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O doutor Márcio aguardava ansiosamente, diariamente, a visita ao paciente do apartamento 105. Seu nome era Caíque Alves, um gaúcho alto, com quarenta e dois anos, de cabelos pretos, expressivos olhos verdes, forte do trabalho braçal na fazenda de seus pais. Ele estava de passeio por São Paulo quando teve que ser internado às pressas. Durante uma ronda anterior, Márcio vira na ficha do paciente que ele faria uma colecistectomia.

___ Vejo na sua ficha que você vai fazer uma colecistectomia.

Sorrindo, ele respondeu:

___ Achei que iam tirar minha vesícula.

Márcio sorrira ao responder:

___ Isso... é a mesma coisa.

Caíque o fitara com aqueles olhos lindos e dissera:

___ Podem me tirar o que quiserem, menos meu coração, pois esse pertence a você.

Márcio ficara surpreso pela resposta, pois jamais imaginaria que um homem como aquele fosse gay. Sorria francamente, respondendo:

___ Seus elogios o levarão onde você quiser ir.

___ É o que mais desejo... – respondera, Caíque, pegando na mão do médico enrubescido.

Sempre que tinha algum tempo livre Márcio ia até ao apartamento 105 conversar com Caíque. Ele era inteligente, sagaz, divertido e simples.

___ Não ligo de ser operado, desde que você esteja por perto. – dissera o paciente.

___ Não está nervoso?

___ Se for você a me opera, não.

___ Não sou cirurgião. Sou apenas um internista.

___ Os internistas têm permissão para jantar com seus pacientes?

___ Infelizmente, há um regulamento contra isso.

___ E um internista em especial chamado Márcio não pode burlar essa regra?

Márcio ria, divertindo-se com Caíque.

___ Acho você lindo e percebo que possui uma bondade extrema! Raro isso atualmente... – dissera Caíque olhando fixamente para Márcio, que respondeu todo vermelho:

___ Obrigado. – e quase chorou, pois nunca em toda a sua vida, alguém lhe dissera palavras tão doces e verdadeiras, sem interesse algum.

___ Comparo você com o orvalho na manhã nas campinas gaúchas.

Márcio riu e respondeu:

___ Nunca estive no Rio Grande do Sul.

___ Não? Então irá comigo...

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Ao entrar no apartamento de Caíque na manhã seguinte, ele lhe disse:

___ Doutor Márcio, tenho um presentinho para você. – e estendeu ao médico uma folha. Nele estava um esboço do retrato do doutor.

___ Nossa! Adorei! Você é muito talentoso! Ficou perfeito!

___ Que bom! Cá entre nós: além de fazendeiro, sou um artista!

No mesmo momento, Márcio lembrou-se do que a sua paciente havia lhe dito há algum tempo "Você conhecerá um artista...". Ficou meio confuso e amedrontado, mas não deixou transparecer.

Vinte minutos depois, estava no quarto da senhora Soraia que sorriu ao vê-lo ali e lhe disse:

___ Meu virginiano favorito!

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