Capítulo 3 - Artur

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Artur adormeceu de mal jeito deitado no chão frio e duro da sala em que estava aprisionado. Acordou por três motivos: a fome que sacudia seu estômago; a sede que arranhava sua garganta; e os passos pesados de botas que ecoavam no vazio. Sentiu uma fraqueza intensa ao sentar-se. O guarda era o mesmo com quem falara momentos antes. 

- Acorda, fedelho. Engole isso rápido. - ele atirou aos pés do garoto uma garrafa plástica com água e um saco de papel com duas fatias de pão preto e uma ameixa. Artur comeu e bebeu com avidez, sem questionar, aliviado por ter seus problemas parcialmente resolvidos. 

- Quanto tempo eu dormi? - perguntou Artur, mastigando o último pedaço de pão.

- O suficiente. Preciso te levar para outro lugar agora, ande logo com isso aí.

Artur bebeu mais um gole de água e voltou suas atenções para a ameixa. Quando estava chegando ao caroço, o guarda falou com ele de novo.

- Olha só, esse não é o meu trabalho, mas eu vou te adiantar algumas coisas. Você mexeu comigo, moleque. Você é pequeno demais para isso. Eu não quero saber como foi que você se meteu nessa história,  e nem me envolver com as suas falcatruas, estou do lado do governo até o fim. Mas eu achei seu nome em alguns registros de prisioneiros aqui. Aparece algumas vezes, é claro que nem todos são sobre você. Repassei para os superiores. Se quem te mencionou estiver vivo, você pode ter uma chance melhor de sobreviver, ainda que fique por aqui. Vamos, me adiante. O que é que você tem a ver com isso tudo?

Foi difícil disfarçar a expressão de surpresa e excitação ao ouvir essa notícia. A certeza de que os pais estavam vivos aparecera, haviam falado nele! A alegria no peito deu novas forças ao menino, que estabeleceu um novo modo de alerta ao conversar com o guarda.

- Meu pai! Meu pai foi trazido por um rastreador, foi isso. E eu e minha mãe viemos por engano depois. E eu me encontrei com outras pessoas e cheguei até aqui, é isso, em resumo, eu não vou falar mais nada, porque eu não sei se você está me ajudando mesmo. Mas se tiver, obrigado. Obrigado de verdade.

- Cale a boca, moleque. Não fale em termos de "ajuda" e finja que não sabe de nada que lhe falei quando chegar até o comandante novamente. Do contrário, estaremos todos em apuros. E, se seu pai foi mesmo pego pelo rastreador, esqueça. A essa altura, ele provavelmente está pinel e não existe volta. Deposite as esperanças nessa sua mãe, se lhe convém.

Artur ficou confuso com as expressões usadas pelo guarda. Atirou o caroço da ameixa de lado, e ficou em pé, com as mãos torcendo-se em movimentos ansiosos. 

- O que você quer dizer com... meu pai "estar pinel"?

- Ora, você sabe de tanta coisa e não sabe disso? Veja bem, os rastreadores não trabalham unicamente para trazer essa galera toda até aqui. É como magia, garoto. Eles prendem os caras em um transe do qual é impossível sair. Tornam-se obedientes, mais fortes e bastante determinados. É como se o nosso exército fosse mecânico. Não tem chance. Quem se rebelar, vai ser esmagado.

- E não há chances de tirar ninguém desse estado? - perguntou Artur, apreensivo. Não queria pensar na possibilidade de perder seu pai para algo desse tipo. Um leve desânimo afetou a empolgação adquirida há poucos instantes.

- Lamento, moleque, é definitivo. Como eu disse, concentre-se na sua mãe. Talvez você se safe, na medida do possível. Agora vamos, e ande direito, senão vou ter que te dar uns tabefes de novo. E lembre-se: não ouse mencionar absolutamente nada do que conversamos aqui. Minha consciência está em paz, deixe a sua também assim, porque senão estaremos os dois muito, muito encrencados.

*

Crônicas da Nova Era - A RevoluçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora