❝ crer ❞

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[ conto ]

A Voz da Verdade


Uma peculiar garota, chamada Dia, estava prestes a fazer aniversário (em um mês gelado) e não estava muito ansiosa para o acontecimento. Desde que começou a ter conhecimento dos fatos, Dia se reconheceu como uma pessoa diferente.

Não é clichê, não mesmo, ela realmente preferiu se encaixar na minoria: dar aquilo que quase ninguém daria, mostrar o que quase ninguém mostraria e oferecer aquilo que quase ninguém ofereceria.

A cada ano que se completava, Dia ia se dando conta do quanto era diferente.

Dia estava em uma fase conflitante, daquelas que temos de passar por transformações e questionamentos, daquelas que todos nós acabamos passando em certos momentos da vida. Porém, Dia estava se sentindo lenta, como se estivesse atrasada, há um tempo recorde, no relógio de seu maior compromisso.

Dia sabia que havia chegado a hora. Uma avalanche de vozes lhe dizendo, "faça isso, faça aquilo", sem lhe darem espaço para que ela desse voz ao próprio interior, nunca tendo a chance de enxergar a si mesma no meio de tanto barulho.

Mas a vida é assim mesmo, dizem que se você não decide o rumo, alguém acaba decidindo-o por você.

Estava tudo uma bagunça e ela só conseguia pensar que, até o dia anterior, tudo estava bem.

Como pode ter acontecido tanta coisa de um dia para o outro? Aonde eu errei?

Perguntava-se e martirizava-se, nem se dando conta de que já estava trilhando por uma rua mal iluminada, em uma passagem silenciosa e estreita. Nunca tinha andado por ali. Ela estava decidida a não voltar para casa e foi nesse pensamento que ela logo tropeçou.

Tinha a impressão de estar sendo seguida, mal sabia o que estava prestes a lhe acontecer, sua vida não seria mais a mesma: ela só precisava erguer o olhar.

Somente, erguer o olhar.

Dia estava machucada nos joelhos, a latência que sentia poderia ser facilmente comparada aos batuques de um tambor, entretanto, a jovem só notou a dor horas depois, quando sua mente voltou a ser calmaria. Naquele momento, ela só conseguia sentir medo.

Um turbilhão.

Como narradora, eu sei que bastaria que ela olhasse para cima, assim como você também sabe, todavia, ela não percebeu o que nós percebemos. Afinal, a solução óbvia nunca nos parece ser a melhor opção, porque nada pode ser tão fácil. Não é?

Aos olhos de Dia, só existia uma realidade: ela estava sozinha em um ambiente escuro, sem coragem, sem um plano e sem um destino. Começou a se lembrar da época em que suas lembranças ainda vinham em tons claros e alegres, quando sorrir lhe era um hábito prazeroso. Pensou em seus sonhos mais íntimos e, céus, todos eram tão fantasiosos!

De repente e sem permissão, lá de dentro de seu coração, um som involuntário saiu por entre seus lábios, como um pedido de socorro, vindo de sua própria alma. Dia estava chorando, sem ao menos ter se dado permissão para tal. Não queria ser fraca — e chorar sempre lhe pareceu um sinal de fraqueza —, queria ser a garota forte que sempre foi, afinal de contas, já tinha superado tantas coisas ruins, tantas coisas piores...

Seja forte, sussurrou em meio ao choro.

Ficou ali por horas, tentando fazer algo para mudar a situação, chorar tudo o que tinha para chorar, quem sabe, poderia esvaziar seu interior conturbado e, então, pensar com clareza. Naquele momento, ao longe, Dia começou a ouvir um som compassado, um som que se tornou familiar.

Eram passos. Passos e mais passos. O coração dela acelerou tanto que ela pôde senti-lo na garganta, literalmente.

Por alguns longos segundos, nada do que sentiu antes fez sentido, ela só queria sair dali o mais rápido possível, fugir para um lugar seguro. Se trancar em seu quarto, talvez. Porém, era tarde, os passos pararam diante de si e Dia viu uma sombra enorme encobrindo-a, tomando-a.

A pessoa, enfim, estava ali:

— Chorar não significa fraqueza. — Dia ouviu a densa sombra falar, uma voz firme e acolhedora.

Eu devo estar dormindo, caí e bati muito forte com a cabeça, reprovou-se.

— Não se preocupe — a sombra voltou a falar em meio ao silêncio doloroso da madrugada —, eu não estou aqui para lhe fazer mal, Dia.

— Como sabe o meu nome? — Se você pudesse ver a expressão de Dia, tenho certeza de que a veria tão calma quanto alguém que está com uma faca na garganta.

— Eu sei tudo sobre você... — a voz estava feito veludo, macia, tranquila. — Percebo que não reconhece a minha voz e que está amedrontada. Isso me deixa triste, pois consigo sentir tudo o que você sente. Não estaria com medo, se soubesse quem sou.

— Mostre-me seu rosto, então? — Dia nem sequer raciocinou, antes que as palavras voassem para fora de seus lábios.

A resposta que recebeu veio em um som musical e envolvente, veio em forma de riso condescendente. E, então, seus olhos foram de encontro à claridade repentina que vinha surgindo, era o nascer do Sol.

Um lindo e hipnotizante nascer do Sol.

— Querida, — a voz poderosa, como Dia passaria a chamá-la quando contasse às outras pessoas sobre o que viveu, estava bem mais perto dela, como se a sombra tivesse brilho próprio e não pudesse ser encarada de forma alguma pela simples jovem — eu te fiz uma promessa, há muito tempo. Você nem mesmo deve se lembrar dela, mas saiba que eu não mudo. Nunca. Uma vez que prometi algo a você, eu cumprirei. Você se lembrou de mim em sua memória feliz, foi fácil estar comigo quando tudo estava bem, não é? E quem poderia adivinhar que as coisas, um dia, ficariam tão ruins? Você não tinha como saber. E, por isso, estou aqui. Eu trouxe um novo amanhã para você.

— Eu... Eu não... — ela se sentia tão boba, tão esperançosa e, ao mesmo tempo, tão confusa. — Eu sei quem você é. — confessou, com os olhos marejados.

— Então, sabe que eu estou certo sobre chorar, porque o que vejo sair de seus olhos agora, são lágrimas de alegria, não de fraqueza.

Nunca estive sozinha, não é?

E nunca estará.

O Sol trouxe a vida, a esperança e as ideias reavivadas, trouxe a paz, os sonhos e uma nova Dia.

Hey, gardeners!

Espero que estejam gostando dessa obra, ela é uma parte muito sincera de mim. Também estou postando algumas coisas no Twitter, então, ficaria muito feliz em vê-los por lá: @meninadojardim, o mesmo user do Instagram!

Beijos de flores!

PÉTALAS SOLTASOnde histórias criam vida. Descubra agora