29 - QUASE A PERDEMOS

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Aos poucos Marjorie começava a entender o que houve, as coisas iam se encaixando, mas nada do que Maria Clara falou parecia justificar sua reação diante de tudo o que havia acontecido.

"Clara, não estou minimizando o que passou, mas se você está aqui hoje, significa que tudo isso foi superado, não?"

"Não é tão simples como se parece, amor, a situação se complicou e muito."

"O que houve?"

"Eu não sabia o que estava tomando, só sei que na época eu meio que surtei. Uma certa semana fiquei completamente alterada e cheguei a ficar dois dias fora de casa, eu te juro, nem sei como consegui passar nas provas naquele período. Meus pais ficaram loucos de preocupação comigo e quando voltei para casa e eles viram que eu estava bem, quer dizer, fisicamente nada de mal tinha me acontecido, a preocupação deles, principalmente da minha mãe virou raiva."

"Dá para entendê-los."

"Desde quando comecei a usar aquilo, minha família notou logo a diferença. Fiquei arredia, grosseira nas respostas, não queria ouvir o que minha mãe dizia e mal falava com as minhas irmãs, porque quando elas vinham conversar sobre qualquer coisa, eu me irritava logo e mandava elas..." As lágrimas dela recomeçaram a cair. "Bom, você deve imaginar."

"Sinto muito." Marjorie passou a mão sobre a de Clara, sentiu empatia por ela e sua dor nesse momento. "Amor, você quer mais um pouco de chá?" Perguntou ao ver que essa conversa estava sendo muito dolorosa para a namorada, talvez essa fosse a hora de dar uma pausa. Estava se fazendo de dura, mas seu coração estava apertadinho em ver o quanto a amada sofria.

"Quero água, por favor." Marjorie foi buscar água para as duas e depois de uns minutinhos Clara se sentiu pronta para continuar a conversa.

"Me olhava no espelho e não me reconhecia, o pior é que estava gostando do que me tornei. Minhas irmãs tentaram falar comigo várias vezes, elas não sabiam o que estava acontecendo, mas minha mãe era muito esperta. Ela lidava com esse tipo de problema com frequência no seu trabalho."

"O que ela fez?"

"A mama quis conversar comigo e eu a ignorava sempre, até que um dia, ela junto com o meu pai me botaram contra a parede eu contei tudo. Abri o jogo completamente, contei inclusive de onde era a fonte e falei que estava apaixonada pela Rachel. Eu até disse para eles que estava duvidando se eu realmente tinha vocação para ser médica e que estava pensando em largar a faculdade." Lágrimas escorreram novamente dos seus olhos. "Marjorie, naquele dia eu falei tanta besteira que fez meus pais tomarem uma decisão extrema."

"Amor, quer dar uma pausa?" Ela negou com a cabeça. "Tá bom, o que decidiram então?"

"Decidiram que iriam me internar para reabilitação e tentaram fazer isso por bem, com o meu consentimento e eu obviamente me recusei. Minha mãe me deu vinte e quatro horas para eu ir por bem, caso contrário, ela me levaria contra a minha vontade. Naquele dia fiquei muito revoltada e a desafiei a me internar a força, disse que ela não poderia fazer isso já que eu tinha completado dezoito anos, mas minha mãe é uma mestra na lei, ela falou que conseguiria um laudo de insanidade e me internaria mesmo eu já sendo maior de idade."

"E a Rachel, o que houve com ela?"

"Como te falei, eu estava sem noção de realidade, se estivesse enxergando bem, teria visto que a situação de Rachel estava muito pior do que a minha ela se envolveu com um pessoal barra pesada, depois descobri que estava traficando também e não eram apenas esses comprimidos, eram coisas muito pesadas mesmo."

"Clara, você usou..." Marjorie estava incomodada para fazer essa pergunta, mas Clara respondeu antes que ela terminasse.

"Usei, só para afrontar minha mãe num momento insano de rebeldia." Marjorie pareceu decepcionada ao ouvir essa declaração. "Eu cheirei pó, Marjorie." Falou séria. "Foi uma vez só, eu juro, essa foi a primeira e a última vez graças a Deus. Foi logo após minha mãe e eu brigarmos."

Ladras de Beijos e Corações (concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora