Capítulo II

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Puxa meu cabelo me jogando no chão, posso ouvir os soluços da minha irmã escondida de baixo da cama.

Tento levantar, firmo minhas mãos tentando sustentar meu peso, David se agacha pegando meus cabelos me fazendo olhar para os olhos azuis que um dia pensei amar...

- Pai... - Gaguejo.

- Cala a boca sua vadia imunda! - Rosna completamente bêbado - Você não é minha filha.

Não deixa de ser verdade, porém ainda assim doí ouvir. Ouço os saltos batendo contra a madeira, mamãe para na entrada da porta e simplesmente passa fingindo não ver nada, como sempre faz.

A mão dele levanta, acertando meu rosto com força, meu coração bate acelerado tentando assimilar uma rota de fuga.

- Por favor... - As palavras morrem em meus lábios trêmulos.

Outro soco me acerta, aperto os punhos, tento me controlar ou será pior.

Minha irmã se remexe em baixo da cama fazendo barulho, da para ouvir ela tentando tampar a boca, mas logo alguns soluços escapam entre os dedos.

David aperta meu pescoço com uma mão, me levantando rápido, por um instante minha pele parece rasgar.

- Solta minha irmã! - Isabela diz aos berros.

Puxando o ruivo de cima de mim, os olhos dele param na garota de pijama rosa, dá para ver uma mancha escura na calça e as gotas de xixi escorrendo. Mesmo assim ela não larga a camisa xadrez.

Sou prensada na parede, puxo o ar me debatendo, agarro os pulsos dele pressionando com as unhas.

- Isabela... - Falo em um fio de voz. -Corre!

Caio de volta no chão, ele da um passo na direção da pequena... Meu coração para. Tento me fazer de escudo para a pequena.

- Saia da minha frente!

Como se eu fosse deixar ele acabar com a infância dela também.

- Não ouse tocar na minha irmã! - Gritei.

Sou jogada com tudo contra a cômoda, me seguro no móvel para não bater a cabeça no espelho. As paredes rosas começam a embaçar, mas não podia desmaiar.

Minha irmã grita, ouço o barulho do cinto na pele pálida dela. Penso em como os vizinhos ignoraram nossas vozes gritando por socorro.

Vejo meu reflexo. Olheiras profundas mostram as noites que passei acordada chorando, minha roupa está rasgada. Toda a minha vida era um horror.

Não reconheço a garota que me encara, pego sem pensar o abajur colorido que sempre me protegeu do bicho papão, quão tola eu era.

Aperto o cabo de madeira ainda conectado na tomada, Isabela cospe sangue tentando se encolher, encurralada.

Dois passos depois, minhas pernas tremulas param atrás dele, tão alto como um poste levanto o abajur de madeira e vidro acertando com toda a força que tenho a cabeça de David que cai ao chão.

Sangue mancha o rosto apavorado de Isabela, ela continua a gritar. Eu acerto mais uma vez.

Logo perco a conta, apenas vejo seus dentes voando de sua boca e o sangue que espirra em meus braços, não acredito, como ousei pensar que um dia ele seria um pai para mim...

Ouço o som de vozes lá fora, os vizinhos vieram ver o que estava acontecendo, percebo minha mãe escondida na entrada da porta, ela segura o telefone trêmula.

- Ela ligou pra polícia. - Pensei. Não tinha certeza disso, mas era o óbvio devido a situação.

Deixo a arma do crime escorregar entre minhas mãos.

Meu padrasto esta morto.

Não penso duas vezes ao olhar a janela, baixa o suficiente para pular, mesmo com os machucados.

Isabela me olha com medo. Vendo sua irmã que acabara de matar seu pai.

- O que eu fiz? - Penso me sentindo estranha.

Pulo, não ligando para o tecido do meu pijama sendo rasgado pelos pregos da janela, nem ligo para a lua no céu, e muito menos se meus pés descalços serão machucados.

Uma sensação de alívio percorre meu corpo, no fundo parecia que havia adorado tudo aquilo.

Corro desviando dos postes, fugindo para longe daquele lugar. A calçada logo se enche de curiosos, felizmente eles não me enxergam.

As luzes dos carros iluminam meu caminho, enquanto choro durante minha fuga. Logo estarei sendo procurada pela polícia.

Paro no meio da calçada, desvio os olhos pela estrada movimentada, ainda atordoada com tudo aquilo.

Em um impulso tento cruzar a avenida, os carros desviam. Mas uma van preta continua em alta velocidade em minha direção. Fecho os olhos esperando o impacto.

Pneus cantam no asfalto, uma luz me cega.

- Rápido! - Grita alguém.

Dois caras mascarados agarram meus braços me arrastando para a van de faróis cegantes. Luto e me debato, mas é inútil.

- Socorro!

Minha boca é tapada, e logo adormeço por causa do clorofórmio.

A última coisa que conseguir ver foi uma sigla.

SPM 98.

SPM 98 - Da Salvação À Perdição Do Mundo Onde histórias criam vida. Descubra agora