A visita de Cassandra ficou em sua cabeça. No celular, ele via a amiga online e silenciosa. Ensaiou várias vezes mandar uma mensagem. Não era fácil. A medida que o tempo passava, tinha a sensação que estavam mais distantes, e que finalmente não havia mais espaço na sua vida. Se ela recebesse sua ligação, tinha medo que ela pensasse queria somente transar. Ele queria, mas não era somente isso.
Ficou sabendo que o pai de Karine estava em outro estado internado. Ele tinha câncer, viajou para tratamento e a doença evoluiu rapidamente, mesmo com terapia. Ele estava doente a algum tempo, e ele não acreditava que não sabia de nada. Ele não acreditava ainda que nos piores momentos, não ficou ao lado dela.
Poderia acusar a amiga de ser egoísta e de não dividir nada com ele, de querer somente ficar naquela brincadeira de trair o namorado. Iuri deveria ser somente isso, uma brincadeira, porque ela continuava com aquele noivado infeliz. No fundo, no entanto, sabia que deveria ter perguntado, deveria ter descoberto. Ter o pai com câncer não é algo que a pessoa saia falando por aí. Se ninguém quiser saber, é melhor ficar calado.
Ela não podia estar solitária. Seu namorado, um homem maduro, deveria fornecer toda a atenção que ela precisava. Mas quem ele queria enganar? Ele não se preocupava se ela recebia atenção ou não. Até poderia ser que não lhe faltasse. Ele queria oferecer a dele.
Duas horas que dormiu a tarde lhe tiraram o sono, e agora, estirado na cama, se virava de um para o outro lado. Por fim, cansou e foi andar no pátio. A lua no céu escuro era como uma pérola no fundo de lago, em seus tons acinzentados e ferrugem manchando as nuvens. Era a paisagem perfeita para escrever um poema. Sua mente, confusa, não lhe dava trégua. Talvez escrever tranquilizasse sua alma. O vento que soprou frio poderia trazer o sono de volta. Não se admiraria se fechasse os olhos assim que encostasse a cabeça no travesseiro.
Perdido nesses pensamentos, o telefone tocou. Era sua velha amiga e amante. Ele atendeu o mais rápido que pôde.
— Karine? — ouviu apenas choro.
Ela estava incontrolável. Podia imaginar o que seria. Os prantos continuavam do outro lado, a voz sufocada pelas lágrimas, tentando sair e não conseguindo, até que eram somente os gritos desesperados.
— Me espera! Eu vou praí!. — Karine foi capaz apenas de expressar uma interjeição afirmativa, e Iuri saiu correndo de casa.
A mãe estava preocupada com o filho, e viu quando ele saiu.
— Onde você vai a essa hora? Está muito tarde.
— Tenho que resolver um problema mãe. É sério. Depois a gente se fala. — Aquilo lhe traria alguns problemas, mas ele não se importava.
Diante da casa de Karina, foi invadido por um estranho saudosismo. O pátio estava escuro, uma árvore na frente dançava diante do vento. Ele não precisou bater. Alguém saiu da escuridão. Era ela. Estava com os olhos vermelhos de tanto chorar. Ainda soluçava. Ela o abraçou intensamente, assim que abriu a porta e Iuri entrou. Ele teve vergonha, porque estava excitado. Ela o perdoaria? Mas ela retribuiu seu desejo com beijos ardentes. Apertou seus lábios com força e mordeu, entre lágrimas, e então o puxou pela roupa. Ela o arrastrou para o quarto, e lá tornaram a se amar diferente de todas as outras vezes que fizeram. Foi um amor desesperado. Certa vez, ela lhe disse que uma mulher nunca se entrega totalmente. Naquela noite, ela foi completamente sua, e eles ficaram juntos até próximo do amanhecer. Quando ele gozou, ela estava de quatro e gritava para ele enfiar com mais força. Algo deveria suplantar seu sofrimento. Iuri deveria preenchê-la com seu amor. Eu te amo, ele dizia enquanto gozava. Eu te amo também, ela respondia.
Após se amarem, nus embaixo das cobertas, eles queriam apenas a companhia um do outro.
— Iuri, meu pai morreu. — Ele a abraçou. Ele admirava seus cabelos soltos, sentia sua pele macia, o cheiro de sua carne. — Minha mãe não vivia com ele há algum tempo, mesmo assim, ela viajou para ficar com ele em seus últimos momentos. Ela não permitiu que eu fosse. Isso me fez ter alguma esperança. Como eu fui idiota!
— Não tinha como você saber. A gente precisa acreditar.
— Meu namorado também está viajando.
— Ei! Não precisa me dizer nada. Não quero saber. Hoje não é o momento para conversarmos essas coisas. Nada mais importa. Vamos ficar apenas juntos.
— Obrigado! Sem cobranças?
— Sem cobranças. Só amor.
Antes de ir embora, ela o vestiu com carinho. Parecia uma esposa. Eles tinham muitas dúvidas, sobre o futuro dos dois, sobre a história deles. Talvez soubessem que não havia futuro para eles. Não acreditavam que aquela noite era uma despedida. Eles poderiam decidir, podiam realizar um pacto, de continuarem se amando e se vendo. O mais provável seria depois de Karine casar com seu noivo eles nunca mais tornarem a se ver. Talvez essa fosse a decisão mais acertada. Parecia claro que não podiam estar juntos. Se algo os unisse por algum motivo, em poucos minutos, estariam sem roupa. A noite estava no fim, e ao invés de reservarem um tempo para dormirem, era como se despertassem de um sonho. Somente nos sonhos era possível que se amassem e estivessem juntos. Estranhamente, eles não acreditavam que aquele sonho poderia se tornar realidade.
Quando chegou em casa, sua mãe estava sentada na sala esperando.
— Rapazinho, você tem muito o que explicar.
— Desculpe, mãe! Não posso falar muito. É uma questão pessoal.
— É uma garota, não é mesmo? É aquela menina que veio aqui aquele dia?
— Não. Não é ela.
— Meu filho, cuidado! Você se parece muito com seu pai. Ele é um mulherengo, mas era sedutor. Não se deixe levar pelas mulheres. Elas podem acabar com a sua vida.
— Não se preocupe, mãe. Eu sei o que estou fazendo.
— A gente sempre pensa que sabe.
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O Ameba
Teen FictionYuri é um jovem negro que frequenta de favor uma escola de elite na cidade. Este é o ano em que vai enfrentar o Enem. Na sua casa, o pai foi embora, na escola os amigos se afastaram, e o dia raiou debaixo de um vendaval. Falta apenas uma coisa para...