Capítulo II

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Samuel Miller. Lá estava ele sentado a minha frente com seus brilhantes olhos azuis. Uma ruga de preocupação enfeitando-lhe a testa.
Não trocamos muitas palavras desde que cheguei ao restaurante do hotel. O mais frequentado de vila Velha e também o mais elegante. Ele me recebeu com um olhar frio. Não esboçou sorriso ou me deu um beijo. Apenas levantou-se educadamente e fez sinal para que eu me sentasse.
Pigarreei nervosa bebericando um gole de água.
Eu estava começando me sentir desconfortável naquele vestido.
-Como vão os preparativos para a nova clínica? - perguntei, ele estava trabalhando duro naqueles dias para inaugurar a clínica médica de Vila Velha, seu esforço para acarretar verbas era de se admirar.
-Anabela eu...
Meu coração deu um salto. O jeito com que pronunciara meu nome, sua entonação.
-Eu te chamei aqui porque precisamos conversar.
Deus! Será que é agora? Oque eu devo responder? Eu nunca fui pedida em casamento antes. Chorar de emoção seria muito exagero?Eu deveria dizer: 'Sim!' ou talvez um 'Eu aceito!'.
-Quero terminar... Quero terminar com você!
TERMINAR?
Aquela maldita palavra veio como um golpe que me acertou em cheio. Um soco bem dado na boca do estômago não doeria tanto.
-Nosso relacionamento não tem mais sentido, precisamos seguir adiante...
Enquanto ele falava, sério e claramente eu sentia como se fosse explodir. Não sabia como me conter para onde olhar ou como me mover. Eu estava em pânico.
-Terminar?
Foi só oque consegui dizer, um nó apertando a garganta. Samuel suspirou profundamente.
-Por favor Anabela, não torne isso ainda mais difícil pra mim.
-Dificil? Pra você?É meu aniversário... E você acha que isso está sendo difícil...pra você?
Aquela fora a afirmação mais egoísta que eu já ouvira. Aquele homem não era Samuel. Não o homem que convivera comigo diariamente naqueles dois anos. Não o homem que saia de madrugada para atender pacientes que nem podiam pagar. Aquele homem frio sentado ali não podia ser o mesmo que conheci.
- Eu estou tentando terminar isso sem criar caso... Amigavelmente.
-Terminar isso?
Falei em alto e bom som. Alguns olhares mais próximos se voltaram para nós.
-Anabela, por favor...- ele parecia constrangido.
-Você me chamou pra jantar, no dia do meu aniversário...Eu pensei que...-eu ri amargamente- Como eu fui burra!
Cavar um buraco e me esconder, era só oque eu queria. Deus! Eu passara aquele maldito dia planejando, sonhando. Me sentia ridícula.
-Isso só pode ser uma pegadinha... é isso não é? Samuel, você só está me pregando uma peça... você...
-Ja chega Anabela!- ele vociferou irritado.- Não é nenhuma brincadeira.
-Mas você disse que me amava, você disse que queria se casar comigo... Você disse...
-Eu nao te amo mais...eu estou cansado de você, estou cansado desse relacionamento​ morno. Estou cansado de ter que fingir que sinto algo por você... Você é patética...
Em um impulso de raiva esvaziei o conteúdo do copo em seu rosto.
Eu não poderia deixa-lo prosseguir. Não poderia permitir que continuasse me ferindo daquela maneira, não queria continuar bancando o bobo da corte para aqueles que nos observavam.
-Anabela!
Agarrei minha bolsa e sai apressada, um peso insuportável precionando o peito. Os olhares me seguindo como lanternas em um espetáculo.
Eu só queria um buraco para me enfiar. Queria gritar o quanto fui besta e como ele mesmo dissera: Patética.
Ao deixar o salão do restaurante adentrei a primeira porta que vi pela frente. O banheiro vazio cheirava a produto de limpeza. Me enfiei em um dos biombos e quando realmente me vi sozinha fiz oque qualquer pessoa na minha situação faria.
Chorei como um bebê. Chorei de decepção. De tristeza e sobretudo de raiva. Raiva por eu ter sido tão boba. Era direito de Samuel terminar, eu não seria imatura ao ponto de querer prende-lo. Mas não conseguia entender porque assim? Porque daquele jeito, no dia do meu aniversário. Porque ele armara todo aquele circo?
Me trazer até ali. Me humilhar na frente daquelas pessoas.
-Hey, você ai..-a voz masculina invadiu o espaço junto com uma batida na porta.
Voz  masculina? Em um banheiro feminino?
- Ah merda! - era só oque me faltava, afundei o rosto nas mãos envergonhada. Era óbvio que eu tinha entrado no banheiro errado. Não havia passado vergonha suficiente.
Fiquei muda. Esperando que o homem do lado de fora desistisse e fosse embora.
Quando houve total silêncio, enxuguei as lágrimas e abri a porta pronta para correr pra fora se preciso. Merda! Lá estava ele parado em frente ao balcão de mármore. As mãos enfiadas nos bolsos do jeans escuro. Era um rapaz, devia ter uns 23 anos, alto e muito bonito, os cabelos acastanhados presos em um coque estiloso. Eu tinha a impressão de já te-lo visto antes. Mas não conseguiria me lembrar onde é quando.
Bom, mas isso não importava naquele momento. Eu só queria sair correndo.
-Me desculpe eu entrei no banheiro errado...-comecei a dizer.
Ele me estendeu a mão sem dizer nada. Segurava um molho de chaves prateadas preso a um chaveiro um tanto quanto infantil.
Engoli em seco.
- Você deixou isso cair no corredor.
Ele disse com uma voz suave e máscula para alguém tão jovem.
-Oh, eu não percebi... Obrigada.
Com um aceno de cabeça ele fez menção de se retirar, mas parou no meio do caminho voltando-se pra mim novamente.
-Você não devia perder tempo chorando por um idiota como aquele- ele disse- Não vale a pena.
Abri a boca tentando esboçar alguma resposta,mas só consegui ficar em silêncio. Ele saiu fechando a porta atrás de si. Fiquei parada estática .

De Repente 30Onde histórias criam vida. Descubra agora