Cheguei em casa com dor em todos os lugares de meu corpo, principalmente na cabeça, já que Harry veio metade do caminho cantando alto, e em bom som, o hino da escola de futebol que ele frequenta. Juro por tudo que é mais belo que eu queria, profundamente, obrigar ele a parar de cantar, mas os seus olhos repletos de saudade em cada palavra da música, principalmente no refrão, cuja parte eu notei uma lágrima escorrer de seus olhos porém ele foi mais rápido e disfarçou passando as mãos, faziam-me ouvi-lo cantar por horas seguidas. É tão triste vê-lo desse jeito, chorando por não poder frequentar as aulas por falta de um diagnóstico, se eu pudesse curá-lo mesmo que dando minha vida, eu faria. Essa situação de Harry estava sendo a pior e mais demorada que já passamos na vida, e na minha opinião, o maior problema disso tudo, era que o rosto encharcado dele só me fazia lembrar das noites angustiantes quando nossos pais brigavam até a voz falhar, Harry corria para meu quarto e eu o acalmava com músicas ou histórias de uma família perfeita. Conforme o passar do tempo, a gente foi crescendo e Harry perdeu o medo dessas brigas, até ele se meter em uma dessas para defender nossa mãe e acabar no hospital com um corte no nariz, presente em seu rosto até hoje.
Dói e me arrepia lembrar desse dia, balanço a cabeça afim de esquecer os pensamentos e corro para meu quarto me jogando na cama. O cansaço que dominava minha cabeça me embala num sono em que adormeço por longas duas horas, acordando somente com uma ligação da minha mãe.
- Está tudo bem com Harry? Ele precisou de remédios? Como está a casa?- Ela me consumia com perguntas em menos de um minuto de ligação.
- Sim, não, e sim. Calma mãe, está tudo sobre controle. - soltei um bocejo e juro sentir minha mãe revirando os olhos na outra linha. Ela odeia que eu durma a tarde, acredita que quem dorme a tarde não sabe trabalhar, patético isso.
- Tá bom, cuide bem dele e do resto, tá? Volto em dez dias. - E desligou, detalhe, sem nem perguntar se eu estou bem ou como foi nosso dia. Dona Victória dá dessas, só se importa com o que tira ela de sua zona de conforto, ou seja, meu irmão doente e as pendências da casa, de resto, pouco a importava, eu já estava acostumada com a ideia de minha mãe se esquecer de mim, às vezes, ou fingir que esquece, por que ela nem se quer se dá a educação de perguntar como a filha dela está. Mas eu não ia preocupá-la com algo assim, ela iria considerar banal e me mandaria para um colégio interno, com o mesmo motivo pelo qual eu reclamei.
Suspirei longo, cheio de raiva e angústia por nunca ter um pouco da atenção da minha mãe. Não era um comportamento infantil, já que ter sua mãe longe de ti e quase nunca ter sua atenção eram motivos consideráveis. E ouvi duas batidas na porta seguidas de um soluço alto. Harry estava chorando.
- Entra, Harrysy, o que aconteceu? - perguntei enquanto o mesmo caminhava em minha direção.
- Crys, preciso conversar com você. - seus olhinhos verdes brilhavam com lágrimas escorrendo brilhavam com a luz do sol poente da minha janela. Eu assenti e ele começa.
- Tem um menino na minha escola que estuda na minha sala que é meu amigo. Ele joga futebol comigo e a gente é bem próximo, ele é o Rachel, só que tem um problema nisso tudo. Já faz um tempo que eu comecei a me sentir estranho perto dele e quando ele faltava no treino, eu sentia muito a falta dele. Daí na semana passada os meninos do meu treino, estavam zoando um menino que só andava com as meninas da minha sala, eles chamavam ele de viado e que ele era fraco, não era homem, e eu me senti muito mal com eles falando assim, e ainda por cima, me identifiquei quando eles falaram que esse menino era realmente gay. - Harry começou a chorar mais ainda. - O que a mamãe vai pensar quando eu falar pra ela que eu sou gay? Ela vai querer me pôr na adoção! Crystall, por favor, me ajuda, eu não sei o que eu faço.
- Primeiro se acalma Harry. Não é por quê você tem a opção sexual diferente da dela, que a mamãe vai te colocar na adoção. Ela te ama independentemente se você gostar de homem ou mulher, e eu também te amo. Você não precisa temer por nenhuma de suas paranoias, okay? - Baguncei seus cabelos e ele soltou uma risada não muito sincera- Agora, sobre os seus amigos, ou melhor, sobre esse meninos que zoam os outros por serem gays, você tem que se afastar deles. Eles não tem noção do que estão falando e só falam essas besteiras, pois esse menino gay deve ter muito mais amigos verdadeiros do que eles, que só se juntam para zoar os outros. Não se sinta ofendido principalmente por não ser com você e para que os meninos do seu treino não te julguem também, mas o mais importante é, você pode contar comigo para tudo o que precisar nesse quesito "crush" - dei uma piscadela e ele riu, agora mais sincero- se alguém vier te julgando, me conta que eu vou dar um jeito nisso, e se você não quiser que eu conte pra ninguém, eu vou guardar segredo, até você se sentir preparado para contar.
- Obrigado, Crysy, te amo muitãããããão - ele pulou em meu colo num abraço mais que especial.
- Também te amo, Harrysy! Te amo muitoooooooo.
-Mais do que ama o Luke?- ele se virou para me olhar. Corei imediatamente.
- Sai pra lá, garoto! Óbvio que não.
- A Crys gosta do Luke, a Crys gosta do Luke - ele saiu correndo e cantarolando pela casa.
- Não gosto não - corri atrás dele com um travesseiro nas mãos e ao notar minha perseguição, Harry correu mais rápido.
- Cryssssss, agora que acabou o filme, quero te fazer uma pergunta. - Harry se virou pra mim, com aparência muito curiosa. Acabei por colocar um filme para nós assistirmos juntos depois de tê-lo alcançado na sala e levado ele para o sofá, mesmo com muitas almofadadas na cara, e também porque não tinha praticamente nada em casa para fazer, além de que a canseira estava muito presente.
- Hum - resmunguei sonolenta, acabei dormindo mais da metade do filme- O que quer saber?
- Sabe o Luke - só pelo nome dele na conversa, já pressupus a pergunta de Harry- Vocês são tão próximos e você até já dormiu no carro dele, isso não é algo normal que amigos fazem, ou é?
- Harry, já é tarde- Olhei para o relógio que marcava uma da manhã- sério mesmo, que você quer falar sobre isso?- ele assente.
- Aff - ajeitei-me no sofá e começo a contar- Olha, normal, normal, não é, mas nós não temos nada além de amizade, e provavelmente não vamos ter, e...
-AHÁ, então pode ser que um dia vocês se casem? - Ele arregalou os olhos.
-NÃO, quer dizer, não sei, já que nós não mandamos no futuro, se bem que é pouco provável que isso aconteça. - senti um leve aperto no coração ao soltar essas palavras- O Luke deve ter muitas opções de meninas, tipo, uma pra cada noite sabe? - Harry assentiu e riu - Então...sei lá, nem ligo pra isso. - outro aperto no coração.
- AAAAAAAAH TAAAAAAAA, Crys, tá tão na cara que você gosta dele, meu Deus, beija ele logo, caralho- joguei um travesseiro em sua cara e ele ri- Eu apoiei muito vocês, vocês se dão super bem, são vizinhos, estudam na mesma escola, a mamãe ama ele e o mais importante, vocês tem uma amizade profunda, que pode fortalecer um relacionamento - "ou estragar" pensei comigo- eu nunca vi você tão feliz com algum amigo ou amiga. Lá em Camberra, você nem tinha muitos amigos e vivia triste, e hoje, chega em casa com um sorriso diferente todo dia, por mais que nem sempre eu veja- ele ri- E não se esqueça, seja feliz, viu maninha? E sou menor que você mas sei de tudo o que você passa ou já passou.
- Ah, meu bebê, obrigada por isso! Você sabe que eu te amo muito né? Obrigada por estar aqui comigo - puxei-o para um abraço
- E então? Vai pegar ele? - ele me olhou e joguei um almofada em sua cara, novamente.
- Harry, Harry, você e suas paranoias, a gente nunca vai dar certo, tira seu cavalinho da chuva! - Levantei do sofá e vou para o meu quarto, ainda pensando em tudo que Harry acabar de me dizer, eu até queria algo sério com ele, mas será que ele quer algo comigo também? E como uma criança de apenas dez anos, tinha tanto conhecimento cobre relacionamentos? Até mais do que eu, isso era chocante. Mas o fato mais importante disso tudo, era a citação dele sobre Luke, ele realmente é um cara interessante, charmoso, gostoso, bonito...Para, Crystall, foca! Ele é legal e tudo mais, porém sua atenção é tão disputada e ele parecia nem se importar com um relacionamento, que o medo de me apaixonar por alguém como ele ou até por elem mesmo, se faz tão presente em mim, então nem me permito tentar, além do mais, nós somos amigos, então talvez essa situação de amizade possa piorar um relacionamento e talvez nem permitir que voltemos a conversar se um dia, acabar o namoro...mas, por que eu estou pensando nisso?
Chacoalhei minha cabeça para afastar esse pensamentos que fazem a insonia perturbar meu sono, e desabei na minha cama. Éramos tão diferentes, mas tão iguais, objetivos diferentes, sonhos diferentes.
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Heart's Highway
FanfictionCrystall Bschellse se muda com sua mãe e irmão para a glamourosa cidade de Sidney, cartão postal da Austrália, porém nunca imaginou que seu novo vizinho, Luke Hemmings, vindo de uma família tradicional australiana, poderia se tornar um divisor de ág...