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Há alguns anos não fazia mais sentido estar ali, mas a sala possuía tanto de mim mesmo nela que era impossível perder o hábito.
Passava de meio-dia, e eu já havia perdido o ônibus — e é claro que meus avós não se davam mais ao trabalho de se preocuparem.
A sala possuía cheiro de tinta e criatividade — porque eu gostava de imaginar que este último tinha uma fragrância entre o meio termo de biscoitos fresquinhos e livros novos. — Olhei mais uma vez para o relógio na parede e vi os ponteiros correndo para chegar ao número um, eu ainda tinha trinta minutos até o próximo ônibus.
Coloquei a tela nova no cavalete e pude escutar meu suspiro se sobressair ao som das cigarras lá fora. Peguei o pincel fino e despejei sobre a bandeja alguma cor que não soube distinguir — como todas ás vezes — e comecei a me perguntar como preencheria aquele esboço de paisagem.
Aproximei a mão que carregava o pincel da tela e me percebi tremer assim como hoje de manhã, como ontem, como todos os dias desde que aquilo aconteceu — afinal, ela não poderia levar apenas a si mesma, precisava carregar para o outro lado toda minha imaginação, capacidade e até coordenação motora!
Quando percebi um grande borrão preto já escorria pelo tecido fino. Ótimo. Mais uma tela desperdiçada.
Joguei o pincel no pote com água e dei-me por vencido — mesmo que eu nem tenha criado expectativas — e fui até a janela, procurando inspiração? Não, buscando um motivo que convença a professora Lorena a me dar uma tarefa alternativa — vulgo punição — o que provavelmente será copiar umas dez páginas do livro.
Permiti que o calor que banhava a atmosfera de verão entrasse em um duelo com o ar-condicionado quando abri a vidraça, e me senti consumir pelo sufocante fim de fevereiro. O céu estava tão cinza quanto me lembrava e as árvores continuavam negras, nenhuma novidade — como esperado. — Olhei para baixo e avistei o campo de futebol, como hoje é terça deve ser a vez do time feminino treinar, o que quer dizer que eu não quero estar aqui quando isso acontecer — motivos de barulho excessivo não me agradar.
E foi com esse pensamento que me virei e encarei a "pintura" ainda escorrendo e formando uma chuva escura por toda a extensão, quem eu estou querendo enganar? Preciso entregar isso e é pra ontem, não se trata de você, Takashi, mas do seu desempenho escolar.
É por isso que vou encontrar alguém que pinte o quadro por mim.
Pela terceira vez em dez minutos olho para os três ponteiros. Ótimo. Ligo para minha avó avisando que chegarei atrasado — ainda mais. — Acho que vale a pena esperar pelo time de futebol.
— Nem pensar, Takashi.
É, eu já esperava por isso, mas valeu a tentativa.
— É o seu trabalho, então é você quem vai fazer — completa terminando de amarrar seu cadarço esquerdo.
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cαвєlσѕ αrcσ-íríѕ
Teen FictionᏗᏰᏒᎧ os olhos e mais uma vez o céu está cinza, mas não é que esteja chovendo. Já faz alguns anos que todo o meu mundo é pintado apenas por cores neutras. Preto, branco e cinza. O círculo monocromático mais depressivo que você poderia enxergar. Tento...