Depois de algum tempo, enquanto ela não voltava, mostrei meu papel para uma das enfermeiras, explicando o que ela deveria fazer caso eu adormessece e acordasse sem me lembrar de nada outra vez.
Esperava que nenhuma das minhas instruções fosse necessária. Eu recordaria dela quando ela voltasse.