"Para tudo há uma ocasião certa;
há um tempo certo para cada propósito
debaixo do céu". Eclesiastes 3.1
Uma multidão se formava ao redor de um pequeno grupo de dançarinos. A sincronia entre passos e a batida da música era simplesmente perfeita. Calças pretas, blusas coloridas e rostos expressivos eram a sua marca. O som animado com a bela melodia atraia a todos. As pessoas sussurravam entre si, fascinadas pelo evento concentrado na grande praça de Foz do Iguaçu.
Victor encarava a cena em sua volta com o coração acelerado. Fechou os olhos procurando se acalmar para o que estava prestes a fazer. Não poderia desistir, sua alma gritava por isso. Há algumas semanas sua vida mudara. As perguntas antes sem respostas encontraram o seu caminho e precisava dividir a sua história.
Foi quase impossível chegar até ali, mas por um milagre e quatro policias à paisana dentro de poucos minutos ele estaria no centro daquela praça.
Dois dias haviam se passado desde que Érique deixara o Paraguai. Continuava em um hotel simples na esperança de que sua cunhada o perdoasse e viesse encontrá-lo. Hanna e Valéria ainda estavam com ela. Melissa já havia ligado diversas vezes, mas não tivera coragem de atender, apenas enviava mensagens dizendo que estava tudo bem e não poderia atender no momento. Como poderia falar que sua irmã o odiava? Que a sua viagem fora em vão?
Frustrado, caminhou pela calçada. Precisava pensar em como agir. Já havia pedido perdão, tentara conversar. O que mais poderia fazer? O ruído em sua volta começou a incomodá-lo. Eram carros, buzinas e o som alto. Resignado, começou a repassar o momento tenso que passou com Fernanda.
Não havia mais nada que pudesse fazer para ela o perdoar. Pela primeira vez percebeu que precisava levar aquele problema a Deus. Ficou entristecido consigo mesmo ao perceber a quanto tempo não O procurava. Sabia que Ele sempre cuidava de tudo, mas no meio do seu ódio acabara esquecendo-se dessa verdade. Deus era o único que o compreendia perfeitamente. Depois de viajar por horas e ver o semblante da sua cunhada, sentia-se verdadeiramente arrependido. Jamais deveria tê-la julgado daquela maneira.
O interior do carro era preenchido com uma música suave. O cantor ninguém sabia. Era uma rádio local, mas aquela melodia fora como um calmante para as três mulheres ansiosas.
Fernanda dirigia em silêncio, mãos presas ao volante e os olhos sem piscar, como se a qualquer momento tivesse que estar pronta para um desvio. Até a respiração se tornara tensa. Os últimos dias não foram fáceis, mas conversar com suas amigas trouxe um pouco da realidade que tentava esquecer.
O sol continuava em seu ponto mais alto. A ponte da Amizade, que ligava o Paraguai ao Brasil estava chegando. Estacionaram o carro e entregaram a Permission da sua entrada naquele país. Ambulantes andavam por todos os lados, chamando a atenção para que comprassem seus produtos. Fernanda apenas negou com a cabeça e a mão e entrou no carro seguida das amigas.
_ Tem certeza? – Valéria indagou mais uma vez.
_ Bem – ligou a ignição e colocou o carro em movimento _ É apenas o que preciso fazer.
Hanna e Valéria se entreolharam e deram um meio sorriso. Seriam poucos minutos até chegarem ao seu destino. O único pedido era que Deus desse forças para todos naquele momento.
O movimento estava intenso perto do centro, Fernanda desviou por alguns caminhos já conhecidos e de repente um carro cortou a sua frente fazendo-a bater em uma arvora na beira da calçada.
_ Mas, que droga! – esbravejou bufando de raiva. Havia batido a cabeça de leve no volante, mas estava bem. Encarou os outros ocupantes do carro e soltou um suspiro de alívio ao constatar que apenas ela havia se machucado.
Saíram do carro indignadas, o sujeito simplesmente cantou os pneus e foi embora. Um pequeno murmúrio começou a se formar deixando-a irritada. Observou o carro e percebeu que a batida amassara um pouco na parte da frente. Decidiu deixar o carro ali e esperar a policia chegar. Sem esperar pelas amigas, procurou um banco vazio há alguns metros e sentou-se. Detestava os olhares curiosos em sua direção.
Valéria pegou um lenço umedecido e com cuidado limpou o pequeno ferimento na cabeça da amiga. No meio de toda aquela adrenalina esqueceram-se de tudo, especialmente do que estavam fazendo naquela cidade.
_ Acho que já chegamos ao nosso destino! – Hanna revelou encarando um ponto a sua frente.
As duas a encararam e seguiram o seu olhar. Ela apontou o dedo para um lugar cheio de bancos na praça. Encontraram Érique sentado, cabisbaixo com os pensamentos longe. Fernanda fechou os olhos e tentou-se manter calma. Estava prestes a se levantar e ir naquela direção quando o som de uma voz a impediu.
As suas pernas amoleceram e os olhos se encherem de lágrimas instantaneamente. Ela reconheceria aquela voz até debaixo da água. Levantou a cabeça, ansiosa por encontrá-la.
Não pode ser!
Ela avistou-o de pé no meio da praça. A sua postura continuava como sempre, mas algo no modo como falava havia mudado. Ela não conseguia enxergar o seu rosto, mas sabia que era ele.
Victor!
As crianças estavam vibradas em um desenho na TV. Vitória havia acabado de pegar o salgadinho do armário sem a mãe perceber. Ignorou aquele fato feliz. Melissa nunca deixaria fazer isso antes do almoço. A pequena juntou-se com o irmão e fizeram a festa com o aperitivo. A mãe das crianças andava de um lado para o outro. Poderia dizer que era uma cópia do seu marido há alguns dias.
Estava preocupada, ainda não sabia pelo quê. Não conseguia parar de pensar no marido, tentou ligar, mas ele nunca atendia. Estava quase pegando um ônibus para encontrá-lo, mas onde ele estaria?
Naquele instante ela recebeu uma mensagem da sua irmã. Era simples e objetiva.
Ore!
Victor respirou fundo mais uma vez. Enquanto contava a sua nova história encarou as pessoas curiosas com a forma que ele falara. Algumas arregalaram os olhos, outras pareciam transmitir compaixão e outras estavam prontas para irem embora. Ele olhava para todos, mas sem conseguir distinguir o rosto de ninguém, eram como um borrão.
Havia dois policias ao seu lado, há uma distância considerável para deixá-lo a vontade. Ele já se acostumara com aquilo. Todos os dias vivia como se tivesse dois guardas costas o seguindo. Não era mais um homem perigoso, mas as pessoas não sabiam disso, elas apenas viam o que queriam, mas não podia condená-las. Se estivesse em seus lugares, faria o mesmo.
O coração de Fernanda continuava loucamente acelerado, sentiu as mãos tremerem e obrigou-se a sentar-se novamente. Victor estava ali, há poucos metros de distância. O que ele estava fazendo naquele lugar? O que estava acontecendo?
Escutou novamente a voz estrondosa e única que ele tinha. Fechou os olhos com a saudade que tinha de ouvi-lo. Apesar de reconhecer aquele timbre, percebia que havia algo diferente. Respirou fundo ignorando o olhar de Hanna sobre ela e tentou esquecer que Érique estava perto. Aquilo não poderia ser coisa boa. Sentiu as borboletas agitarem seu estômago, mas não da maneira que gostaria. A sensação de que tudo pudesse ruir se apossou dela.
Escutou uma movimentação há poucos metros de onde estava sentada. Encarou o policial que observava atentamente o seu carro e teve vontade se socá-lo por aparecer justamente naquela hora. Encarou Victor, mesmo sabendo que ele não poderia vê-la. Com passos lentos afastou-se sentindo que novamente o deixara partir. Engoliu as lágrimas que ameaçavam desabar e caminhou pronta para vários formulários e depoimento que iria prestar. Talvez fosse rápido, não sabia ao certo, apenas que a vida tinha o colocado novamente perto um do outro em um lugar que jamais esperariam.
Afinal, o que Victor estava fazendo na fronteira entre o Brasil e o Paraguai?
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Incondicional
RomansaFernanda era uma mulher bem sucedida profissionalmente. Com seus 26 anos tinha uma vida estável, mas ainda não se apaixonara. Apesar de ser uma mulher cheia de atitude, carregava algo que a impedia de amar. No entanto, o destino a fez conhecer Victo...